Em janeiro, muita gente aproveita o clima quente do verão e as férias, ou pelo menos os fins de semana, para ir à praia ou à piscina. Os corpos ficam mais evidentes. Estrias, celulite, manchas e imperfeições ficam menos escondidas. Poucas são as mulheres que se sentem à vontade só de biquíni na praia. E por que isso acontece?
A indústria da beleza divulga em propagandas diversas um padrão físico simplesmente impossível de alcançar para a maioria das mulheres. Eu falo de mulheres comuns que trabalham usando a inteligência e a capacidade produtiva, cuidam da casa e dos filhos. A indústria vende um corpo ideal, lisinho, sem marcas, sem gordurinhas. E dá as “soluções” para conseguir manter a beleza, que vão desde maquiagens e cremes até procedimentos médicos e cirúrgicos. Assim, a mulherada trabalharia só para pagar o que fosse preciso para manter essa busca incessante e irracional pelo dito corpo perfeito.
O pior é que o jornalismo também embarca nessa. Recentemente, uma manchete do portal R7, com o título “Expectativa x realidade! O que acontece quando Fernanda Gentil tira a roupa”, foi altamente criticada nas redes sociais por expor fotos da jornalista esportiva da Rede Globo em uma praia do Rio de Janeiro. A publicação se referiu às características físicas de Fernanda Gentil utilizando palavras como “gordinha”, “bumbum reto” e “imperfeições”.
Só que dessa vez a manchete teve o efeito contrário a tantas outras já publicadas de conteúdo semelhante. A repercussão negativa foi tanta que houve pedido de esculpas à jornalista e as fotos foram retiradas do portal. Mas nem sempre o público repudia o conteúdo. Pelo contrário. Consome conteúdos desse tipo e alimenta o “jornalismo” que escancara a vida de famosos e dissemina preconceitos e falsos valores. As mulheres são as que mais sofrem com essa ditadura da beleza “perfeita”.
Saúde e padrão de beleza
Quantas manchetes enfatizam as celulites da atriz tal, a barriguinha de “Fulaninha” e as gordurinhas a mais de “Sicrana”. Eu disse manchetes! Ou seja, de acordo com o bom jornalismo, para que algo seja manchete é preciso seguir alguns critérios, como ter uma certa importância, ser incomum, surpreendente, exótico ou estranho, influenciar na vida de muita gente e por aí vai.
Seguindo este raciocínio, vamos a algumas questões: o que tem de incomum o fato de uma mulher ter estrias e celulite? É algo surpreendente? Influencia tanto assim na vida de muita gente? É exótico uma mulher ter uma barriguinha? Ou algumas gordurinhas? Jornalismo foi feito para passar informações relevantes, não para reforçar estereótipos e ideais preconceituosas.
Mulheres vivem, simplesmente. Trabalham e têm responsabilidades, tantas ou mais que os homens. Elas engravidam e mudam o corpo. Ah, elas também envelhecem, é verdade. Chega a ser cruel exigir que as mulheres lutem o tempo inteiro contra o envelhecimento e as marcas do cotidiano. Um discurso que acaba gerando uma sociedade de mulheres infelizes e frustradas por não conseguirem o impossível e extremamente caro. Os processos naturais da vida e do tempo não podem ser divulgados como vilões femininos. Ver o jornalismo fazendo isso é realmente repugnante. Incentivar um estilo saudável de alimentação e exercícios físicos é diferente de pregar a magreza custe o que custar. Saúde e padrão de beleza são duas coisas bem diferentes que o jornalismo precisa aprender a distinguir.
Agora voltando a falar sobre o verão, dias atrás vi uma ideia interessante no Facebook. Uma postagem curtinha que combate esse discurso de padrão de beleza. O texto dizia assim: “Como ter um corpo de praia. 1. Tenha um corpo. 2. Vá à praia. 3. Divirta-se.” Pronto. Não precisa dizer mais nada. Até porque, no meu verão, machismo não é a minha praia.
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Luciellen Souza Lima é jornalista e faz mestrado de Jornalismo