O nascimento do intelectual moderno se dá nas páginas do jornal, com a atuação de Émile Zola no chamado caso Dreyfus. O episódio é assaz conhecido. Em 1894, o oficial do exército francês Alfred Dreyfus, sob a acusação de ser um espião da Alemanha, é condenado sob gritos de “abaixo aos judeus”, alusão a sua origem familiar. O exército francês, por razões de Estado, oculta provas de sua inocência, dividindo a opinião pública entre os que se colocavam a favor dos interesses da pátria e, portanto, contra Dreyfus, e os que saíram em defesa deste último.
Em carta a Félix Faure, presidente da República à época, o escritor Émile Zola repete várias vezes a expressão “J’accuse!” [“Eu acuso”], defendendo Dreyfus e denunciando as pessoas que o acusavam justamente. O texto foi publicado como um manifesto de intelectuais no diário Aurore, em 1898, seguido por uma série de outros manifestos assinados por escritores e estudiosos e exigindo que o processo Dreyfus fosse revisto. Salienta-se no manifesto a defesa incondicional da verdade e dos direitos do cidadão, da verdade e da justiça, acima dos interesses do Estado.
O intelectual que individualmente se notabilizou pela escritura do documento, Zola, teve ao seu lado a presença de um grupo que lhe deu suporte. O nós expresso nos manifestos dos dreyfusards faz ressaltar mais ainda essa voz coletiva. A assunção do risco da publicação é prova efetiva de que há uma divisão que se quer registrar e um espaço na vida intelectual que se quer conquistar. Através de um manifesto, a aparição do intelectual na vida pública se dá, pois, com uma palavra que se quer ação: na intencionalidade do manifesto, dizer é, antes de tudo, fazer; de onde vem uma retórica da persuasão. O manifesto revela-se, assim, uma estratégia de intervenção, uma busca de conquista de poder simbólico, da formação de um campo cultural autônomo, e um gesto político de afirmação dos valores deste campo no mundo social.
O J’accuse dirige-se à nação, visando, em uma destinação alargada para sua palavra, o leitor comum, mas quer atingir efetivamente os formadores de opinião. Além disso, não é por acaso que se lança mão de um manifesto, cuja estratégia discursiva é claramente a expressão da palavra em ação, sinalizando um novo tempo, um antes e um após sua emissão. É deste modo que se pode considerar como típico do manifesto a divisão de seu discurso em dois tempos: o da evocação crítica e aquele da projeção utópica, a tomada de consciência mobilizadora. Desse modo, Zola e os demais manifestantes protagonizaram um dos capítulos mais edificantes da imprensa, fazendo valer “o direito público de saber”.
Propagar o saber produzido na sociedade
Este princípio de responsabilidade social pressupõe, segundo H. Eugene Goodwin, em Procura-se ética no jornalismo (1993), que “o público tem o direito legal de saber o que o governo está fazendo e que a imprensa é a representante do público na tentativa de saber isso”. O autor salienta, ainda, que “o direito do povo de saber” tornou-se “uma bandeira para aqueles muitos jornalistas que inferem das raízes da liberdade de imprensa a responsabilidade especial de serem os fiscais do governo, para proteger o povo dos abusos governamentais”. Theodore Peterson e Fred S. Siebert lançaram bases importantes para um sistema de jornalismo ético em Four Theories of the Press (1956), defendendo a tese de que uma imprensa livre deveria ter o perfil “sócio-responsável”. Esta louvável perspectiva ajudou a fortalecer a noção de “responsabilidade social” na atividade jornalística, fazendo lembrar que o bem do público deve ser tomado como único guia válido para escolher midiaticamente o tipo de notícia a transmitir. A imprensa, portanto, é uma instituição de utilidade pública no sentido de que ela tem responsabilidade perante o público a que serve.
Além de defenderem a liberdade de imprensa com responsabilidade social, os pensadores em questão criticavam a prática do “noticiário administrado”, termo cunhado por Goodwin. Trata-se de uma linha editorial conservadora na qual as notícias não são notícias até que alguém ou alguma autoridade diga que são. Agindo assim, os jornalistas, em nome da objetividade, simplesmente transmitem o que as pessoas importantes falam e fazem; não se preocupam com os porquês, nem em explicar seja o que for; deixam que os leitores tirem as conclusões por sua própria conta. A sociedade do conhecimento, diante das complexidades do mundo, exige não observadores neutros, mas jornalistas que se educaram nos assuntos sobre os quais escrevem, e que, por isso, podem interpretá-los segundo seu ponto de vista; só assim o público poderá tirar algum sentido dessas complexidades. Sobre essa demanda especial e específica, os jornalistas-escritores Machado de Assis e Lima Barreto, “mestres na periferia do capitalismo”, já estavam alertas, defendendo em seus escritos a função educadora da imprensa como responsável direta pelo esclarecimento da opinião pública em termos conscientes e consistentes.
