Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O humor como consciência

Como ainda reverbera o atentado ao semanário Charlie Hebdo, em 7 de janeiro, por causa de charges que a revista publicou sobre Maomé, e como se comemorou na sexta-feira (30/1) o Dia do Quadrinho Brasileiro, J&Cia decidiu mergulhar um pouco no universo do desenho gráfico e para isso conversou por cerca de duas horas com um especialista no tema: José Alberto Lovetro, o JAL, jornalista e cartunista, que há 25 anos preside – “voluntariamente”, como ele faz questão de ressaltar – a Associação dos Cartunistas do Brasil.

JAL, que defende a formação em jornalismo para cartunistas e chargistas, em função de que estes também interpretam fatos do cotidiano e devem ter capacidade de contextualizar o seu trabalho, fala sobre aspectos pouco conhecidos da atividade, legislação, mercado e dos planos para entidade, entre os quais um prêmio que começa a planejar em parceria com este J&Cia. Mas, acima de tudo, busca situar o papel do desenhista gráfico na sociedade e no mundo. Para ele, só pelo humor consciente a vida humana na Terra terá futuro.

Ele iniciou a carreira na Folha de S.Paulo em 1973, publicando o personagem Zélio, o Repórter no suplemento Quadrinhos (uma coincidência com o nome do irmão do Ziraldo, pois não teve deste qualquer influência). Depois trabalhou em diversos veículos, como TV Tupi, O Estado de S. Paulo, DCI-City News, jornal The Brazilians (NY), tevês Cultura, Manchete, Bandeirantes, Senac/Sesc e Gazeta, Pasquim, Pasquim 21, revistas Bundas e Semanário, rádios Tupi e USP, entre outros. Publicou em diversas revistas e jornais pelo Brasil e exterior. Sua série “Pequenos Pecados” foi publicada na revista Sem Fronteiras (Holanda/Bélgica). Ganhou diversos prêmios, inclusive do jornal japonês Asahi Shimbun como um dos melhores cartunistas do ano (1981) e o Troféu Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos por seu trabalho na Campanha Diretas Já (1984). Atualmente, tem uma empresa de comunicação que presta serviços inclusive para a Mauricio de Sousa Produções.

Nesta edição especial, mais do que jogar luzes sobre o trabalho de quadrinistas, chargistas, cartunistas e ilustradores gráficos, JAL faz uma profissão de fé na atividade e na vida.

“Tudo começa no desenho”

Você nos falou que está trabalhando no projeto de um museu junto com o Gualberto Costa. Qual é a sua ideia?

José Alberto Lovetro – Tenho muita coisa, um quartinho aqui cheio de coisas, por isso quero fazer logo um museu, doar tudo isso aí. Meus filhos não vão saber o que fazer. Você tem que se preparar, porque se não acontece como lá no Rio de Janeiro, ainda quando o Ziraldo era presidente da Funarte, na época do Collor. Ele tentou fazer um museu com o material do Álvarus, que tinha acabado de morrer. Álvarus era um pesquisador de quadrinhos, charges. Todo mundo deixava material com ele. Jaguar dizia que mandava todos os livros para ele. Tinha uma biblioteca sensacional da área de humor gráfico, originais que vários desenhistas deixavam com ele. Inclusive desenhistas do Tico Tico, deixando caixinhas com desenhos eróticos que eles não podiam divulgar, porque só desenhavam para crianças. Bom, ele morreu, a família fez um pacote e vendeu a preço de banana, ninguém sabe para onde foi. Eu conheço alguns colecionadores de Belém do Pará que compraram alguma coisa, mas nosso material está se perdendo. Na verdade, nessa área de museus, vocês viram o que aconteceu no Rio, lá no Museu Nacional…

Está sem dinheiro…

JAL – Eles fazem qualquer museuzinho sem vergonha, qualquer tipo de coisa, pra preservar. Na minha garagem, está cheio de material do Miécio Café, a família não sabe onde colocar. Mas precisaria estar num lugar com ar condicionado. O papel não dura, se quiser que dure mais do que 50, 100 anos, você tem que cuidar. O Gualberto está batalhando nesse negócio de museu e eu sempre faço parceria com ele. Há uns 30 anos estamos batalhando. Agora, através do vereador Eliseu Gabriel, através da Prefeitura, parece que a coisa vai sair, mas tem que fazer uma pressãozinha, se não, não sai. Nós tínhamos acertado com o ex-secretário Municipal de Cultura Juca Ferreira e parece que vai sair.

