Nonnato Masson (1924-1998), até então, nunca se dirigira a mim, nem eu a ele. A diferença de idade era grande. Não ouvi a voz, mas lia tudo o que escrevia. Torcia por uma aproximação. Levou anos até chegar ao objetivo. Olhava-o de longe e corria para ler as reportagens publicadas nos jornais, para os quais trabalhou principalmente, O Globo, da mesma empresa dos Diários Associados, que edita O Imparcial e no qual reinava absoluto nas tardes. Ninguém o superava e poucos chegavam perto.
Ficava fascinado com o estilo dos textos repassados de citações de autores clássicos, que enriqueciam as reportagens e outros assuntos (contos e novelas para rádio) que produzia. Sabia atrair leitores com uma escrita simples e objetiva quando descrevia um fato. Tinha faro para o assunto e sensibilidade para apresentá-lo.
Com uma grande bagagem cultural extraída dos livros e da experiência dominava ao seu modo os assuntos selecionados. O leitor o esperava com ansiedade pensando no outro dia, para voltar a lê-lo. Em certas ocasiões o jornal via-se obrigado a tirar uma segunda edição pela procura dos exemplares. Por estes motivos eu o escolhi a tornar-se meu professor silencioso, sem sala de aula e longe dos olhos e ouvidos. Eu era apenas um adolescente que amaria um dia os Beatles e gostava das velhas canções de amor que tocavam nas rádios, numa época sem televisão. E o fazia por prazer e dose de romantismo. Algumas de elas eu decorava toda a letra ou trechos que tocavam no meu coração.
O mestre do jornalismo Masson ensinou-me sem me dirigir a palavra. Ele não falava; escrevia e eu o lia, relia e aprendia. Procurava fixar na memória o quê e como dizia, em particular, certas frases, jargões e expressões que considerava o máximo. Comecei no jornalismo, início da década de 60, trabalhando nos Diários Associados, exatamente no jornal onde trabalhou – O Globo. Antes passei pelo Jornal do Dia, onde conheci os jornalistas Edson Vidigal, Ribamar Fonseca e Ubiratan Teixeira, com os quais, não nego, aprendi certos macetes. Nessa fase, inclua-se o redator-chefe (que não se usava a palavra editor-geral, disto e daquilo), o excelente editorialista, Walbert Pinheiro, que colocava o papel na máquina de escrever e na revisão não acrescentava nada.
À espera do centenário
Incursionou também como historiador, cronista e poeta. Deixou a empresa em 1956, mudando-se para o Rio de Janeiro, para trabalhar no melhor órgão do país, o Jornal do Brasil, a convite do Odylo Costa, filho, o reformador do respeitado diário. Lá encontrou outros maranhenses, com nomes respeitados na imprensa carioca e conhecidos nacionalmente, como, Ferreira Gullar e Lago Burnett. O grande repórter alcançou ambiente perfeito para ampliar a habilidade na arte de escrever e fazer reportagens. Não custou muito para obter o reconhecimento dos leitores do JB que passaram a apreciar aquele repórter de assuntos criativos e de interesse geral, tanto que, ganhou uma página só dele, para escrever semanalmente – “Brasil, para seu governo”, sucesso sem precedentes, por tratar de assuntos da nossa história.
No ano de 1960, Jânio Quadros é candidato a presidente da República e percorre o país, incluindo no roteiro esta cidade. Na sua comitiva como enviado especial do JB veio Nonnato Masson. Aproveitou a oportunidade e deu uma esticada até a sede dos Diários Associados, para rever velhos amigos. Foi nessa oportunidade que o conheci, apresentado por Victor Gonçalves Neto, que chefiava a redação de O Globo e eu era repórter de polícia. Conversamos e contei o que fazia em busca de uma aprendizagem e conseguir escrever para jornal. Riu e aconselhou-me, simplesmente: “Leia e leia muito”.
Quando retornou de vez para São Luís (1976), que tanto amava, nos encontrávamos, ocasionalmente, na banca de revista do João, na Praça João Lisboa. Uma alegria para mim. Geralmente ao cair da tarde, quando eu voltava do campus universitário, onde ministrava aulas de jornalismo.
Esta uma homenagem a quem merece pelos méritos e dedicação ao bom jornalismo. E o fazemos prestando outra homenagem: os 88 anos de funcionamento de O Imparcial (1º de maio), cujo prestígio junto ao público reafirma a consagração dos valores de quem se soube impor pela seriedade e respeito, aliados a habilidade de saber renovar-se, para perdurar até, hoje.
Contrariando as previsões pessimistas sobre o fim do jornal de papel pela presença ameaçadora das tecnologias digitais e a internet, com estragos irreparáveis ao setor no mundo, hoje, parodiando o poeta Gonçalves Dias, só os fortes resistem, aliás, aqueles que souberam aplicar a inteligência e acreditar na criatividade. Por essa ótica, O Imparcial vai bem. O centenário o aguarda, o que é bom para o jornal de papel no Brasil.
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Sebastião Jorge é professor emérito da UFMA e jornalista