Machado considerava o jornal como “a verdadeira forma da república do pensamento”, “a locomotiva intelectual em viagem para mundos desconhecidos” e “a literatura comum, universal, altamente democrática, reproduzida todos os dias, levando em si a frescura das ideias e o fogo das convicções”. Somado a este pensamento emancipador, presente no artigo “O jornal e o livro” (Correio Mercantil, 10 e 12/01/1859), Machado acreditava, ainda, que a imprensa poderia servir de veículo-chave para propagar e ampliar o conhecimento público sobre o saber produzido na sociedade, democratizando, assim, o poder. Nesse aspecto, cabe destacar o sentido dado pelo jornalista-escritor, no artigo “A reforma pelo jornal” (O Espelho, 23/10/1859), ao termo “discussão”:
“E o que é a discussão?
A sentença de morte de todo o status quo, de todos os falsos princípios dominantes.
Desde que uma coisa é trazida à discussão, não tem legitimidade evidente, e nesse caso o choque da argumentação é uma probabilidade de queda.
Ora, a discussão, que é a feição mais especial, o cunho mais vivo do jornal, é o que não convém exatamente à organização desigual e sinuosa da sociedade.”
Imprensa livre é essencial a um governo ético
Lima Barreto, a exemplo de Machado, foi partidário da tese de que, no embalo da discussão, no conflito de ideias, é que o jornalismo colhe seus melhores frutos, promovendo de maneira diversificada a inteligência coletiva.
Na crônica “Elogio da morte” (A.B.C., 19/10/1918), Lima compreende que, no exercício pleno da liberdade de expressão, convém o debate dialético de argumentos, viabilizado pelo fazer jornalístico ético. Porém, adverte o jornalista-escritor, tal prática encontrava forte resistência por parte do autoritarismo silenciador da crítica:
“Se nós tivéssemos sempre a opinião da maioria, estaríamos ainda no Cro-Magnon e não teríamos saído das cavernas.
O que é preciso, portanto, é que cada qual respeite a opinião de qualquer, para que desse choque surja o esclarecimento do nosso destino, para própria felicidade da espécie humana. Entretanto, no Brasil, não se quer isto. Procura-se abafar as opiniões, para só deixar em campo os desejos dos poderosos e prepotentes.
Os órgãos de publicidade por onde se podiam elas revelar são fechados e não aceitam nada que os possa lesar.”
Tanto Machado de Assis como Lima Barreto observaram, portanto, que os governantes mostram menos entusiasmo pela ideia de que os jornalistas estão obrigados a ser observadores críticos do governo. Por que os bons jornalistas incomodam tanto o sossego dos “donos do poder”? Com a resposta, Ana Dubeux, em “Viva o jornalismo” (Correio Braziliense, 30/11/2014):
“O jornalismo é um permanente estado de vigília, é o chato que olha pelo buraco da fechadura, que vasculha as contas alheias, que fuça o lixo, que esmiúça relatórios, que lê nas entrelinhas, que questiona e interpreta dados. É a janela indiscreta, o crítico de plantão, a câmera escondida. Respeitando os limites éticos, é assim mesmo que tem de ser. É função do jornalismo prestar esse serviço à população, exercer esse olhar curioso no dia a dia, em especial sobre políticos, que lidam com dinheiro público. Esse direito à informação é que deve ser inviolável.”
Existe um fecundo diálogo entre o parecer de Dubeux e a tese estadunidense, segundo a qual a imprensa serve como “cão-de-guarda” para com o governo, representando e providenciando informações para os cidadãos de maneira que possam inteligentemente participar do processo democrático. Sem os jornalistas observarem e revelarem as ações e a inação do governo, os leitores ficariam na ignorância e incapazes de tomar decisões inteligentes na hora de eleger e acompanhar seus representantes políticos. A imprensa livre é essencial para a existência de um governo ético, uma vez que ela viabiliza o foro onde o debate político se realiza.
