A tentativa de incendiar a casa de Patrícia Moreira, a torcedora do Grêmio, foi um desfecho dos mais prováveis para a forma como o assunto foi divulgado, desde o início. Tudo começa com a busca por ganhar audiência, que privilegia a criação de personagens, que devem ser a personificação do Bem ou do Mal. Com a imagem que forneceu, Patrícia Moreira foi o Judas da vez. Quanta audiência não deu oferecer aos “justos” a oportunidade de malhá-lo?
Não que a atitude coletiva que ela personificou seja irrelevante. Pelo contrário, é absurda. Mas há um provérbio chinês que diz: “O dedo aponta a estrela: o tolo olha o dedo, o sábio olha a estrela”. Nossa mídia oferece, notícia após notícia, dedos para serem olhados/cortados. Raras vezes tem a coragem/dignidade de revelar a estrela/ferida que aqueles dedos apontavam.
E ainda dizem que estão prestando um serviço público. Serviço público ocorreria se fizessem uma discussão séria sobre o preconceito, mostrando que tais “brincadeiras” reproduzem um olhar discriminatório sobre o outro, que é ativado, por exemplo, quando se conclui, sem base alguma, que entre os suspeitos de um crime o provável culpado é o cara negro. Isso tiraria a moça do primeiro plano e colocaria toda a sociedade para refletir.
“Este Judas já está malhado”
Mas isso tiraria o foco do “Judas” e faria com que cada um dos “atiradores de pedras” refletisse sobre os próprios “pecados”. “Cruzes”, pensam os donos da mídia, “isso não dá audiência.”
E segue o barco…
Enquanto isso, numa redação qualquer, já há alguém pensando: “Este Judas já está malhado. Quando estas porcarias de jornalistas vão arrumar outro para saciarmos a fome dos leões?”
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Cristiano Otaviano Verutti é jornalista e professor de Jornalismo