Os últimos anos têm sido agitados para Rupert Murdoch. No Reino Unido, indícios de que jornalistas de vários dos seus jornais grampearam celulares particulares levaram ao fim do News of the World, um dos seus mais poderosos tabloides, e motivaram um inquérito governamental sobre as práticas da imprensa britânica. Em junho, Murdoch anunciou que estava se divorciando da sua terceira mulher, Wendi Deng, com quem se casara em 1999. Agora, logo após uma eleição federal na Austrália, Murdoch, crítico contumaz do Partido Trabalhista e dono de 70% dos jornais do país, é novamente o grande assunto na sua terra natal.
Os dramaturgos notaram. Richard Bean, autor de One Man, Two Guvnors [um homem, dois patrões], está escrevendo uma peça sobre os grampos telefônicos para o National Theatre, em Londres, a convite do seu diretor artístico, Nicholas Hytner. Mais perto do lar, a Melbourne Theatre Company acaba de estrear Rupert, dramatização da vida de Murdoch ao estilo dos cabarés, criada por um dos mais conhecidos dramaturgos da Austrália, David Williamson.
A peça, encenada no Arts Center, em Melbourne, usa dois atores para interpretar Murdoch. Guy Edmonds é o Rupert jovem. Sean O’Shea, a personificação de Murdoch aos 82 anos, também oferece comentários e orientações à medida que a ação se desenrola – muito rapidamente, para abarcar uma carreira que abrange mais de seis décadas.
Uma abordagem distanciada
Murdoch, segundo Williamson, é “o mais poderoso australiano ou ex-australiano que já viveu”. Williamson começa a peça com Murdoch como o jovem herdeiro de um decadente jornal australiano e o acompanha à medida que ele aproveita o sucesso na Austrália para triunfar com tabloides no Reino Unido, adquirir o diário londrino The Times e fazer incursões pelos Estados Unidos.
Quase nada fica de fora, nem mesmo a torta de espuma de barbear que um comediante atirou em Murdoch quando ele apareceu para depor numa comissão parlamentar. As resenhas têm sido positivas, mas os críticos que esperavam ver Murdoch ser espezinhado saíram frustrados. O jornal The Age, que é editado em Melbourne e não pertence a Murdoch, elogiou O’Shea por fazer um Murdoch “porra-louca”, com “uma insinuação de ameaça por baixo do carisma”, mas criticou Williamson por pegar leve demais com o personagem. O The Australian, jornal de circulação nacional pertencente a Murdoch, fez um relato mais respeitoso sobre a peça. Seu crítico opinou que Williamson havia tentado enfileirar fatos demais numa atração de uma só noite, mas qualificou o primeiro ato como “leve e agradavelmente divertido”. Rupert viaja em março a Washington para cinco apresentações no Festival Internacional de Teatro.
Williamson é provavelmente mais conhecido pelas plateias americanas como roteirista de cinema. Ele escreveu os roteiros de Gallipoli e O Ano Que Vivemos em Perigo, dirigidos por Peter Weir. A abordagem distanciada em relação a Murdoch foi deliberada, segundo Willliamson. O personagem Murdoch “convida a plateia a ver sua história real”, não uma história partindo daquelas que um jornal de Murdoch poderia descrever como “elites liberais-esquerdistas degeneradas, bebericando caffe-latte em bairros de classe média baixa”.
“Ele escala o elenco do seu próprio espetáculo, de modo que a versão mais jovem de si mesmo é consideravelmente mais bonita e dinâmica do que ele próprio foi, mas, como ele diz à sua plateia, esse é o espetáculo dele, então ele pode fazer o que achar melhor.”
******
William Grimes, doNew York Times