“No jornal, o cidadão pode se demorar em digressões”
H. Eugene Goodwin relativiza a imagem do jornalista como “cão-de-guarda”, utilizando argumentos interessantes para este fim:
Alguns jornalistas consideram-se, a si próprios, como representantes, quase como defensores, do povo, particularmente dos mais pobres, e sua tendência é a de serem cães-de-guarda agressivos, farejando as falhas dos governos em todas as oportunidades. Outros jornalistas são mais do tipo cão-de-lamber-as-botas-do-dono – demasiado circunspectos, ‘demasiado intimidados, e demasiado respeitosos, diante das pessoas no poder’ – segundo Les Payne, do Newsday. A marcação jornalística do tipo cão-de-guarda também parece derreter e enfraquecer com o tempo, mostrando seus dentes mais afiados, por exemplo, durante o caso Watergate e abanando o rabo durante a presidência de Reagan.
Face ao alerta, é preferível escolher uma outra imagem para representar o periodista ideal. Muito mais do que um informante especial, o jornalista se configura como exímio educador, conforme destaca, argutamente, Luciano Mendes Costa, em “Novos meios, novos jornalistas” (Revista Leopoldianum, set. 1998): “O jornalista deve se qualificar para se tornar um educador, no sentido de ser capaz de, informando, estimular o leitor à reflexão e ao livre arbítrio, ferramenta básica ao exercício pleno da cidadania. O cidadão busca um jornalismo afirmativo, provocador de reflexões”. Para tanto, o escritor-jornalista defende uma quebra de paradigma no conceito de imprensa como empreendimento: “o jornal não pode seguir sendo, simplesmente, um negócio de comunicação. O jornal é um negócio de educação, instituição a serviço de um processo civilizatório, que será mais democrático quando mais afirmativo se revelar”. Dito isso, convém explicitar que o posicionamento arrojado de Costa compreende o jornalismo não só como busca de conhecimento, mas igualmente como atitude política. Em termos cotidianos, o jornalismo não é ato isolado, intermitente, especial, mas atitude processual de investigação diante do desconhecido e dos limites que a natureza e a sociedade nos impõem. Deve considerar os processos de informação e opinião como instrumentos essenciais para a emancipação. Não só para ter, sobretudo para ser, é mister saber. Fazer jornalismo ético é propor publicamente um diálogo inteligente com a realidade, contemplando convergentes e divergentes pontos de vista, com especial atenção e senso crítico. Cabe à imprensa incentivar a sociedade a fazer o melhor da melhor maneira.
Um jornalismo afastado da sua missão educativa alimentará o sensacionalismo nocauteador e a estupidez coletiva. Em contrapartida, quando funciona como bússola da opinião pública, a imprensa promove pessoas emancipadas de verdade. Instruídos, apresentamos melhores condições para propor e contrapor. Um ser social emancipado nunca entra no diálogo para somente escutar e seguir, mas para demarcar espaço próprio, a partir do qual compreende o do outro e com ele se compõe ou se defronta. Melhor explica Costa:
“[O jornal] estará cumprindo sua função educadora se, na sua relação com a sociedade, puder se colocar de forma transparente, sem medo do contraditório, expondo ideais que espera ver digeridas pelo público. Nesse aspecto reside a grande distinção com os outros meios: é no jornal que o cidadão pode se demorar em digressões, elegendo os temas de seu interesse ou o material que seja capaz de o conduzir a reflexões mais profundas ou satisfatórias.”
O jornalista conta o que acabou de ver e ouvir
A estrela-guia do jornalista-educador atende pelo nome de ética. Cláudio Abramo, em A regra do jogo (1988), propõe reflexões importantes, visando a sustentar a moralidade do profissional de imprensa, em termos de retidão e honestidade:
“Sou jornalista, mas gosto mesmo é de marcenaria. Gosto de fazer móveis, cadeiras, e minha ética como marceneiro é igual à minha ética como jornalista – não tenho duas. Não existe uma ética específica do jornalista: sua ética é a mesma do cidadão. Suponho que não se vai esperar que, pelo fato de ser jornalista, o sujeito possa bater carteira e não ir para a cadeia.
