Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A mídia e o aumento do número de suicídios

Existe uma espécie de convenção no meio jornalístico que concorda em não noticiar casos de suicídio. Outros tipos de violência, entretanto, são noticiados regularmente e às vezes de maneira detalhada. Um dos motivos para essa não veiculação é o argumento que em momentos de divulgação de casos de suicídios, o número de ocorrências tende a aumentar. Um dos casos mais conhecidos é do livro Os sofrimentos do jovem Werther, de Goethe, publicado em 1774 e que foi sucedido por centenas de suicídios. Um outro caso foi em Viena, em 1986, quando o número de suicídios dobrou em um período de dezoito meses após uma cobertura sensacionalista de um caso.

Uma pesquisa divulgada hoje (4/09) pela OMS – Organização Mundial da Saúde atesta que o suicídio se tornou uma epidemia de proporções globais. O suicídio mata mais de 800 mil pessoas por ano e 75% dos casos acontecem em países emergentes e pobres. O Brasil ocupa a 8ª posição com maior número de casos, mais de11,8 mil em 2012, ainda que em proporção ao tamanho da população a taxa seja inferior à média mundial.

Ainda assim, o comportamento tem atingido número cada vez maior de pessoas no nosso país. Segundo especialistas, o número cresceu mais de 10% nos últimos anos. Ainda que a mídia adote uma política de não se noticiar os casos de suicídio, eles continuam acontecendo e aumentando. Então, como proceder?

O manual da Associação Brasileira de Psiquiatria, Comportamento suicida: conhecer para prevenir. Dirigido para profissionais da imprensa, publicado em 2009, sugere que reportagens acerca de casos de suicídio sejam discretas e cuidadosas, sem o uso de detalhes. E que aconteçam principalmente quando o falecido era celebridade ou localmente conhecido.

Só 28 países possuem medidas preventivas

O caso mais recente foi o do ator Robin Williams, encontrado morto no dia 11 de agosto e que teve como causa de morte suicídio por asfixia. O caso foi amplamente divulgado pela mídia americana e internacional devido à longa e bem-sucedida trajetória que o ator e comediante possuía no cinema e na TV. A repercussão também foi grande e entre uma das principais questões levantadas foi o alerta para os perigos da depressão, doença de que o ator sofria e que influenciou diretamente no ato.

Sempre que ocorrem casos que envolvem a depressão, a doença entra em pauta. A mídia divulga sucintamente, junto com os casos, os sintomas, modos de prevenção da doença e recomendações à procura de ajuda especializada. Essas pontuações são válidas e podem ajudar pessoas que estejam sofrendo com a doença, mas até que ponto essa divulgação de informações pela mídia produz resultados efetivos? Porque elas consistem majoritariamente na divulgação de informações em momentos específicos. A comoção é temporária e depois que o caso que transformou a doença em notícia envelhece, ninguém mais comenta sobre o assunto, mas a depressão continua atingindo milhões de pessoas. E mesmo com essas colocações não surge nenhuma ação prática ou espaços de discussão.

Até que ponto essa transmissão de informações é apreendida pelos indivíduos? Eles passam realmente a compreender o assunto? Porque ainda existem pessoas que não compreendem a dimensão da doença e acreditam que as pessoas fazem isso para chamar atenção ou que são curáveis apenas por um querer. O estigma das doenças mentais, tanto no Brasil quanto no mundo, ainda é muito grande. É necessário abrir um espaço de discussão sobre isso na nossa sociedade, para compreender o funcionamento dessas doenças e diminuir o preconceito que envolve essas questões, assim como um de seus efeitos, o suicídio.

A mídia poderia participar dessa divulgação contínua de informações, abrir um espaço para a discussão para que as causas, sintomas e efeitos sejam entendidos pela população em geral. A mídia poderia também se envolver na divulgação de ações práticas.

A OMS, depois dos dados da pesquisa divulgada, pretende lançar campanha para ajudar governos a criarem programas de prevenção para o suicídio. Hoje apenas 28 países possuem medidas preventivas. Dia 10 de setembro é considerado o dia da prevenção do suicídio, resta saber quantos veículos da mídia vão divulgar essa informação.

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Raphaela Ayres é estudante de Comunicação Social