O que se comemora nesse dia 30 de janeiro?

JAL – É o Dia do Quadrinho Brasileiro. Vou contar a história. Em 1982, havia um projeto de lei do Jorge Paulo, que era um deputado federal por São Paulo e tinha um programa de rádio, Chapéu de Couro. Nesse projeto, que fez por iniciativa própria, tinha cota para publicação, exigia que jornais, revistas e editoras publicassem obrigatoriamente 50% de quadrinhos brasileiros. O pessoal nas comissões da Câmara não sabia quem chamar, não havia um representante de associação de desenhistas. Então, o que eles faziam? Chamavam o Henfil, o Ziraldo… Na época, as editoras faziam produção de quadrinhos estrangeiros no Brasil. O Disney era desenhado, aqui, o Fantasma também. E elas conseguiram colocar um item de que quadrinho brasileiro era também o desenhado aqui, mesmo sendo personagem estrangeiro, o que tira o efeito da lei, não adianta nada. Aí pensamos: vamos ter que nos organizar em uma associação. Então, fizemos com o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo a Associação dos Quadrinistas e Caricaturistas de São Paulo, que existe até hoje, e criamos o Prêmio Angelo Agostini. O dia 30 de janeiro é a data em que foi publicada a primeira história em quadrinhos que consideramos realmente em termos universais, a primeira graphic novel. Os quadrinhos existem desde os tempos das cavernas. Já na era Gutemberg, Angelo Agostini foi quem publicou na revista Vida Fluminense, em 1869, capítulos de uma história que era As aventuras de Nhô Quim, um personagem meio atrapalhado, que veio de Minas Gerais até a Corte, no Rio de Janeiro. Era sensacional, ele fazia sequências que pareciam animação. Angelo Agostin começou aqui noCabrião, em São Paulo. Era piemontês, um anarquista Italiano que imigrou para o Brasil, se naturalizou, e já fazia em 1864 o que se consideram quadrinhos. Nós consideramos As aventuras de Nhô Quim a primeira linguagem realmente forte, porque tinha um personagem numa revista, Vida Fluminense, que era semanal. Foi a primeira graphic novel, uma novelinha, que saía em capítulos a cada semana. Não há parâmetros para isso em termos mundiais.

Mas a primeira HQ não foi a do Yellow Kid?

JAL – É claro que os americanos sempre divulgaram que o quadrinho começou lá, com o Yellow Kid, em 1897. A nossa foi em 1869. Mas antes já havia, na Suíça, alguma coisa parecida com quadrinhos impressos. O falecido professor Luiz Cagnin, da USP, que morreu no ano passado, fez pesquisas nos jornais da família Hearst, lá nos Estados Unidos, e concluiu que o Yellow Kid era charge, não quadrinhos. Em 1897 eles faziam charges de um moleque careca com avental – era o pobre lá do Bronx –, que falavam dessas pessoas mais segregadas, mais necessitadas. A novidade introduzida foi que os textos, que eram sempre embaixo dos quadros, no Yellow Kid começam a entrar no avental dele. Não era o balão ainda. Era na roupa dele, mas foi a primeira vez que o texto foi para dentro. Isso não quer dizer que a linguagem dos quadrinhos começou ali. Bom, mas voltando ao 30 de janeiro… Fizemos uma papelada de tudo o que precisava, com uma pesquisa na Biblioteca Nacional sobre o Nhô Quim, e mandamos para Brasília para entrar no calendário oficial e foi aceito. Então, o dia 30 de janeiro é considerado o Dia do Quadrinho Brasileiro. Até hoje existe o Premio Angelo Agostini, que é entregue a desenhistas brasileiros, com votação e tudo mais. Depois, fui insuflando os desenhistas de cada localidade para que constituíssem associações regionais, para fazer uma nacional, a fim de termos mais representatividade, discussões e tudo mais. Só que a profissão de desenhista é muito inconstante. Não adianta você cobrar mensalidade, essas coisas. Foi criada então a Associação dos Cartunistas do Brasil (ACB), que está funcionando desde aquela época e que é uma associação de voluntários. Prestamos serviços, como um livro gratuito, por exemplo, que pode ser baixado por qualquer desenhista que está começando. Nele há vários depoimentos de desenhistas com um beabá de como entrar no mercado de trabalho. Qualquer desenhista pode baixar de graça. E, por incrível que pareça, é acessado em mais de 50 países, mesmo estando em português. Quem cuida disso é o Ricardo Antunes, que mora em Portugal e que começou a coordenar esse livro. Pretendemos até imprimi-lo, porque esse que está na internet não tem ilustrações e é bem simples: perguntas e respostas para pessoas que estão entrando no mercado terem um pouco da consciência do que é trabalhar nessa área de ilustração, de quadrinhos. Na época em que fizemos a associação o Henfil morava em São Paulo. A morte dele foi uma grande perda para nós, pois partiu muito cedo. Como ele criticava todo mundo, hoje certamente seria a consciência do PT, para poder questionar as coisas que estão acontecendo. Ele era muito bom nisso. Foi um dos fundadores do partido.

