Ser um jornalista que trabalha em uma redação, seja ela de TV, impresso, web ou até mesmo, em alguns casos, rádio, significa procurar pela notícia de forma intensa, corrida e muitas vezes insana. Temos que ser eficientes para colocar, naquele determinado produto noticioso, os fatos julgados por nós como mais importantes para que a sociedade tome conhecimento.
Com o advento e a ascensão dos meios interacionais, essa batalha pela notícia ficou ainda mais complexa, já que as pessoas que têm acesso a esses meios podem, por si só, fazer com que diversos acontecimentos circulem sem a mínima intervenção dos profissionais de imprensa.
Recentemente, li dois livros que tratam de formas de jornalismo que se constroem na lógica inversa a essa descrita acima. Uma das obras é o livro O jornalista e o assassino, de Janet Malcom, publicado originalmente em 1990. Basicamente, a publicação tem como enredo a história real de um processo movido por um homem que foi condenado por assassinar a própria família (mulher e filhas) contra um jornalista que escreveu um livro sobre ele. É o chamado “novo jornalismo”, que ganhou notoriedade com Truman Capote e seu livro A sangue frio. Na verdade, o livro de Malcom é novo jornalismo, falando de novo jornalismo. O gênero privilegia uma prática jornalística que age sem a pressão do tempo. Há de se aprofundar o assunto, esmiuçar, descrever, utilizar técnicas literárias para produzir o texto. Tudo que nos é proibido na prática do jornalismo diário.
A abertura de horizontes
O outro livro é a autobiografia do renomado fotógrafo Sebastião Salgado, intitulado Sebastião Salgado: da minha terra à Terra, lançado em 2014. Na obra, Salgado explica como prefere fazer um trabalho lento, calmo, que conte as histórias das coisas de forma profunda através das imagens. Fala da paciência em parar, enquadrar, entender o fotografado, seja ele humano ou não. Realmente encantador.
Já tendo trabalhado para diversas revistas e agências de notícias, o fotógrafo rodou o mundo e atuou em coberturas factuais, mas deixa clara a sua preferência pela imagem pensada ao máximo, capaz de desvendar contextos. Para ele, somente um período longo envolvido com determinado assunto possibilitaria esse aprofundamento.
Esses livros, que a princípio não têm relação entre si, me fazem refletir sobre como existem alternativas para o cotidiano jornalístico ordinário, sobre como as mudanças podem ser saudáveis para o profissional e sobre como a abertura de horizontes é essencial para que as histórias sejam contadas de maneiras diferentes, possibilitando, assim, um entendimento melhor do mundo que nos rodeia.
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Raul Ramalho é jornalista