Onde entra a ética? O que o jornalista não deve fazer que o cidadão comum não deva fazer? O cidadão não pode trair a palavra dada, não pode abusar da confiança do outro, não pode mentir. No jornalismo, o limite entre o profissional como cidadão e como trabalhador é o mesmo que existe em qualquer outra profissão. É preciso ter opinião para poder fazer opções e olhar o mundo da maneira que escolhemos. Se nos eximimos disso, perdemos o senso crítico para julgar qualquer outra coisa. O jornalista não tem ética própria. Isso é um mito. A ética do jornalista é a ética do cidadão. O que é ruim para o cidadão é ruim para o jornalista”.
Em defesa da dignidade, a afirmação de Abramo ressalta que o jornalista logra êxito, quando se assume uma postura ética, verdadeira. Assumir a posição verdadeira é a melhor forma de resistência que existe contra toda espécie de opressão. Ela desaparece quando se assume uma posição de coerência e fidelidade ao que é verdadeiro. Abramo também revela para a sociedade o que ela deve esperar de um jornalista sensato e comprometido, pluralmente, com a verdade:
“O jornalista não pode ser despido de opinião política. A posição que considera o jornalista um ser separado da humanidade é uma bobagem. A própria objetividade é mal-administrada, porque se mistura com a necessidade de não se envolver, o que cria uma contradição na própria formulação política do trabalho jornalístico. Deve-se, sim, ter opinião, saber onde ela começa e onde acaba, saber onde ela interfere nas coisas ou não. É preciso ter consciência. O que se procura, hoje, é exatamente tirar a consciência do jornalista. O jornalista não deve ser ingênuo, deve ser cético. Ele não pode ser impiedoso com as coisas sem um critério ético. Nós não temos licença especial, dada por um xerife sobrenatural, para fazer o que quisermos.
[…]
O papel do jornalista é o de qualquer cidadão patriota, isto é, defender o seu povo, defender certas posições, contar as coisas como elas ocorrem com o mínimo de preconceito pessoal ou ideológico, sem ter o preconceito de não ter preconceitos. O jornalista deve ser aquele que conta a terceiros, de maneira inteligível, o que acabou de ver e ouvir. Ele também deve saber interpretar coisas como decretos presidenciais, fenômenos geológicos, a explosão de um foguete, um desastre de rua. Deve saber explicar para o leitor como o fato se deu, qual foi o processo que conduziu àquele resultado e o que aquilo vai trazer como consequência.”
A consolidação dos direitos humanos
Enriquecedor perceber a sintonia entre os argumentos de Abramo e Goodwin sobre a rede de valores que devem prevalecer no trabalho jornalístico de qualidade, viabilizando autores informacionais que permitem ao mundo e ao homem vir-a-ser, com plenitude. Defende o periodista estadunidense, no citado Procura-se ética no jornalismo:
“Na sua busca por práticas mais éticas, os jornalistas devem ser avisados para evitar a procura de privilégios especiais, para si e para a mídia. No sistema americano, a liberdade de imprensa e de expressão pertence a todos, não apenas aos jornalistas. E os jornalistas não deixam de ser cidadãos ou seres humanos quando vão para o trabalho. Os princípios éticos que segregam, do resto da sociedade, os jornalistas como classe, servem mal, tanto ao jornalismo como à sociedade. O que é necessário é uma série de princípios, baseados num jornalismo que sirva ao público, publicando agressivamente e relatando o que for, tanto quanto possível, a verdade, a respeito de acontecimentos e condições que preocupem o público, um jornalismo que colete e trate as informações com honestidade e imparcialidade, e trate ainda o público envolvido com compaixão, um jornalismo que, conscienciosamente, interprete e explique as notícias, para que elas façam sentido para o público.”
