O programa de Roberto D’Avila, na GloboNews, teve como entrevistado, no sábado (5/4), a inexorável figura do ex-ministro Delfim Netto. O começo foi bom. Da metade até o final, não foi fácil chegar ao fim. No mês dos 50 anos do golpe, nada mais intrigante do que ouvi-lo. Aos 86 anos, ele está na ativa. Sobre Lula, dá 9,5 de nota e o classifica como um diamante bruto. Se diz otimista com o futuro do Brasil e acha o Bolsa-Família um programa exemplar.
Ao mesmo tempo, chama o golpe de redentor. Afirma que assinaria novamente o AI-5 e diz que nunca soube de torturas durante o regime. Acreditar ou não? Não só caricato, Delfim Netto é complexo. Dentre as muitas histórias, contou que foi até o ex-presidente Médici perguntar se “os boatos” de que havia tortura eram verdadeiros. Disse ter ouvido da boca do presidente que o questionamento não procedia. Para ele, não havia motivos para duvidar de Médici. Não?
A história do Brasil parece passar ao longe das verdades que a cercam. E respostas como a do ex-ministro obscurecem ainda mais esse passado tenebroso. Como alguém tão próximo e tão poderoso do regime pode negar o que se sabia e o que hoje está mais do que comprovado? As torturas não só foram praticadas, como legitimadas pelo Estado. Elas foram um instrumento de repressão e deram poder à ditadura.
A negação de mazelas
Como, portanto, entender que figuras como a de Delfim com tantas peculiaridades, dentre elas inúmeras positivas, venha a público e seja condescendente com aquilo que não mais precisa ser? Delfim chorou durante a entrevista ao lembrar-se de um encontro com Juscelino Kubitsheck, na França, quando o ex-presidente vivia o amargo exílio e o ex-ministro era embaixador em Paris. Sabia que JK sofria por não poder voltar ao Brasil.
Juscelino voltou e foi morto por esse regime que agora Delfim chama de redentor. Ao que tudo indica, Jango também o foi. Herzog, Zuzu Angel, Stuart, Rubens Paiva e tantos outros tiveram o mesmo fim. Antonio Delfim Netto, se não negasse as mazelas e barbaridades da ditadura, não perderia seu posto de “O Grande Homem da Economia”. Ganharia, pelo contrário, o título do homem sério que é, acrescido de honras a um verdadeiro homem democrático e de Estado. Preferiu não fazê-lo.
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Rodrigo Silva é professor e estudante de Jornalismo