Como a agenda jornalística está invadida pelo fenômeno rolê – e não poderia ser diferente –, está passando despercebido um assunto que, se envolvesse petistas e assemelhados, provavelmente, seria alvo de manchetes e intensos debates pela grande mídia. Refiro-me à transcrição de um diálogo entre Serra e Roberto Amaral, principal lobista dos interesses de Daniel Dantas, transcrito em reportagem assinada por Sérgio Lírio, intitulada “Dantas & Mendes“, na revista CartaCapital nº 782, de 15/1/2014. A reportagem analisa o livro Operação Banqueiro, do jornalista Rubens Valente, editora Geração Editorial.
Naquele diálogo está estampado quem realmente dá as cartas neste país. A grossura e crueza dos termos demonstra, de um lado, o de quem manda e, de outro, quem obedece ou, no mínimo, cala servilmente diante de tratamento tão humilhante. Falar daquele jeito para alguém com tantos serviços prestados, sem que houvesse um mínimo esboço de indignação da parte do ofendido, conhecido pelo gênio explosivo e vingativo, demonstra o quanto o PSDB, o criador, é refém da criatura por ele criada e cevada, como o autor da reportagem Sérgio Lírio assinala. Fatos reveladores como este “passariam batido” não fosse o espírito público e o destemor da editoria da referida revista que, quixotescamente, sobrevive, no nicho das revistas semanais à margem da linha ideológica comprometida até a medula com a agenda conservadora neoliberal que pauta as demais revistas semanais.
Este episódio me lembrou de outro ocorrido recentemente envolvendo o então candidato a presidente do BNDES, Carlos Lessa. Instado a ser sabatinado pelo então ministro Luiz Fernando Furlan, ele se recusou dizendo que não iria se submeter ao escrutínio de um mero “criador de frangos”. De início, a leitura que se pode fazer desta atitude é atribuir ao economista Carlos Lessa uma soberba e arrogância típica de alguém filho de família tradicional carioca. Outra leitura, com o a qual me alinho, é a de que se submeter a este tipo de sabatina significa um beija-mão a uma elite econômica cujo único interesse é, através de artifícios como este, continuar estabelecendo relações de poder e de submissão, existentes desde sempre, para assim blindar seus privilégios contra qualquer ação que os ponha em risco. Eles, por este e outros artifícios, com o mesmo propósito, como A Carta ao Povo Brasileiro, de 22 de junho de 2002, estão lutando pela defesa de seus interesses. Cabe àqueles que pretendem lutar por interesses sociais e políticos mais amplos, dentro das regras do jogo da democracia representativa, ainda que viciada e capturada pelo poder financeiro, discernir o verdadeiro poder destes senhores para não dar- lhes mais do que o necessário.
Aí é que são elas, como disse Mino Carta em uma palestra na Feira do Livro de Porto Alegre de 2013 quando, ao responder a uma pergunta da plateia, revelou sua desconfiança sobre o quanto das concessões do governo à burguesia nacional e internacional é fruto de uma realpolitik decorrente da chamada governabilidade, conceito que é seguidamente apresentado pelos operadores do poder como resposta a indagações das alas mais à esquerda da sua base de sustentação politica e quanto é ideologia de direita incorporada, pois se sabe que muitos, inclusive alguns que foram de extrema-esquerda na juventude, se aburguesaram na caminhada, como dizia Fausto Wolff.