Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Ausência de autoridade na comunicação social do governo

O jornalista Luciano Martins Costa publicou artigo sobre a seca que aflige os reservatórios de água de São Paulo; enquanto, ao mesmo tempo, dividendos da empresa de economia mista – Sabesp – serão distribuídos aos acionistas da companhia (vide aqui [“A Seca Seletiva”,edição 793 do Observatório da Imprensa]). Além do incômodo da notícia – situações climáticas desfavoráveis, racionamento e reajuste de tarifa vs. valor pecuniário distribuído aos acionistas pela sociedade responsável pelo abastecimento de água –, o fato envolveria, ainda, as questões de: (i) o que seria a distribuição de dividendos; e (ii) a imprecisão da comunicação social do governo, posto que se trata de uma sociedade de economia mista cujo controle majoritário pertence ao Estado e cuja atividade principal diz respeito à infraestrutura pública.

O pagamento de dividendos pela empresa nada mais é do que a divisão de lucros, de um determinado ano fiscal, aos acionistas que detêm cotas da empresa na bolsa de valores. Como sociedade listada na BMF Bovespa, com relação a um ano fiscal, a Sabesp, por exemplo, tem que distribuir, no mínimo, 25% do seu lucro líquido ajustado. O lucro líquido ajustado da companhia inclui no valor do seu cálculo um ganho de capital isento de imposto de renda ao acionista. Em cálculo simples: se o acionista possui 1000 ações e a taxa de dividendos ajustada – ao que parece, para a Sabesp, no exercício 2013, ficou em 0,78% –, todos os acionistas receberiam em torno de R$780,00. Todavia, após a distribuição de dividendos aos acionistas, há um impacto no preço do valor da ação. Se considerarmos que uma ação ordinária da Sabesp, hoje, valeria, aproximadamente, R$20,00, o valor do ativo (da ação) se desvaloriza após a distribuição dos dividendos, conforme a equação: R$20,00-R$0,78 = R$19,22.

A regra de que o lucro líquido de um ano fiscal seja distribuído aos acionistas, via dividendos, apenas em parte (ordinariamente na faixa de 25%), tem o propósito de fornecer condições de reinvestimento para a companhia. A ideia original contempla, inclusive, o fato de os acionistas reinvestirem os dividendos recebidos comprando mais ações da sociedade com os dividendos recebidos. Esse rationale é eficaz para os agentes econômicos privados.

Comunicação social depende de São Pedro?

Porém, quando se trata de uma sociedade de economia mista, com controle majoritário do Estado, o funcionamento da prática no campo dos valores mobiliários não funcionaria conforme a ideia original. Tome-se, por exemplo, a Sabesp. Independentemente de seus investimentos na infraestrutura pública, o patrimônio líquido poderia, equivocadamente, ser valorizado, por uma conjuntura de subsídios públicos ou aumento excepcional de tarifa, em função de condições climáticas conjunturais, ao arrepio do equilíbrio financeiro do contrato de concessão.

Neste particular, responde-se ao texto formulado por Luciano Martins Costa. O que se percebe, salvo melhor juízo, não somente com relação ao tema exposto aqui, mas, ainda, ao racionamento de água e reajuste de tarifas de energia em função de condições climáticas, seria a ausência de autoridade na comunicação social do governo.

No início do mês de fevereiro, o governo anunciou, peremptoriamente, que a ausência de chuvas e as intempéries climáticas não afetariam a tarifa de energia suportada pela sociedade (vide aqui). Como já disse o poeta Manoel de Barros – as andorinhas sabem mais da chuva do que os cientistas –, durante o mês de março não houve chuva alguma; e o discurso anterior hesitou em sua proposição original e anunciou outro curso de ação.

Hoje, estuda-se a possibilidade de os consumidores dividirem com o governo um suposto aumento da conta, em função da necessária utilização da energia provida pelas usinas termoelétricas (vide aqui).

E a pergunta que se faz é a seguinte: se continuarmos sem chuva em abril, sobrará todo o reajuste de tarifa da energia elétrica a ser suportado exclusivamente pelos consumidores? A comunicação social do governo depende de São Pedro?

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Adendo –  Em 15 de abril de 2014, divulguei que a comunicação social do governo, hesitante, lançava as opções: (i) o consumidor não custeará a majoração das tarifas elétricas; logo a seguir, (ii) o governo estudará formas de a majoração das tarifas de energia elétricas serem compartilhadas entre sociedade civil e governo; mas, (iii) os cidadãos, pessoas naturais e agente econômicos suportarão sozinhos a majoração da tarifa, que se situa entre – vide aqui as porcentagens de majoração para cada região do pais (ver aqui).

 

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Eduardo Ribeiro Luna Toledo é consultor jurídico e escritor