Qual foi o papel dele na associação?

JAL – Não tínhamos muita força como associação, estávamos começando. Aí pintou a Campanha das Diretas. Henfil era um dos caras importantes da campanha. Ele, Fortuna, Paulo Caruso, Laerte e um pessoal novo que estava chegando também integravam a associação. Henfil, aliás, criou o Sr. Diretas, que era o senador alagoano Teotônio Vilela. Ele acompanhava o Teotônio, que estava terminal na luta contra o câncer, naquelas visitas pelo Brasil para o projeto nacionalista do senador. Uma vez, eu trabalhava fazendo charge ao vivo no programa do Ferreira Neto e aparece Henfil com Teotônio, e este falou: “Este é o meu embaixador, que vai comigo a todos os lugares”. Quando morreu, Teotônio estava com aquele negócio do Projeto Brasil, aquela coisa bem nacionalista, que começou a tomar conta da cabeça de todos os brasileiros, que se transformou na Campanha das Diretas, em minha opinião o maior movimento popular no Brasil em todos os tempos. Eram dois milhões de pessoas, não tinha bagunça, todo mundo com a mesma função, a mesma cabeça, querendo melhorar as coisas da forma mais correta. Civilidade total. Bom, aí perguntamos pro Henfil: o que vamos fazer? E ele respondeu: “Vocês viram que nessas primeiras manifestações, quando entram aqueles bonecos grandes, de Figueiredo, Delfim, Maluf, vestidos de presidiários, são logo destruídos, primeiro porque o pessoal os vê como Judas e segundo porque esses bonecos atrapalham a visão das pessoas que querem ver a Fafá de Belém cantando. Vamos fazer um do Teotônio, pois a morte dele repercutiu muito”. Era para a gente entrar mais na manifestação do Anhangabaú, que foi a maior de todas, em abril de 1984. Se não me engano, quem criou a expressão Diretas já foi o próprio Henfil. Mas o Sr. Diretas foi ele. Topamos e fomos lá na suprapartidária fazer reunião. Eles gostaram tanto da ideia que sugeriram sairmos em passeata do Largo de São Francisco até o Anhangabaú: “Vocês vão puxar a passeata com esse boneco”. Ótimo, mas só tínhamos um fim de semana para construir o boneco. Naquela época, não havia nada aberto, shopping, supermercado, só farmácia. Eu tinha contato com o pessoal da escola de Samba Pérola Negra e eles emprestaram o local. Precisávamos fazer um boneco de quatro metros ou mais para puxar a passeata. Reunimos uns dez, doze desenhistas, comprei do meu bolso um cano de ferro para fazer a base do boneco, fomos construindo com isopor. Compramos bandagens numa farmácia e fizemos a caricatura dele, levamos as mulheres para costurar a roupa. Ficou um boneco razoável, de quatro metros e meio, e conseguimos um caminhão para levar ao Largo de São Francisco. Eu sei que saímos na frente, e atrás vinham Ulisses [Guimarães], Tancredo [Neves], todo o pessoal abraçado. Parte da imprensa ainda não havia aderido, mas depois dessa passeata a coisa ficou forte.

