Nossos pais sempre nos disseram: “Prudência e caldo de galinha nunca fizeram mal a ninguém.” No caso dos jornalistas, esse ditado serve como nunca. Nessas manifestações então, em que este profissional passou a ser duramente questionado, todo cuidado é pouco, sob pena de ver seu trabalho cair no descrédito.
Nesta noite, véspera da semifinal da Copa das Confederações, dormir foi uma missão impossível. Era fácil antever que, em Minas, local da partida, a situação corria um sério risco de se complicar e partir para a pancadaria. Nos últimos dias, li e reli, nas redes sociais, todas as discussões e os relatos de médicos, advogados e jornalistas que participaram das manifestações. Seja como integrantes ou como profissionais que lá foram prestar o seu serviço no socorro às vítimas, na assistência jurídica aos manifestantes presos ou no simples relato dos acontecimentos. Esses depoimentos estão disponíveis apenas nas redes sociais. Não chegaram à grande imprensa.
De tudo que li, dois itens me chamam à atenção: a citação repetida da célebre frase dita por Tancredo Neves quando eleito governador do estado, da sacada do Palácio da Liberdade: “O primeiro compromisso de Minas é com a Liberdade!” O outro, as denúncias de que a imprensa não está cumprindo o seu papel. Aqui cabe um parêntese.
A narrativa do presente
Tantos anos trabalhando com análise de mídia, a transparência e a ética viraram quase como um mantra para mim. Pode parecer ingenuidade, mas não é! Sem elas, não há o bom jornalismo. Que o diga o escândalo das escutas telefônicas no Reino Unido, envolvendo o magnata da mídia Rupert Murdoch, que provocou não só o fechamento do tabloide News of the World, mas um prejuízo a toda indústria de jornais da Grã Bretanha. Só para citar um caso. Mas há outros. Centenas deles.
O que quero deixar claro é que o profissional que vai às ruas cumprir a sua pauta, está sujeito a toda sorte de riscos. Mesmo assim não se acovarda. Também quem permanece nas redações, tendo um infarto a cada hora, cumpre o seu papel. Mas eles não são os donos da notícia. Não são eles que definem o que vai ao ar. O que sai no jornal.
Ou você acha que a notícia não tem dono?
Então, esse comentário é para quem decide: ao deixar de dar todos os lados da notícia, vocês estão perdendo o bonde da história. Vocês estão perdendo a chance de mudar a conversa de que o bom jornalismo está morto. Vocês estão deixando na mão das redes sociais a narrativa do presente. Depois não reclamem.
Obs.: espero que o título dado, inspirado num conto de Hemingway, seja uma mera coincidência.
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Eliane Machado é jornalista e ex-diretora do programa Rede Mídia – BH