De uma hora para outra, o mesmo anúncio aparece por toda parte, em quase todo site que você acessa, em qualquer língua. É a chamada publicidade programática, que utiliza um software para encontrar os usuários da internet que mais interessam ao anunciante, levando a mensagem até eles em tempo real.
A consultoria Outsell estima que “programmatic advertising”, expressão da moda no setor de mídia, já é 75% dos investimentos publicitários digitais nos EUA.
“No fundo, programático’ significa simplesmente associar tecnologia automatizada à compra, à alocação e ao rastreamento da publicidade digital”, diz Ken Doctor, analista-chefe da Outsell.
Em outras palavras, todo o processo da publicidade –da encomenda ao pagamento, passando pela verificação de que está atingindo o alvo– começa a ser automatizado.
Doctor acredita até que a palavra “programático” desapareça com o tempo, pois a automação parcial ou completa alcançará 98% da publicidade digital nos EUA já em 2018. Programático e digital virariam sinônimos.
“A questão é: por que um anunciante não usaria tecnologia para ajudar a tornar os seus investimentos mais baratos e os seus resultados mais eficientes?”, diz.
Veículos
Os publishers (veículos), sobretudo jornais de prestígio como “New York Times” e “Wall Street Journal”, têm respondido à tendência “programática” em duas frentes, segundo Doctor.
Dão novos passos na adoção de tecnologias programáticas próprias, oferecendo resultados em tempo real aos anunciantes e, de maneira geral, produzindo otimização.
“Isso reforçou os resultados do Star Tribune’, por exemplo, de tal forma que sua taxa anual de crescimento em publicidade digital acompanha agora o crescimento geral, com cerca de 15%.”
Na segunda frente, dão “ênfase às relações com marcas e agências top, como forma de competir com a concorrência quase puramente programática” dos gigantes Google e Facebook.
A publicidade programática pode ser feita diretamente com grandes veículos, criando uma relação mais eficiente de resultados através de acordos preferenciais.
Segundo Regina Augusto, diretora do “Meio & Mensagem”, que produz o relatório sobre investimentos publicitários Inter-Meios, “no Brasil a mídia programática ainda é bem recente”.
De início, “os publishers viam como algo ameaçador, mas essa percepção está mudando, porque pode ser uma alternativa para não ficarem reféns de Google e Facebook”.
Sinal da mudança, já operam no país as “ad networks”, redes publicitárias que oferecem tecnologia para automatizar e customizar anúncios.
“Nos EUA, a mídia display [banners] cresceu 29% em 2013 em função da compra programática”, diz Augusto. “Há quem diga que é um renascimento dos banners.”
Agências
Mas o assunto ainda é pouco claro para o mercado, sobretudo no Brasil.
E por aqui “a maior resistência está nas áreas de mídia [nas quais, tradicionalmente, pessoas decidem sobre a colocação de anúncios] das agências tradicionais, não nas digitais”.
Sócio e vice-presidente de mídia da agência Loducca, também presidente do Grupo de Mídia, Daniel Chalfon diz que a publicidade programática “ainda não é significativa no Brasil, em volume”.
Mas, “como oferece uma boa dose de tecnologia, com uma boa dose de targeting’ [direcionamento], tem possibilidade de crescer” também no país.
“A grande questão é que boa parte da mídia programática disponível hoje é no que a gente chama de inventário no escuro’”, acrescenta.
“Ou seja, você compra com base numa segmentação de comportamento do usuário, porém não sabe direito onde vai sair [o anúncio]. Se o cara for a um site pornô…”
Por outro lado, há a polêmica sobre privacidade, acrescenta Chalfon, citando a decisão judicial europeia sobre o “direito de ser esquecido” nas buscas do Google.
Esse movimento pode crescer e fazer as empresas perderem seus dados, diz ele.
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Para Google, modelo traz mais eficiência
Procurada para comentar o crescimento da publicidade “programática” (que usa recursos de tecnologia para atingir seus consumidores alvos na internet), a Rede Globo respondeu que sua “área de comercialização de mídias digitais está permanentemente atenta às tendências do mercado”.
No entanto, a empresa respondeu também que “neste momento, está focada nos atuais modelos de comercialização disponíveis na Globo.com”, portal do grupo.
Para Sérgio Maria, diretor de parcerias estratégicas do Google Brasil, “o principal ponto, trazendo aqui para o Brasil, é que tem muita confusão ainda de programático com real-time bidding’” (RTB), lances em tempo real.
RTB “é um pedaço do programático, para transacionar em forma de leilão”, diz Sérgio Maria. Mas, acrescenta, a mídia programática “é muito mais”.
“O que costumo dizer é que o papel do programático não é mudar o modelo de negócios e sim automatizar o processo para que fique mais eficiente. Mantém o modelo de negócios como está”, afirma o diretor, que é responsáveil pela relação do Google com os publishers dos veículos de comunicação. (N.S.)
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Nelson de Sá, da Folha de S.Paulo