Com o fim formal da ditadura (1985) e a estabilização da economia (1994), o Brasil passou a enxergar com mais clareza o seu atraso civilizatório. Ficou mais visível como são difusos os valores da nação. O vídeo do prefeito do Rio, Eduardo Paes, jogando sujeira no chão é apenas um microexemplo do caráter e dos costumes nacionais.
Há alguns anos, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu um bombom de cupuaçu. Comeu e também jogou o papel no chão sem nenhuma cerimônia.
A greve dos garis no Rio expôs ao país como sua população é composta por Eduardos e Lulas. O volume de lixo jogado nas ruas do balneário fluminense é incompatível com uma sociedade desenvolvida. O brasileiro em geral se comporta como se o espaço público não fosse seu. Todo tipo de porcaria é arremessado na calçada, sem o menor remorso.
Reedição da “Lei de Gérson”
Seria possível escrever um tratado a respeito. Ficarei apenas no capítulo sobre a responsabilidade dos políticos e governantes em geral. O Brasil gasta bilhões de reais com publicidade estatal. Quase nunca esses recursos são usados para algum tipo de campanha a favor, por exemplo, de hábitos mais civilizados das pessoas nas ruas. Pior: certas propagandas com apelo cívico erram o alvo, como aquele comercial paraestatal martelando que “o melhor do Brasil é o brasileiro”, cujo objetivo era melhorar o astral geral do país.
Se há um povo com excesso de autoestima é o brasileiro. Em ano de Copa do Mundo, nota-se até uma certa arrogância no ar. A campanha de uma marca de guaraná estrelada pelo jogador Neymar eleva ao paroxismo o mau-caratismo nacional. Reedita a “Lei de Gérson”. O camisa 10 brasileiro escreve frases em português para estrangeiros que não sabem o idioma se autoridicularizarem ao pedir a bebida (http://bit.ly/Neymar-trote-guarana). Ao final, fala o anunciante: “Todo mundo quer, mas só a gente tem.” É verdade.
******
Fernando Rodrigues, da Folha de S.Paulo