A ética funciona, assim, como controle de qualidade, evitando que o jornalismo escolha a sedução em vez da verdade, apelando para técnicas intensivas de persuasão que se confundem com a manipulação e perpetuam a trivialidade com notícias embaladas como meros produtos à venda. Ouvido pela Folha de S.Paulo (30/10/1995), Nizan Guanaes, expoente do mercado publicitário brasileiro, entorta os nossos ouvidos, dizendo: “Quando você quer seduzir alguém, conta a verdade? Mostra os seus piores defeitos? Não. Nem as pessoas nem os partidos, nem os anunciantes. Ninguém diz a verdade na hora de seduzir”. Imoral também é a declaração proferida por William Peter Hamilton, do Wall Street Journal, cujo teor foi destacado por Fernando Conesa Sanchez, no livro La libertad de la empresa periodistica (1978): “Um diário é uma empresa privada que não deve absolutamente nada ao público, que não lhe concede nenhuma franquia. Portanto, não lhe afeta nenhum interesse público. Pertence enfaticamente ao proprietário, que vende um produto manufaturado por sua conta e risco”. Opiniões infelizes deste naipe precisam ser enfrentadas com oposição inteligente, conforme sugere Eugênio Bucci, em Sobre ética e imprensa (2000):
“É verdade que a atividade jornalística se converteu num mercado, mas, atenção, esse mercado é consequência, e não o fundamento da razão de ser da imprensa. Do direito fundamental a que corresponde a imprensa, o direito à informação, resulta a ética que deveria reger os jornalistas e as empresas de comunicação – e deveria reger também os vínculos que ambos estabelecem com as suas fontes (as pessoas que fornecem as informações aos jornalistas), com o público e, sobretudo, com o poder (econômico, político ou estatal). Quando o poder age no sentido de subtrair ao cidadão a informação que lhe é devida, está corroendo as bases do exercício do jornalismo ético, que é o bom jornalismo, e corrompendo a sociedade.”
São os jornalistas-educadores que ajudam a zelar pelo jornalismo ético. Graças, principalmente, a eles, a imprensa passou de mera instituição publicadora de notícias para, além disso, ser porta-voz e condutora da opinião pública.
Como efeito dessa ação de interferência editorial sobre os fatos e a realidade, o jornalismo passou a deter força política e econômica e amealhar o respeito e o temor da opinião pública e dos setores sociais ligados ou próximos do poder. A imprensa conquista, em decorrência, a pecha de “o quarto poder”, tamanha a sua capacidade de atuar sobre a sociedade. Foi com o parlamentar inglês do século XVIII, Edmund Burke, que o termo “Quarto Poder” ganhou asas, a ponto de representar uma das definições mais consagradas sobre a imprensa. Reza a História que, na Câmara dos Comuns, Burke, apontando para a galeria da Imprensa, comentou: “ali está sentado o quarto estado, mais importante que todos os outros”.
A expansão comunicacional pelo mundo proporcionou a imprensa condições de estar, praticamente, em todos os lugares ao mesmo tempo, ajudando a transformar o mundo em “aldeia global”, como ressaltou Marshall McLuhan, na obra Os meios de comunicação como extensões do homem (1964). A respeito deste poder onipresente e onipotente das redes de comunicação, Tony Schwartz chamou a mídia de “Segundo Deus”. O professor de telecomunicação da New York University, em seu livro Mídia: o Segundo Deus (1985), afirma: “Os meios de comunicação estão dentro de cada um de nós. O evangelista diz: ‘Abram seus corações e recebam Deus!’. Nós abrimos os olhos e ouvidos e recebemos a mídia”.
Carlos Heitor Cony, por sua vez, no artigo “Imprensa, poder e força” (Folha de S.Paulo, 21/09/2012), opta por uma linha mais sóbria, ao argumentar que “na realidade, a mídia seria uma força, mas não um poder”. Para o escritor-jornalista, poder significa “autoridade”, que não assenta a imprensa, embora já lhe possa assentar “influência” como linha de força. Ponto pacífico, porém, é reconhecer que, ao longo da história, os jornais se fizeram presentes como tribuna ampliada para batalhas ideológicas, polêmicas, conflitos políticos, lutas e mobilizações sociais, instrumento de ataque e defesa de ideias. Até os dias de hoje, mesmo com a lógica publicitária e do entretenimento infiltrando na linguagem jornalística, a sociedade espera da nossa imprensa uma posição de vanguarda que privilegie um processo civilizatório favorável à expansão e consolidação da democracia.
Considerando todo o percurso histórico, são os jornalistas-educadores agentes diretamente responsáveis pela qualidade das empresas jornalísticas que devotam-se à causa da liberdade e, assim, capitaneiam várias cruzadas contra as injustiças e desigualdades sociais, lutando sim pela consolidação dos direitos humanos. Quando o jornalista-educador se pronuncia, a Imprensa se transforma em Primeiro Saber. A sabedoria – não a maioria – vale tudo!
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Marcos Fabrício Lopes da Silva é professor da Faculdade JK, jornalista, poeta e doutor em Estudos Literários