Mais uma vez o sistema Globo, que acabou de fazer sua autocrítica (mercadológica) sobre o apoio ao golpe civil-militar de 1964, mostra a sua face nos tempos atuais e está sendo objeto de questionamentos. A primeira “informação” (entre aspas mesmo) apareceu em uma de suas edições e dizia respeito ao fato de um familiar do ex-presidente João Goulart ter vendido uma propriedade juntamente com um importante acervo informativo do proprietário original. Além disso, acrescenta a nota, a venda teria provocado divisão na família.
Nada disso. Não houve nenhuma “divisão na família”, como garante o próprio filho de Jango, João Vicente Goulart, nem a venda é recente. A venda propriamente dita, sem os tais acervos, aconteceu há 12 anos e não “esta semana”, como noticiou o jornal de maior circulação no Rio de Janeiro.
Realmente é estranho a venda de uma propriedade, ocorrida há 12 anos, ter sido noticiada como fato atual e ainda por cima com a mentira de que junto com a propriedade teria sido vendido material informativo sobre o único presidente brasileiro que morreu no exílio.
A notícia em questão remete também a um fato relacionado com os dias atuais. Finalmente, depois de muito tempo, especialistas vão exumar os restos do presidente, que se encontram em São Borja (RS), já que pairam dúvidas se Jango foi ou não assassinado com uma troca de remédios.
A família Goulart não aceitou que a exumação fosse feita em laboratórios norte-americanos e fez questão de indicar a presença de um perito cubano, o mesmo que teve acesso aos restos de Ernesto Che Guevara encontrados na Bolívia, onde foi assassinado pela CIA.
Quem concluir que a “informação” divulgada pelo jornal O Globo pode estar relacionada indiretamente com a exumação dos restos do presidente poderá ser considerado por alguns como adepto da teoria conspiratória da história. Mas, para outros, os fatos estão relacionados e têm o objetivo exatamente de colocar em dúvida os argumentos da família Goulart, que há muitos anos tenta desvendar as dúvidas sobre as circunstâncias da morte de Jango em Las Mercedes, na Argentina.
Figura carimbada
Outro fato que remete a questionamentos e interpretações das mais diversas diz respeito a uma outra informação publicada pelo mesmo jornal. Com chamada de primeira página (“Recurso do mensalão pode beneficiar até 84 políticos”) e a página interna (3) sob o título “Mensaleiros como modelo”, indicando que “até 84 parlamentares na fila dos réus do STF podem se beneficiar de embargos infringentes”, O Globo estampa fotos de sete parlamentares, a maioria mencionada por responder ações de peculato, apropriação de rendas públicas e sonegação fiscal. Chama atenção o primeiro da lista, o senador Roberto Requião (PMDB-PR), que está sendo processado pelo Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, por injúria e difamação.
Os leitores mais desavisados, ao passarem os olhos nas fotos, vão acabar concluindo que os sete estampados estavam relacionados com os mesmo tipos de crime. Ou seja, que Requião e outros são farinha do mesmo saco da corrupção. O processo contra Requião é um pouco mais explicado no meio da matéria.
Por coincidência ou não, Requião é um desafeto histórico das Organizações Globo e, como governador do Paraná, cortou verbas publicitárias para o referido grupo. Recentemente, o Senado aprovou uma lei de autoria de Requião sobre o direito de resposta, instituto este suprimido pelo STF quando da revogação da Lei de Imprensa. O senador do PMDB tem feito em plenário pronunciamentos críticos às Organizações Globo.
Teria sido apenas jornalística a colocação da foto de Requião junto com outros parlamentares acusados de crimes completamente diversos dos do senador paranaense? A dúvida apenas remete a tal teoria conspiratória da história ou tem razão de questionamento mesmo?
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Mário Augusto Jakobskind é jornalista