Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Corpolatria e a diversidade prometida

“Gostei muito da iniciativa da revista em publicar na capa vários modelos de diferentes etnias. Mas confesso que vocês poderiam ter ido mais longe na proposta. Todos são lindos, quatro deles com barriga tanquinho. Nenhum magrelo, nem peludo. A Junior está progredindo em seus assuntos e apostando na pluralidade, mas falta uma boa dose de ousadia para chegar aonde queremos. Boa sorte nas próximas.”

O comentário acima é de um leitor e foi veiculado na edição de abril/2013 da revista Junior (nº 50) em referência a uma reportagem feita pela publicação na edição do mês anterior sobre diferentes tipos de beleza. A matéria em questão aborda a ditadura do corpo belo presente nos veículos de comunicação nacionais, ditando padrões de conduta e de cuidados do próprio corpo, reflexo de uma cultura marcada pela exarcebada valorização da aparência física. Ditadura da qual, inclusive, Junior parece ser refém ao fazer dos corpos sarados estampados a cada edição o seu maior argumento de venda.

Na mesma edição citada pelo leitor, Junior apresenta duas opções de capa ao mercado. Uma com um pretenso modelo descamisado, exibindo o que nos moldes da revista seria o corpo perfeito, e outra partilhada por cinco modelos, que segundo a publicação representariam a variedade de tipos físicos existentes no Brasil. Irônico, entretanto, é perceber (tal qual opina o leitor em sua carta à redação) que os cinco tipos apresentados convergem para um mesmo arquétipo, a saber, o corpo (mais ou menos) sarado. Apesar de a revista estampar um modelo que fugiria um pouco a este padrão, por estar mais próximo de um corpo gordo, observando-se bem o gordo da Junior nem é tão gordo assim, o que em tese não ameaçaria o projeto de corpolatria caro ao universo da revista.

Dialogar com a diversidade

Corpolatria que tanto pode ser evidenciada através dos ensaios ofertados a cada edição onde homens descamisados, de sunga, ou seminus revelam-se para as lentes das câmeras, como se oferecessem para consumo do público da revista. Estratégia que se por um lado busca encampar o desejo afetivo-sexual do leitor, orientado para indivíduos do sexo masculino, por outro enseja uma pedagogia do corpo, que a despeito da matéria publicada na edição de março da Junior está muito longe de ser desconstruída. Basta folhear a edição deste mês em que o destaque da vez é o global Jesus Luz, com direito a páginas e mais páginas onde se exibe o tipo físico preconizado atualmente.

Ora, se a ideia é apresentar uma pluralidade de tipos existentes no Brasil, onde estão os corpos magricelas, os gordos, os não tão simetricamente divididos, os que não tem barriga tanquinho? É evidente que a idolatria do corpo perfeito, talhado, sarado, com gomos salientes e divisões marcadas, não começa nem se encerra na Junior. É sintoma de um contexto bem maior, marcado pela hipervalorização das aparências e por uma indústria hoje bastante lucrativa, como a dos cosméticos, centros de estética e academias. Evidente também é o fato de a revista precisar vender, e exibir aquilo que chamam de corpos belos é uma forma pretensamente controlada de alcançar o mercado. Mas se a publicação pretende dialogar mais e melhor com a diversidade existente, talvez esteja faltando, como lembra o leitor, um pouco mais de ousadia.

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Fernando Barros é relações públicas