Foi mesmo um movimento marcante…

JAL – E não ficamos só no boneco. Pedimos para os cartunistas fazerem cartuns no entorno do Teotônio. Acho que foi a primeira vez que os cartunistas saíram da prancheta para as ruas, para o contato direto com o povo. Foi sensacional! Quem tinha chapéu, tirava para reverenciar o Teotônio, respeitavam demais o boneco. Ele ficou perto do palco, foi um sucesso. Apareceu em tudo que foi jornal. O pessoal do Jornal da Tarde foi junto com a gente, cobriu só o boneco. Saíram matérias enormes, até no York Times. Ficou tão bom que os filhos de Teotônio nos pediram o boneco para a campanha das diretas em Brasília e depois ficar no Memorial do Teotônio, em Alagoas”. Era a primeira vez que ia ter um movimento popular de rua em Brasília, pelas diretas. Arrumaram passagem para mim e para o Mikio, secretário da associação. O problema é que só dava para desmontar a cabeça, não dava para desmontar o corpo. Foi necessário arrumar um avião maior, e depois um caminhão em Brasília para o transporte… Além disso, onde íamos deixar o boneco? O evento seria no dia seguinte. Alguém deu a ideia: bota lá no Congresso. Levamos para o Congresso, subimos a rampa carregando o boneco, chegamos ao Salão Negro. Os guardas pediram para retirar imediatamente. Como eu sabia que a Sala de Imprensa ficava ali ao lado, fomos correndo pra lá: “Estão querendo tirar o Teotônio do Salão Negro, o ultimo desejo dele era ter voltado para o Congresso”. Resultado: ficou lá. Aparecemos na Veja, posando no Salão Negro. Foi um negócio sensacional. Hoje o boneco está na parte de cima do memorial do Teotônio, em Alagoas. A filha dele é quem cuida disso.

Mas você falava da legislação…

JAL – Sim, conseguimos ir para Brasília e barrar aquela parte da lei que era contra. Depois essa lei foi meio esquecida, sabe como é o Congresso… Mas, no decorrer das discussões, começamos perceber que obrigar um jornal, revista ou editora a publicar, como proteção, uma porcentagem de material nacional contraria a lei da oferta e da procura, que se sobrepõe a ela. As editoras foram contra. É preciso haver acordo entre o editor e o desenhista, entre produtor e distribuidor, para que dê certo e se consiga ganhar público. Hoje há um projeto de lei de incentivo: o deputado Vicentino juntou várias possibilidades e tirou a obrigatoriedade; agora, quem publicar 20% de quadrinhos brasileiros desconta no Imposto de Renda. Então, interessa às editoras e aos desenhistas. Essa lei já está saindo das comissões e pode ser que entre em vigor já neste ano. Um ano difícil, mas acho que ela já está pronta, vai direto para o Senado e depois para a presidente sancionar. Será bom para todo mundo, porque também prevê uma linha de crédito do BNDES. E justo nesse momento, que tem sido o melhor de todos para os quadrinhos brasileiros. Nunca tivemos tanto público, principalmente formado pelo Maurício de Sousa, que pega desde a criança de cinco anos, que já se interessa por quadrinhos por causa dos personagens dele, até os adultos. Ele conseguiu manter um público de uns dez milhões só para as suas revistas; se contarmos os livros, são ainda mais. Ele formou o que todos queremos: o leitor de quadrinhos. Qualquer desenhista que queira entrar no mercado já tem leitor; que é como o leitor de livros, vai ler vários autores. Temos um dos maiores mercados de quadrinhos e de leitores de quadrinhos do mundo.

E Pato Donald, Mickey continuam?

