Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Turminha em voo alto

Que o mundo esteja preparado para as novas aspirações da “dona da rua” do Bairro do Limoeiro. Os planos infalíveis de crescimento global de Mônica e sua turma não são novos, mas nunca estiveram tão explícitos e fizeram uso de estratégia tão pouco usual. Com mais de 80% do mercado infantojuvenil de bancas, a Maurício de Sousa Produções voltará em 2014 a fazer uso de quadrinistas independentes brasileiros para a segunda fase de seu projeto de maior sucesso em 2013, as Graphic MSP. “Um amigo brincou comigo, disse que transformei a Maurício de Sousa na maior editora indie do Brasil”, brinca o idealizador da série e editor da Maurício de Sousa Produções, Sidney Gusman.

Na tarde de sexta, em apresentação no Festival Internacional de Quadrinhos de Belo Horizonte, Gusman anunciou os próximos seis álbuns da coleção, que reinterpreta personagens criados por Maurício de Sousa. O cãozinho Bidu, o índio Papa-Capim, a Turma da Mata, o fantasma Penadinho, o Astronauta e a Turma da Mônica serão os protagonistas das edições. As graphic novels da turminha e do personagem de ficção científica serão continuações das duas primeiras obras da leva inicial do projeto: Magnetar, de Danilo Beyruth, e Laços, dos irmãos Vitor e Lu Cafaggi.

“Ainda não sabemos a ordem, serão três em 2014 e as outras no ano seguinte”, explica o editor. “E em 2015 anuncio outras duas na Gibicon de Curitiba. A ideia é que a gente não pare e tenha de três a quatro graphics por ano.” Pai dos personagens, Maurício de Sousa ressalta a magnitude da iniciativa: “Esse projeto é de fôlego e a longo prazo, estamos nos primeiros passos, faz parte de uma estratégia. Não podemos ficar parados, precisamos que nosso sucesso seja renovável”. Primeiro gibi com o selo Graphic MSP, Astronauta – Magnetar já foi publicado na Alemanha, Espanha, Itália e França. Lançado durante o FIQ, o quarto álbum do selo, Piteco: Ingá era objeto de desejo de editoras internacionais antes mesmo da impressão.

Recém-saído da norte-americana DC Comics, Renato Guedes será o ilustrador do texto da roteirista Marcela Godoy para Papa Capim. Vencedores do prêmio HQ Mix 2013 na categoria Publicação Independente pela séria Quadrinhos A2 (www.quadrinhosa2.com), o casal Paulo Crumbim e Cristina Eiko ficarão responsáveis pelo Penadinho. Os mineiros Eduardo Damasceno e Luís Felipe Garrocho, da webcomic Quadrinhos Rasos (www.quadrinhosrasos.com) assinam a história do Bidu. E a Turma da Mata (de Jotalhão, Tarugo, Coelho Caolho e Raposão) é do trio Greg Tocchini, Artur Fujita e Davi Calil, do coletivo de artistas Dead Hamster (www.facebook.com/DeadHamsterComics).

Segundo Gusman, os critérios de escolha dos artistas e dos personagens são baseados nos estilos de cada um. “Sempre planejamos apontar para todas as direções, os personagens do Maurício permitem isso, produzir histórias de aventuras, humor, terror e algumas mais fofas”, explica, sem revelar os gêneros, enredos e títulos dos próximos lançamentos. Depois da edição das quatro primeiras publicações da série, Gusman revela ter sido procurado por mais de 40 artistas se candidatando e até propondo ideias para possíveis novas edições.

“O projeto é vivo, não imaginávamos já lançar as continuações do Astronauta e da Turma da Mônica, e todos os livros são desenhos e até filmes em potencial”, avisa o editor. “Do jeito que estão, podem já ser animadas e ganhar versões com atores. Estamos à procura de parceiros”, complementa Maurício de Sousa. A empolgação da dupla reverbera nos seus autores. Para Danilo Beyruth, a referência mais lógica é com a fase áurea da Marvel Comics na década de 60, anos de criação de personagens como Homem-Aranha, Quarteto Fantástico e X-Men. “A MSP virou uma casa de ideais, como a Marvel era.”

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‘O Brasil tende a se tornar referência nos quadrinhos’, diz Mauricio de Sousa

Como avalia o ano de 2013 para os quadrinhos nacionais?

Mauricio de Sousa – Foi sensacional, mas 2014 será ainda melhor e o seguinte ainda mais. O Brasil está se transformando e o mundo é outro, está na mãos dos criativos. Tá cheio de gente boa por aí, são novos valores e desenhistas e o País tende a se tornar referência para quadrinhos.

Já ocorreram releituras do trabalho do senhor, mas não nas proporções das Graphics e com tamanha liberdade, certo?

M.S – É uma estratégia de marketing. Se não fizermos isso, ficamos parados. Precisamos de sucessos renováveis e recicláveis. Fazer releituras faz parte da jogada e com elas você pode encontrar novos veios.

Quais as expectativas do senhor para essa segunda leva?

M.S – Não faz sentido existir “desexpectativa”. A gente já fareja o que pode ou não ser feito. O nosso público tem que ser internacional e de caráter familiar. E o trabalho, chocante e surpreendente. Ou então não é nosso.

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Grupo estuda criar revista mensal de graphics

 “O mundo é muito grande e não estou sabendo administrar a demanda”, conta Maurício de Sousa. Com mais de 400 personagens, divididos em pelo menos 10 famílias, e 200 artistas trabalhando em seus estúdios, o quadrinista revela ainda estar descobrindo como administrar suas criações em um mercado cada vez mais internacional. Da China, por exemplo, ele diz receber pedidos crescentes de material do Chico Bento, tanto revistas quanto animações.

No entanto, uma das ideias que ele cogita junto com Sidney Gusman daria ainda mais espaço para os artistas independentes nacionais: uma revista mensal, composta por histórias de vários autores. Sem mais informações sobre o projeto, eles continuam abrindo espaço para criadores ainda sem acesso às massas. E também impressionando os seus convidados.

Morando na Itália desde 2011, o artista paraibano Shiko, autor da graphic novel com o Piteco, diz ter percebido interesse sobre a produção brasileira na Europa: “Tenho frequentado algumas feiras por aqui e conversado com alguns editores e existe uma curiosidade sobre o que está sendo feito no Brasil. Mês passado eu vi o Astronauta em destaque em uma loja de quadrinhos em Pisa. Não é fácil conseguir esse espaço, o mercado aqui é muito diversificado e são muitos títulos buscando um pedacinho.”

Um dos dois autores da HQ do Bidu, Eduardo Damasceno expõe o estado de choque em que ficou após receber o convite para produzir o material, um padrão entre os realizadores participantes. “Antes de terminar a ligação com o Sidney eu já estava pensando nos prazos, em como faríamos pra entregar as coisas, se daria tempo. Eu fiquei em silêncio um bom tempo depois do convite, pensando ao mesmo tempo: ‘isso tá acontecendo de verdade’ e ‘eu tô frito’.”

Coautora da continuação do álbum da Turma da Mônica, Lu Cafaggi conta que o choque não foi menor, mesmo participando pela segunda vez. “A gente tinha acabado de sair de uma sessão de autógrafos incrível e estávamos muito cansados e deslumbrados com tudo. Quando veio o convite, eu e meu irmão olhamos um pra cara do outro sem saber como reagir, pensamos que ele estivesse brincando. Acho que só fui me dar conta de que a coisa era séria no dia seguinte.”

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Ramon Vitral, do Estado de S.Paulo