O físico baiano Frederik Moreira dos Santos ganhou o prêmio de melhor ensaio sobre ciência e religião da América Latina do instituto Ian Ramsey de Oxford, na Inglaterra. Num dos capítulos do livro “Teoria quântica: estudos históricos e implicações culturais”, onde ganhou o prêmio Jabuti.
Fez estágio como pesquisador visitante na Columbia University. Foi professor de Física na Universidade Federal da Bahia (Ufba) e Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Mestre em Filosofia Contemporânea (PPGF – Ufba) e doutorando pelo Programa Interdisciplinar em Ensino, Filosofia e História das Ciências (UFBA/UEFS). Sua pesquisa concentrou-se na área de História e Filosofia dos problemas nos Fundamentos da Mecânica Quântica, com atuação na área de educação para surdos, como professor bilíngue (Português/Língua Brasileira de Sinais).
Você ganhou o prêmio de melhor ensaio sobre ciência e religião da América Latina do instituto Ian Ramsey de Oxford, na Inglaterra. Além disso, escreveu um capítulo do livro Teoria quântica: estudos históricos e implicações culturais, que foi contemplado com o prêmio Jabuti. Atualmente atua na Columbia University. A mídia local – A Tarde, Correio, Tribuna da Bahiae outros veículos, alguma vez lhe procuraram para reportar estes fatos? Não é de interesse público? O que representa para a comunidade científica sua conquista, e quais os benefícios para a sociedade?
Frederik Santos – Não, não me procuraram. Sim, as questões que envolvem os conflitos entre crenças religiosas e científicas comumente aparecem nos jornais e revistas. Os veículos de comunicação frequentemente gostam de fazer algum circo entorno deste conflito, mas minha contribuição não veio para apimentar ou colocar brasa sobre tal conflito, ela veio tornar mais claro os limites do discurso e investigação científica para que não se exija deste além daquilo que se propõe. Minha pesquisa traz esclarecer as características fundamentais da prática científica e a possibilidade de se dialogar com outras matrizes de leitura sobre o mundo sem ter que sobrepujá-las.
Como você analisa a cobertura jornalística sobre Ciência e Tecnologia na Bahia? No Brasil?
F.S. – Cobertura jornalística sobre Ciência e Tecnologia na Bahia praticamente não existe nos grandes veículos da mídia baiana. As notícias se resumem a inovações na medicina e na agricultura, informações que servem às elites do nosso Estado. Parece que os editores dos veículos de informação na Bahia acreditam que ciência e tecnologia só interessam às classes altas, e mais do que isso, as informações estão a serviço dos interesses econômicos destas classes. Pois estes dois campos, a medicina e a agricultura, são fortes setores econômicos em nosso Estado que dependem de inovações técnico-científicas e que estão bem ligados a nossas elites tradicionais. No nível nacional a coisa muda um pouco quando tratamos dos grandes veículos impressos, mas quando vamos para rádio e tv, as maiores empresas de telecomunicações dão pouco valor à divulgação da C&T, principalmente as contribuições nacionais. Quando tem, o tempo dedicado a eles é estúpido! São os programas mais marginalizados na grade da programação.
Os jornais são reféns dos anunciantes? Como você avalia o jornalismo baiano?
F.S. – Não me sinto capaz de avaliar o jornalismo baiano como um todo, mas não acredito que a relação dos veículos de comunicação com os anunciantes seja razão suficiente para explicar o descaso e desinteresse destes para com a divulgação de C&T. Depende apenas de se investir na qualidade da informação neste campo que instiga a curiosidade de milhões.
Como o cidadão pode interferir para que os meios de comunicação melhorem a qualidade da informação?
F.S. – Aí está um tema complicado, pois os veículos de comunicação seguem as leis do mercado e do capital, dependem de audiência, anunciantes e de boas relações com os poderes políticos e empresariais. Assim, podemos contribuir pagando pelas informações ou lendo aquilo que achamos ter qualidade e que sejam de nosso interesse para nossa formação como cidadãos críticos. Ou seja, nos fatores em que envolve um grande jogo de interesses, por enquanto, podemos intervir apenas no fator audiência e em seu compartilhamento crítico.
Atualmente atua na Columbia University. Como é teu cotidiano científico? Como você analisa a cobertura da imprensa aí sobre ciência e tecnologia?
F.S. – Minha pesquisa atual envolve o campo do discurso científico e sua interface com outras leituras da realidade, como o discurso religioso. Meu cotidiano na Columbia consiste em leituras e encontros com pesquisadores onde discutimos sobre o trabalho um do outro através de seminários acadêmicos. Bem, percebe-se que o tempo dedicado a C&T nos telejornais da grande mídia também não é considerável, mas nos EUA pode-se ter acesso a uma larga variedade de jornais, revistas e canais (além de museus e outros espaços físicos de divulgação de C&T) especializados neste tema. Tudo isso a baixíssimo custo!
Existe pouco investimento para a pesquisa científica na Bahia?
F.S. – Sim, mas não só para a pesquisa quanto para a formação científica. Definitivamente, C&T é um empreendimento caro! Se quisermos realmente usufruir das benesses trazidas pelas inovações neste campo, precisamos de um orçamento muito maior e uma maior aproximação da indústria com o resultado de nossas pesquisas. Sem nunca deixar de investir em ciência básica, é claro!
Quais suas perspectivas para os próximos 10 anos na área científica?
F.S. – Eu sou otimista. Acredito que seja de melhora. Apesar das grandes lacunas que ainda temos na qualidade da formação empírica e investigativa, apesar de nossos laboratórios serem bem defasados, vejo algumas ações positivas no campo de C&T no Brasil, tais como: aumento no orçamento voltado pesquisa e formação em C&T, criação de novos centros de pesquisa, maior contratação de pesquisadores nas universidades públicas, ampliação do investimento na formação de pesquisadores no exterior em bons centros de pesquisa (como o que estou vivenciando aqui em Nova Iorque) desde a graduação. Acho que tudo isso irá criar uma demanda maior pela melhoria das condições de pesquisa aqui, senão teremos a maior fuga de cérebros de nossa história.
Você é a favor da regulamentação da mídia? Por quê?
F.S. – Sim, devemos criar condições para uma maior diversidade na mídia brasileira, os veículos de comunicação ainda estão nas mãos de poucos poderes oligárquicos. Uma maior diversidade abre espaço para variedade de conteúdo informacional e ideológico (isso inclui C&T) e as maiores concorrências obrigam as empresas a melhorar a sua distribuição para se ter mais acesso à informação. São tão poucos canais e jornais, então as empresas se dão ao luxo de priorizar o eixo Rio-São Paulo, pois os consumidores ali são suficientes para bancar boa parte do orçamento do veículo. Com a abertura para a criação de mais empresas na área, isso irá acabar. As rádios comunitárias precisam ter uma maior garantia de sobrevivência também. Enfim, defendo uma regulamentação que seja na direção da manutenção de um jogo de poder mais democrático que represente mais o interesse de muitos e não somente de uma pequena elite oligárquica.
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Antonio Nelson é jornalista