Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Odylo, não dá para esquecer

Odylo Costa, filho (é assim mesmo que se chamava e fazia questão de ser conhecido com a vírgula e depois a palavra filho) tinha tédio para ouvir e fazer palestras. Fugia dessas participações com aquele jeito bonachão que Deus lhe deu e os amigos gostavam de tê-lo ao lado, para conversar e ouvir sua opinião no campo literário ou político. Por falar em anjo, Ribeiro Couto, a propósito, soltou esta verdade: “Sorri com ar do Menino Jesus do Maranhão.” Preferia escrever, escrever, ler o quanto bastasse, daí o refinamento como intelectual.

Pela idiossincrasia a certos conferencistas que enchiam e enchem a paciência do participante, obrigando-o a ouvir tolices, viu-se envolvido em atos que estão para o riso e menos ao sério. Quem nos conta tais passagens é Peregrino Junior, amigo desde a mocidade e colega da ABL. Faziam parte de um movimento literário conhecido por “Nova Geração”. Os participantes, ligados às artes e livros, reuniam-se mensalmente para comerem, beberem e cair na esbórnia. Todos dividiam as despesas, até os convidados.

O grande jornalista do quadro da AML era uma pessoa desligada. Esquecia-se das coisas e ficava procurando em certos lugares aquilo que se encontrava no bolso. Aconteceu com um editorial quando trabalhavam no Jornal do Brasil. Outra: ao querer promover uma “Escola Doméstica de Natal”, anunciou que faria palestra em nome de um Centro do Norte. Encarregou-se dos convites.

No dia, lá estava ele e três convidados, que incluíam a dona da casa (auditório), que nada sabia, e dois amigos. Um terceiro caso: morto o grande amigo Félix Pacheco, que o ajudou num emprego no Jornal do Comércio ao chegar ao Rio de Janeiro, aos 16 anos de idade, comprometeu-se a fazer uma palestra a respeito desse maranhense. Presentes, autoridades da educação e outras pessoas importantes. Horário: 15 h. Ele chegou 30 minutos depois. A conferência constou de um livro que levou consigo e leu versos de Baudelaire, Mallarmé, Verlaine, Rimbaud e até do homenageado. Recebeu aplausos.

Alta qualidade jornalística

Quando chefe do Departamento de Comunicação Social da UFMA, com aprovação do colegiado, convidei-o, insistentemente, para vir a São Luís e falar na “Primeira semana de estudos sobre a imprensa maranhense”. Depois foi a vez de Lago Burnett. Para surpresa, aceitou. No dia da chegada fui esperá-lo no aeroporto. Ele veio acompanhado da esposa, dona Nazaré. Momentos de tensão. Todos os passageiros desceram. Nada de mestre Odylo. Esperado como uma celebridade. Não perdi a esperança. Fiquei de olho grudado na porta do avião da Vasp. Já sem esperança, ei-lo que surge com a esposa! Exultei. Ao cumprimentá-los, disse-lhe: “O senhor quase me mata do coração. Pensei que não viesse”. Ele respondeu sorridente: “Quem quase me mata foste tu (pelo convite). Eu me senti mal do coração.” Dona Nazareth interferiu com humor – passará, depois de ele comer o arroz de cuxá e provar os sorvetes com frutas da terra.

Dito e certo. Levei-os a restaurantes e sorveterias. Bom de prato e amante das frutas, ficou feliz. Passou o mal-estar. Quanto à palestra, uma aula impecável. Auditório cheio e o assunto, ninguém melhor que ele poderia discorrer. Isto, pela fama reconhecida como um dos maiores jornalistas do século 20 e pelo espírito empreendedor e inovador realizado à frente das maiores empresas de informação de São Paulo e Rio de Janeiro.

O jornalista Evandro Carlos de Andrade (1931-2001), que trabalhou no JB e O Globo, deu um depoimento sobre a competência de Odylo, que transcrevemos neste trecho: “Com a reforma feita por Odylo Costa, filho, na década de 50, o JB viveu quase meio século de reconhecimento público de sua alta qualidade jornalística” (Observatório da Imprensa).

Ao completar cem anos de nascimento, em dezembro próximo, não dá para esquecer essa extraordinária figura humana, grande jornalista e autor da novela A faca e o Rio, traduzida para o alemão e inglês e que virou filme. É considerado um dos maiores poetas do Brasil. O Maranhão poderia decretar 2014 o Ano de Odylo Costa, filho (1914-2014).

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Sebastião Jorge é professor emérito da UFMA, jornalista e advogado