Não é que não existam bons filmes hollywoodianos sobre jornalistas bem-intencionados. “Todos os Homens do Presidente”, de 1976, deixou até ensinamento útil para o ofício: siga o dinheiro, “follow the money”. Outro exemplo é “O Informante”, com Al Pacino, de 1999.
Mas eles tendem a apresentar o mundo em preto e branco, o que os torna quase imorais, pois se dizem baseados em fatos reais. Por exemplo, sabe-se hoje que a fonte do primeiro filme, Garganta Profunda, fez as revelações para queimar um concorrente na disputa pela chefia do FBI –e não expor o caso Watergate.
Recém-lançado, “O Mensageiro” vitimiza um repórter que denunciou o elo da CIA com traficantes, mas teve seu trabalho desacreditado pela apuração de outros jornalistas –que o filme insinua serem manipulados pela CIA.
Melodramático e oportunista, apelando até para música do Clash para se justificar, é sobretudo um mau filme.
Como regra geral, Hollywood se sai melhor quando retrata jornalistas mal-intencionados, quando não abertamente sociopatas, caso de “O Abutre”. São os clássicos do jornalismo: “Cidadão Kane”, de 1941, “A Montanha dos 7 Abutres”, de 1951, “Rede de Intrigas”, de 1976.
Como Orson Welles, Kirk Douglas e Peter Finch nos três citados, Jake Gyllenhaal é o vetor do novo filme, no papel do jornalista: seu olhar congelado, não humano; a repetição automatizada que faz de manuais de administração e jornalismo; a racionalidade aviltante com que chantageia sua editora por sexo. E é só o começo.
Obviamente, no cotidiano do ofício, jornalistas não são heróis nem homicidas, mas é assim que Hollywood os vê –ou como comédia, algumas também clássicas, como “Jejum de Amor”, de 1940, com Cary Grant. Para composições mais multifacetadas, é preciso buscar noutras praias, como “Terra em Transe”, de 1967, com Jardel Filho.
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Nelson de Sá, da Folha de S.Paulo