JAL – Continuam, mas o Disney aqui no Brasil perdeu muito mercado. Vendia muito bem quando eu era garoto. Tenho a coleção do Tio Patinhas porque eu adorava as histórias do Carl Barks. Eu nem sabia que ele era o desenhista. Naquela época achava que era o Disney mesmo. O Tio Patinhas vendia 400 mil exemplares. Hoje o Maurício vende cerca de 500 mil com a Turma da Mônica Jovem, só um título. Ou seja, conseguiu manter leitores, apesar de todo mundo falar que criança vai para outras áreas. Isso cai por terra porque no Japão, que é o lugar que tem mais eletrônicos no mundo – mais do que nos Estados Unidos – é também onde mais se vende gibi e mais se vende jornal. O Asahi Shimbun, que me deu um prêmio nos anos 1980, tira dez milhões de exemplares por dia. O Yomiuri, que é o principal concorrente dele, vende outros dez milhões diariamente, num país que não tem produção de papel, em que papel custa caro e onde você pode ler na internet. Porque o japonês gosta tanto de ler gibi, ou mangá, como chamam por lá? A Shonen Jump, que é uma revista de quadrinhos japonesa e lança vários personagens, na crise, vende semanalmente quatro milhões; já vendeu oito milhões por semana. Aí você percebe que tem muita gente já enterrando o impresso, o jornal. Mas muitos outros acreditam, como o próprio Mauricio, que consegue fazer um mercado enquanto todo mundo fica falando sozinho e jogando fora uma possibilidade. A nossa área, inclusive de jornalismo e de ilustração e quadrinhos, está perdendo muito espaço, perdendo trabalho, perdendo tudo por causa de algumas cabeças pensantes que não analisam essas coisas. Para essas pessoas, parece que o mundo não é globalizado, que moram num quintal. Podem ter estudado em Oxford, mas quando chegam para resolver alguma coisa não pensam, nem analisam como são as pessoas. Nós, desenhistas, trabalhamos muito com os sentimentos. E para trabalhar com sentimentos, não funciona pensar só em números. Eu fiz Jornalismo na Cásper Líbero já pensando em ser chargista porque sabia que precisava ter essa formação para poder analisar a política e tudo mais, para não ser uma coisa de fazer brincadeirinha ou cair em jogadas. Nas universidades não há nenhum curso especial, a não ser na USP, que desde os anos 1970 tem um curso de editoração de quadrinhos. Não há nas universidades essa área para o jornalista saber a diferença entre cartum, quadrinhos e charges. O camarada sai de lá depois de quatro anos sem saber o que é isso.

Disso tudo, os quadrinhos são os mais fáceis de definir. Mas qual é a diferença entre charge e cartum?

JAL – É simples, Charge é esse negócio que acabou de acontecer com o Charlie Hebdo. A charge é um nome que veio da França, quer dizer carga, e é uma história que vem da Revolução Francesa. Chama-se charge porque é uma crítica a tudo o que acontece e é muito quente, é jornalística, trabalha com o que acabou de acontecer ou ser dito. Acabou de acontecer alguma coisa lá na França, já tem um chargista fazendo aquilo. Cartum já é uma coisa atemporal. Quando eu nasci já existia cartum de náufrago de ilha; depois que eu morrer ainda vão existir muitos cartuns de náufrago de ilha. Então, é uma coisa que trabalha mais com temas universais e que são perenes, são temas que vão longe.

O Quinotem alguns fortes.

