A insegurança que tomou conta dos 11 milhões de brasileiros dos estados que ficaram sem energia elétrica de 14h ate 15h e 16h30m de terça-feira (4/2) foi transferida com força total aos 3 milhões de turistas que já compraram entrada para assistir aos jogos da Copa do Mundo no Brasil daqui a três meses. Em várias partes do mundo, acabaram os estoques de lanterna e pilhas, que passaram, desde a noite passada, a fazer parte da bagagem de desportistas que virão ao Mundial.
Nos debates gerados pelo problema entre dirigentes governamentais da área elétrica e técnicos do setor privado, a divergência foi sintomática: o governo sustenta que o apagão foi “uma simples falha” do sistema; especialistas do nível do cientista Pinguelli Rosa advogam que o problema é estrutural, ou seja, mais profundo e que exige mais atenção governamental. Nos últimos dois anos já ocorreram perto de 200 apagões pequenos e médios no país, dois deles de grande porte como o da primeira semana de fevereiro. Que fez o governo? Preparou mas não utilizou o acionamento da central termoelétrica sob o argumento de que sua mobilização acarretaria um aumento do valor da tarifa de energia elétrica para o consumidor.
Justificativa para o apagão: um curto circuito num trecho da linha do Pará, em Carmópolis. Argumento: como o sistema está no limite de utilização da sua capacidade, qualquer curto-circuito influencia nele todo.
Boca no trombone
Argumento dos críticos do sistema: o governo incentivou o consumo de energia elétrica sem ter aumentado a sua oferta. Ou seja, esse tipo de problema vai ocorrer frequentemente daqui para a frente. Os turistas que compraram ingresso para os jogos da Copa entenderam a mensagem: para não ficar às escuras começaram a procurar lanternas e pilhas, cuja procura aumentou 500% em dois dias em Londres e em Paris.
O planejamento do governo parece andar bem distante da realidade nacional sob argumentos esdrúxulos ou simplesmente eleitorais: uma hora não se reajusta o preço da gasolina para isso não influenciar a elevação da inflação (e quem paga a conta é a Petrobrás, cujo rombo já ascende a casa dos 20 bilhões de dólares; adeus reputação internacional). Outra hora, não se aciona a central termoelétrica por ser uma energia mais cara e vai elevar o preço da tarifa de energia, também influenciando a pressão inflacionária altista, e o país fica às escuras.
Mais adiante, não se faz campanha contra o desperdício d’água e a população continua gastando água como se não fosse um recurso finito, ou seja, vai acabar. O racionamento está batendo na porta – a falta de chuva e o calor já se esgotam como estandartes justificatórios.
A mídia assiste a toda essa parafernália de indiferença, omissão e incompetência e são raras as reações, quando seria preciso botar a boca no trombone. Aí, sim, talvez o governo e a população ouçam e acordem.
******
Reinaldo Cabral jornalista e escritor