Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Sensacionalismo sobre o ser social brasileiro

Parafraseando Antônio Abujamra, começo a minha reflexão gritando. “Ai de mim, que dor! Preciso de um grito grego para manifestar a minha angústia sobre a dúvida, no periscópio sobre o oceano do social brasileiro e a visão conservadora da mídia sobre a conjuntura social do Brasil.” A fenomenologia volta-se sobre as coisas mesmas, sobre a realidade tal como ela é. É um voltar-se para as coisas mesmas do mundo, do Brasil e das pessoas como seres que têm consciência sobre as coisas. Estas coisas poderão fazer bem ou mal às pessoas.

O nosso amado Abujamra tem uma pergunta que me agrada muito. Uma pergunta muito reflexiva. Quem fez mais mal ao mundo, a religião ou os bancos? Que pergunta filosófica! Eu diria que foram os dois. No passado, olhando de uma forma mais histórica, eu diria que foi a religião. Mas no presente, os dois estão sendo verdadeiras bombas atômicas para o mundo. Os bancos aparecem como agiotas e vilões do mundo, mormente do nosso mundo do Sul. As religiões são uma ilusão de ótica para nós. O que Marx chamava de “o ópio do povo.” O fenômeno antropológico religião aparece como boazinha, a salvadora. Por isto, se torna mais difícil de ser controlada e de convencer as pessoas de que ela é um mal ou que está sendo usada para o mal das pessoas. As pessoas têm o discurso de que a palavra de Deus é sempre boa e isto é um equivoco. E, como os noticiários da televisão estão eivados deste equívoco!

Os noticiários do Brasil mostram a visão estreita que a nossa elite brasileira tem sobre o país. O jornalismo brasileiro não é plural, tem uma visão míope e unilateral, voltada única e exclusivamente para os interesses oligárquicos.

De frente para a capital

Não temos, no Brasil, uma imprensa voltada para a formação dos interesses coletivos. O que temos é uma intencionalidade de venda de um produto que traz lucro para pequenos grupos e corporações. Não há, por parte da mídia, interesse no debate sobre a distribuição dos ganhos e benefícios para a coletividade brasileira. A pergunta que faço aqui é: os jornalistas conseguem compreender e apreender bem, este país, em sua substancia social? Como fica a ética de um jornalista frente à questão do fenômeno social brasileiro? Ou ainda, por trás do jornalismo brasileiro existe uma ética?

Como pensa Carlos Novaes, pensamento com o qual compartilho, os telejornais brasileiros estão padronizados para baixo. Estes estão policialescos. Por quê? Porque a sociedade brasileira foi convencida de que este é o seu problema central. O que não é verdade. O nosso problema central está na ontogênese de toda a constituição da desigualdade social do país. O nosso problema está na dívida social brutal de um país que abandonou o seu povo em favor de uma branquização de um país que alguém disse que era nosso. Ou seja, a questão está no fato de o parco Estado estar sempre de frente para o litoral e de costas para o sertão. O Estado brasileiro sempre esteve de frente para a capital, onde está o capital, e de costas para o interior. E nas capitais, o Estado está sempre de frente para os centros financeiros e de costas para a periferia. Cadê a reforma agrária? Cadê as políticas de Estado para o campo? Sem o atendimento destas prerrogativas, o caos social se instala. Na contramão das necessidades sociais, as pessoas estão convencidas pela mídia de que há necessidade de polícia. Porque vende, dá ibope, alimenta conversas de botecos.

Pauta da intolerância

Por trás destas questões, tenho me preocupado muito com os telejornais sensacionalistas, em especial os exibidos por canais de televisão ligados a grupos religiosos. Todo sensacionalismo me preocupa porque toda emoção é vulgar, como diria Belchior. Mas o sensacionalismo ligado aos grupos religiosos me preocupa mais porque as pessoas não conseguem relacionar o sensacionalismo barato dos telejornais policialescos com o emocionalismo barato dos programas religiosos. Não há uma consciência de que ambos os sensacionalismos fazem mal à sociedade. Assim, todo mundo acha que tem uma solução mágica para os problemas do país.

São sempre concepções que vão de encontro a uma visão conservadora da sociedade. A visão conservadora parte do pressuposto de que a razão da força bruta prima sobre a força da razão. Em suma, é uma forma de alimentar uma pauta da intolerância, da truculência, do tacanho, do torpe, na pessoa do Estado, manifesto na figura da polícia.

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José Valmir Dantas de Andrade é filósofo e educador