JAL – O Quino é sensacional. E a arquitetura com que ele desenha? Todos os livros, tudo feito à mão, é sensacional. O Quino é um dos mestres mundiais de todos os tempos de desenho e de humor inclusive. O humor dele é sutil. Mas te dá aquilo que eu falo sempre: o humor é um beliscão no cérebro, que faz os neurônios se movimentarem um pouco. Você ri porque te pega de surpresa, solta uma risada que é uma resposta ao que não tem resposta. Você não vai falar: ah, entendi, o cara fez isso porque isso e aquilo. É a reação que bate, que ajuda a movimentar o cérebro. A linha do que estávamos falando é justamente essa, das diferenças. A ilustração acompanha e faz com que, num mundo visual como o de hoje, a pessoa tenha vontade de ler um texto às vezes até mais longo. Mas está havendo uma involução. Vejo os jornais virarem tijolões e as ilustrações perderem espaço. Num jornal impresso, um dos diferenciais é o filtro de um artista, de um fotógrafo ou de um colunista, que oferecem coisas muito específicas para levar algumas pessoas ainda a comprarem jornal. Se tirarem isso, parece que estão realmente enterrando o jornal, porque ele circula depois que as notícias já saíram na internet, rádio, televisão, em todas as redes sociais. Para haver um atrativo, precisa ser alguma coisa específica do veículo, e a ilustração, a charge são. Vocês lembram do Pasquim? O Pasquim não tinha anúncio, o público comprava porque era cartum. O visual é superimportante, mas está acabando o espaço para os desenhistas. Eu, como presidente de uma associação, tenho que ficar pensando nisso. Mas tem essa lei, que finalmente vai sair e que vai dar uma força. Há as graphic novels, que viraram o mercado. Quadrinhos adultos têm hoje um mercado legal. Só de eventos de quadrinhos no ano passado devem ter sido uns dez. A garotada, o jovem, está gostando disso, os adultos também. Hoje não é só infantil, como o Maurício de Sousa fazia. Ele mesmo está fazendo para o público jovem e adulto. Por isso cresceu mais ainda. E ele também foi responsável por dar uma força nesse mercado, porque as editoras ficaram acomodadas. Todas ficam preocupadas em como ganhar dinheiro com internet, Youtube, e vão enterrando o que existe ainda de vontade de leitores. Não abrem a cabeça para fazer o que precisa ser feito, analisar as coisas de forma geral. O Maurício começou a passar seus personagens para profissionais brasileiros que já estavam desenhando para o mercado estrangeiro. Temos os melhores desenhistas do mundo, muitos deles premiados. Maurício entregou os personagens para eles e disse: “Façam no seu estilo e na sua ideia de história”. Isso fez um sucesso tão grande que criou um mercado e as editoras estão se interessando pelos desenhistas que trabalham para o Maurício. Eles estão lançando seus próprios livros na esteira do sucesso de vendas da Turma da Mônica. Isso prova que o mercado existe, mas precisa sempre alguém para mostrar as alternativas. Eu, como presidente da associação, vejo que há essas alternativas. Temos que começar nas universidades, brigando para que haja cursos nas faculdades de Jornalismo e Comunicação. Assim vamos poder trabalhar uma coisa que é instintiva e vem desde o homem das cavernas: o desenho. Bem ou mal, todo mundo sabe desenhar. O desenho é uma força de comunicação que pode englobar toda a área jornalística, toda a área de criação. Histórias em quadrinhos têm um custo baixíssimo. Em São Paulo há uma iniciativa da Secretaria de Cultura do Estado que está dando muito certo: o Proac Quadrinhos. São 20 prêmios por ano, de R$ 40 mil, para o desenhista fazer o seu álbum. Ele desenha, faz mil exemplares e pode também negociar com editoras. São 20 produtos ao ano só pelo Proac de São Paulo. Isso não só está criando um mercado forte, mas abrindo a possibilidade do surgimento de novas ideias. Como sou jurado do Proac, vejo que há muita coisa ali que as editoras não publicariam, mas que são importantes para, por exemplo, discutir a linguagem. É um projeto que está ajudando quem talvez não conseguisse editora e a essas próprias empresas, que têm acesso a produtos praticamente prontos. Estamos vendo a volta dos bons tempos. Na década de 1980, por exemplo, o Chiclete com Banana, do Angeli, que era para adulto jovem, vendia 100 mil exemplares. Depois veio o Collor, quebrou o País e as editoras recuaram.

Tudo bem, o mercado de quadrinhos tem alguns caminhos, Mas para cartunista e chargista o negócio parece um pouco mais complicado, não?

JAL – Como os editores estão deixando de chamar chargistas, deixando de publicar charges e cartuns, é preciso pensar em alternativas. Temos desenvolvido algumas ideias, que têm tudo para funcionar – e podem ser um dos caminhos. Na internet, depois de sexo, acho que o humor deve ser o mais procurado. São vários sites de humor. Vejam o exemplo do Porta dos fundos.

Charges.com.br…

JAL – O humor encontra seu caminho e público em vários sites, blogs e tudo mais. Uma das saídas para nós, cartunistas, é procurar nosso público aproveitando justamente o que existe via internet. Ela não está sendo totalmente usada, geralmente vamos meio a reboque, não criamos algo novo. Outra coisa: uma das saídas que tínhamos eram os salões de humor, que andam meio desgastados e com alguns problemas. Antigamente, eram a porta de entrada para mercado. Não só pelos prêmios, mas por colocar o desenhista em evidência; hoje os salões de humor perderam muito de sua força. Não os de quadrinhos, que cresceram muito, não vamos misturar; salões de humor mesmo.

