Para quem cultiva o hábito de fazer a leitura crítica e diária dos jornais e noticiários da TV, fica fácil constatar que a imprensa oficial (aquela veiculada pelas grandes mídias e celebridades do jornalismo) se perdeu do caminho das ideias, abandonou a argumentação embasada em credibilidade e aderiu à fúria irracional e destrutiva. Como falharam em desconstruir os programas sociais que ergueram da miséria absoluta um exército de desfavorecidos, os conservadores migraram para a tática do desespero. Quem não convence pelo discurso, tenta intimidar pelo grito; quem não conquista o amor, responde com o ódio.
Um exemplo clássico de injúria jornalística destituída de ideias pode ser apreciado num texto do colunista Arnaldo Jabor publicado no jornal O Globo e em outros periódicos sob o título de “Volto ou não volto?” Numa longa e dispensável dissertação, o colunista não desenvolve nenhum pensamento útil, mas deixa escorrer o fel que tem como única finalidade a ação de desqualificar pela humilhação, pelo xingamento. De nenhum parágrafo brota a proposta ao debate, nenhuma linha comporta um incentivo ao questionamento. Jabor enlouquece num rosário pejorativo de ironias que só se justificam na intenção pobre de ofender Luiz Inácio Lula da Silva.
Usando a narrativa em primeira pessoa, ele fala como se fosse o próprio Lula confessando que despreza operários, colocando os próprios operários como pretendentes ilegítimos de uma posição que não lhes pertence na pirâmide social; afirma, com o fictício Lula, que “comeu” professoras de universidade graças ao seu destaque internacional e se auto define como uma farsa. Através dessa máscara de recalque, Jabor conclui celebrando o seu afeto por Fernando Henrique Cardoso e coloca Lula como um imitador e ladrão do legado do PSDB. Qual a utilidade desse circo de horrores?
A miséria no seu devido lugar
O jornalista Luiz Carlos Prates, durante um noticiário da TV RBS de Santa Catarina, expressa sem pudores que “hoje qualquer miserável tem um carro”. Em outras palavras, a revolta é contra concederem ao pobre o direito de possuir um bem que antes estava restrito às classes mais abastadas. Ou seja, em pleno século 21 um comentarista propaga um discurso de exclusão através de rede nacional e num veículo de comunicação que é concessão pública. Se antes não nos causasse indignação, nos provocaria nojo.
Como podemos defender a liberdade de expressão diante de um jornalismo político que se apega cada vez mais à cretinice de ocasião? Por que temer pela livre imprensa quando grande parte da mídia permite e aplaude a irresponsabilidade dos que fazem do jornalismo brasileiro uma caricatura tosca do descaso social? Para que exigir a aprovação da PEC do Diploma se os holofotes iluminam somente os xingadores raivosos?
Entristece observarmos que uma parcela da imprensa desistiu da palavra bem posta e se desviou do debate promissor das ideias. Sem capacidade para refutar, preferiram seguir pelo caminho fácil da desqualificação. No lugar da palavra, adotaram a bílis. Não querem saber de inclusão social, a ordem é que a miséria fique no seu devido lugar.
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Alexandre Coslei é jornalista