Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A propaganda na TV

Numa disputa tão acirrada quanto esta, em que os dois candidatos chegam em empate técnico à reta final, os debates e programas eleitorais na televisão têm um papel decisivo, o derradeiro momento para conquistar os eleitores indecisos que farão a diferença. A esta altura, se eu fosse candidato me dedicaria só a estas duas agendas e cancelaria o resto.

Se depender do programa de televisão, com os dez minutos reservados para cada lado, não tenho dúvida: vai dar Aécio Neves no próximo domingo. Cheguei a esta conclusão depois de acompanhar boa parte dos programas, desde o início da campanha oficial e, principalmente, pelo que vi na noite de sábado [18/10].

Claro que mil outros fatores podem influir na decisão do eleitor e levar Dilma Rousseff a conquistar a reeleição, mas isto com certeza não se dará por conta da propaganda do horário político na televisão. Ao contrário, a presidente pode ganhar apesar dele, pois se trata de uma das piores e menos criativas produções já levadas ao ar pelo PT, em seus mais de 30 anos de história.

Desta vez, aconteceu tudo ao contrário das três eleições anteriores em que o PT derrotou o PSDB também na televisão. Parece até que os dois partidos trocaram de marqueteiros um com o outro. Nem sei quem são os criadores do programa tucano, mas em 2014 eles levaram larga vantagem ao vender seu peixe, lembrando o ritmo, os jingles, a riqueza de imagens e o alto astral das velhas produções petistas, centradas na emoção, que brilhavam mesmo quando o partido perdia as eleições.

Seria injusto, a meu ver, atribuir a responsabilidade apenas à grife do marqueteiro João Santana e sua equipe, que comandaram os programas de TV nas últimas três vitoriosas campanhas petistas, já que no governo Dilma só quem manda é Dilma, e ela não ouve ninguém.

Pluralismo saudável

Fico pensando de onde tiraram esta estética ufanista que lembra os cinejornais do Jean Manzon nos tempos do “Brasil Grande” dos governos militares, com sua profusão de imagens apoteóticas de grandes obras, números grandiosos, projetos e mais projetos, colocando a própria presidente como protagonista onipresente no programa, em lugar de dar mais voz aos brasileiros anônimos, contando as mil e uma histórias dos que melhoraram de vida nos governos de Lula e Dilma. Não sou especialista em marketing político, mas sei que é sempre melhor os outros falarem bem da gente do que nós mesmos ficarmos mostrando a toda hora como somos ótimos. O programa de Aécio soube fazer isto muito bem.

Além de Dilma não ser propriamente uma política carismática e ter dificuldades de expressão, fica muito chato repetir discursos e cenas ao longo de toda a campanha na televisão. Teria saído bem mais barato, e certamente seria bem mais eficiente investir em jornalismo, em reportagens de campo, surpreendendo o telespectador a cada dia ao mostrar o que mudou na vida real dos brasileiros, em lugar de martelar slogans e imagens computadorizadas de propaganda baseados unicamente nas pesquisas qualitativas que o mago Santana sempre carrega debaixo do braço para justificar suas decisões.

Agora faltam apenas seis programas, os 60 minutos finais de televisão, para que Aécio e Dilma se dediquem ao papel que qualquer candidato a qualquer cargo, em qualquer época, deve assumir: ser um vendedor de esperanças, não um pregador de realizações passadas. Se possível, fazer isso com bom humor e muita emoção.

A análise publicada acima sobre os programas eleitorais na televisão nada tem a ver com meu voto, que sempre foi para o PT, desde que o partido existe, como sabem todos os que me acompanham, e eu nunca escondi, pois defendo que todos os profissionais, e também seus veículos, deveriam deixar claro de que lado estão, acabando com esta hipocrisia de neutralidade, apartidarismo, independência editorial e outras bobagens.

Como jornalista, porém, não faço campanha a favor nem contra ninguém, até porque acho que acabou esta história de “formadores de opinião”. Somos hoje igualmente todos emissores e receptores de informações e opiniões, ninguém mais é dono da verdade. Tá claro?

A propósito, lembro de um episódio do início dos anos 80. Às vésperas da primeira eleição direta para governadores de Estado, em 1982, ainda durante a ditadura, o dono da Folha, meu velho e bom amigo Octavio Frias de Oliveira, solicitou aos repórteres especiais do jornal envolvidos na cobertura da campanha que escrevessem pequenos artigos assinados declarando em quem iriam votar. Não fomos nós que pedimos isso, foi ele quem sugeriu, para demonstrar, na prática, o democrático pluralismo de opiniões que levou o seu jornal a ser o maior do país, como é até hoje.

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Ricardo Kotscho é jornalista