Até o de Piracicaba já não tem mais aquela mesma tradição…

JAL – É importante que o de Piracicaba continue, pois foi ele, junto com o Pasquim, uma das válvulas de escape do humor e enfrentamento da ditadura. Mas a ideia de salão está desgastada. Eu organizei vários salões, já fui presidente do Salão de Piracicaba, trabalhei nele durante muitos anos e vejo que há um desgaste inclusive por causa da política. Vários são ligados a prefeituras ou a governos, e isso tem provocado conflitos que acabaram com alguns deles. Lá no Rio de Janeiro, o Salão Laura Alvim, que existia há muitos anos, desapareceu por falta de interesse da prefeitura. Lá em Pernambuco alguns salões foram feitos, mas também houve um problema político e eles estão tentando retomar agora de outra forma, não se atrelando aos políticos – secretários, prefeitos e outros. São poucos os que valorizam realmente o cartum. Muitos usam o cartume a charge em proveito próprio, mas não os valorizam. Lá no Piauí, um salão sensacional, que era inclusive aberto para a rua e pegava todo mundo mesmo, também teve problemas. Assim como os de Campos, no Rio de Janeiro, e Foz de Iguaçu. É preciso reformular.

Mas como fazer isso?

JAL – Eu sou cartunista, desenhista, e imagino as coisas como gostaria que fossem para mim se me convidassem para um salão. Então, o que fiz? Gosto muito do facebook, porque consigo usá-lo meio que profissionalmente. Quando a Amy Winehouse morreu, em 2011, vi que vários desenhistas começaram a postar caricaturas dela, porque gostavam da música. Geralmente, quando a gente está desenhando, põe uma música, um jazz pra tocar. E ela funcionava bem com aqueles blues. Além do que era uma personagem de quadrinhos. Os desenhistas gostavam e começaram a homenagear. Aí eu postei no Facebook: “Vamos fazer um exposição? Tem material muito bom aqui”. Onde? Não sei, vamos fazer na rua, onde der pra fazer. Oferecemos para alguns lugares e o Shopping SP Market se interessou e fez a exposição. Foi um sucesso tão grande que deu repercussão internacional, saiu matéria nos Estados Unidos, na Europa, a exposição foi para um shopping na Europa. Foi aí que me dei conta de que era um caminho direto do cartunista com o seu público. Shopping é aonde se vai, principalmente nas grandes cidades, com a família. E humor é uma coisapalatável. O diferencial de um shopping hoje em dia, em que a concorrência entre eles é muito grande, é a programação cultural. Se você tem um bom cinema, uma exposição legal, a pessoa, em vez de ir a um shopping, vai ao outro. Por isso, os shoppings têm programação cultural fortíssima. Em função disso, comecei a criar as exposições. O Ricky Goodwin, que trabalhava no Pasquim com o Ziraldo e sempre atuou com distribuição de revistas em quadrinhos, falou: “Existe o flash mob e você está fazendo a flash expo. Peguei esse mote e criei a Flash Expo, aquela exposição que é feita de momento. Para vocês terem uma ideia já fiz mais de 20 exposições em vários shoppings e fora deles, no Memorial, a dos 84 anos de Silvio Santos, que está itinerando no metrô. E isso com o nosso sentido de chargista, jornalístico, sem passar por nenhuma editora. É claro que tem uma curadoria minha. Afinal, converso com desenhistas há mais de 40 anos, sei o que cada um pode fazer, o jeito de conversar, consigo fazer uma coisa que fica legal, eles aceitam numa boa.

Mas qual é a contrapartida para eles?

