A cobertura que os jornais brasileiros fazem sobre América Latina passa longe da importância que a região tem para o país. Os temas latino-americanos esfriam nas redações enquanto reportagens que destacam os EUA, Europa e Oriente Médio são mais bem feitas, constantes e completas. Por quê?
Fábio Zanini, editor do caderno “Mundo” da Folha de S. Paulo, diz que o jornalismo internacional no Brasil está atrasado uns cinco ou seis anos, e não acompanha as evoluções na região latina no mesmo ritmo em que acontecem. Ainda assim, Zanini é otimista: “A América Latina lentamente está ganhando espaço na cobertura da imprensa brasileira, e hoje tem um espaço razoável”. Atrasada, a imprensa agora consegue ver o crescimento da importância do Brasil no cenário internacional. “É interesse imediato do Brasil, as empresas estão indo para lá, tem-se uma noção de que é preciso acompanhar melhor”.
O editor acredita que “precisa cobrir Argentina, sempre; Venezuela, porque ainda tem resquícios do Chávez; Chile, que ainda tem uma cobertura menor do que deveria”. Zanini completa que é preciso estar atento à Colômbia, por causa das FARC, ao Uruguai, que trouxe o assunto sobre a estatização da maconha e à Cuba, porque é Cuba, com Fidel, Raul… Sobre o Peru, segundo o jornalista, faz-se tem uma cobertura pífia e o Equador é preciso noticiar por causa do presidente maluco de lá. O Haiti, pelo fato de o exército brasileiro manter soldados lá, também precisa de uma cobertura e isso, sob os olhos do editor do jornal que ainda é o de maior circulação do país, é feito razoavelmente bem. O resto é resto, afirma Zanini.
Serviço público
Mas uma boa cobertura sobre a região precisa de frequência, quantidade e acompanhamento cotidiano. O jornalista Rolf Kuntz, em artigo publicado no Observatório da Imprensa (“Imprensa esnoba o setor mais dinâmico“, 17/9/2013), alerta para que o “melhor de qualquer jornal deve ser a cobertura do dia a dia, quando se mostra o empenho efetivo no acompanhamento de cada assunto”.
Sobre um tema específico e importante na América Latina, o Mercosul, esse acompanhamento praticamente não existe. No Estado de S. Paulo, entre setembro e novembro de 2008, viu-se menos de 20 publicações sobre o bloco, dispersas no Caderno de Economia, páginas de Opinião e Editorial, e Fórum do Leitor. Esse número não compete com a importância político-estratégica e socioeconômica da integração para a América Latina.
Questionado sobre esse déficit, Lourival Sant’Anna, há tempos na redação do Estado de S. Paulo, afirma que a cobertura da imprensa brasileira, ao menos sobre o Mercosul, é problemática. Para ele, ainda há medo de arriscar, de fazer uma bela cobertura e não ter como respaldo maiores ações do governo nas negociações do bloco.
Se a imprensa não publica, a sociedade não se informa. Com publicações inconstantes, a abordagem da imprensa brasileira sobre a América Latina é insuficiente e deixa o leitorado distante da própria realidade e cotidiano.
A cobertura que tem sido feita deixa claro que há uma falta uma formação sócio-política sobre os processos latino-americanos, o que resulta no desinteresse pela abordagem dos temas, como conclui a tese “Solidão da América Latina na Grande Imprensa Brasileira” (Alexandre Barbosa, USP, 2006).
O serviço público dos jornalistas e jornaleiros também precisa de relógio, com corda que acelere cinco ou seis anos. Não é essencial que se importe de algum país do Hemisfério Norte; a imprensa brasileira só precisa dar mais atenção ao próprio eixo e ao próprio espaço.
******
Sara Abdo é estudante de Jornalismo na PUC-SP