JAL – Por exemplo: para a exposição da Winehouse lá no shopping eu consegui um prêmio para fazer uma espécie de salãozinho. Porque aí você dá um estímulo para o desenhista criar uma coisa nova e não só mostrar o que tem na gaveta. Eu disse para mim mesmo: os desenhistas de salão de humor reclamam demais de júri, acham que júri defende só a panelinha. Você dá prêmio para um ou dois e os outros 500 ficam chateados. Então, fiz uma coisa que não existe em nenhum salão do mundo: fiz a votação entre os próprios participantes. Cada desenhista que estava dando o seu cartum tinha direito de votar em outro desenhista – não nele próprio, evidentemente. Aí ficou um júri inquestionável, os votos são abertos para todos, todo mundo vê. Ninguém vai votar no amiguinho, fazer a tal da panelinha, pois vai ficar evidente pra todo mundo. Isso gera o espírito crítico no próprio desenhista. Ele vai para o outro lado do balcão, analisa tudo aquilo e diz: “Mas esse trabalho está muito bom”. Fica com esse espírito crítico, o que o ajuda a evoluir muito no desenho. Num shopping atingimos um público que é maior do que o do livro, são pelo menos 12 a 13 mil pessoas. E há exposições que você monta várias vezes, que vão até para o exterior. Com isso conseguimos ganhar público, uma vitrine para o nosso trabalho. Humor é uma coisa que pode virar camiseta, pode virar uma série de coisas e gerar um ponto de venda para o nosso trabalho.

É muito versátil, não?

JAL – E rápido. No terceiro Risadaria, aquele evento de humor que acontece todo ano, me chamaram para organizar uma exposição de três dias sobre as Olimpíadas. No primeiro dia morre Chico Anysio. E eles perguntaram: o que a gente pode fazer? Sugeri fazer uma exposição. “Mas não vai dar, não tem espaço para montar. Até imprimir, arrumar expositor…” Eu falei: “Não, vamos pegar uma tevê, tela de 50 polegadas e fazeros cartuns passaremem looping”. Ao lado eles colocaram um painel para todo mundo deixar um recado. Resultado: a exposição foi montada antes do Chico ser enterrado. Essa é a velocidade que nós temos, cria um impacto direto, o que é uma coisa muito difícil de atingir. Numa exposição dessas vai ter desde o garotinho, que gosta de ver um desenho, até o vovô que vai querer conversar sobre aquele assunto. Temos um potencial enorme, mas nós mesmos precisamos descobrir. Em vez de ficar lançando ideias, arregaço as mangas e vou fazendo. Isso vem crescendo tanto…

Tem aqui um livro só com caricaturas do papa Francisco. Como surgiu a ideia?

JAL – O papa veio ao Brasil e eu vi que os cartunistas gostaram muito do bom humor dele. Nenhum papa até então aceitou que fizessem caricaturas dele, que gostasse disso, visse em público e falasse bem. Mas eu pensei nessa exposição, O papa sorriu. Fui conversar lá na Cúria, dizer que era muito importante, pois com o bom humor dele estava conquistando até quem não é católico, porque é um líder espiritual e nós, cartunistas brasileiros, queríamos fazer uma homenagem. O pessoal da Cúria gostou, realmente é uma linguagem bem atual. Só que eu disse: “Quero que o papa veja antes”. Encadernei em tamanho A3 e o Rafael Alberto, que é o assessor de imprensa, mandou para Itália pro Dom Odilo Scherer, o primaz daqui de São Paulo, mostrar ao papa. Dom Odilo estava lá para rezar uma missa com ele. O papa faz uma missa a cada dia lá na casa Santa Marta, que é onde ele mora realmente. No final da missa fica aquela fila para cumprimentar o papa e Dom Odilo entrou na fila levando o livro. Demos sorte porque, quando pintou o livro, o jornal do Vaticano, o Osservatore Romano, fotografou tudo em sequência. Dom Odilo chegou lá e falou para o papa: “Tenho aqui uma homenagem dos cartunistas brasileiros”. Ele respondeu: “Humor é muito bom, eu gosto de humor”. Mas Dom Odilo esclareceu: “São caricaturas suas”. Aí o papa ficou surpreso e curioso. E aí está a foto dele vendo o livro e rindo de tal forma que até envergou para trás.

Se deliciando com as caricaturas…

JAL – E o que aconteceu? Fizemos a exposição no Museu de Arte Sacra. A primeira vez que uma exposição de caricatura entrou no Museu de Arte Sacra, que é lindo. E foi a própria Cúria que quis fazer, e está itinerando. Ela deve ir para fora, vai ser montada na Argentina, e virar um livro. Um monte de visitantes foi lá para conhecer levando crianças; quer dizer, ganhou um publico diferenciado. Dá pra perceber que o cartum e a charge são uma força que oferece mil possibilidades. Essas são algumas que estão funcionando. Outra que fizemos foi em função de eu ser palmeirense. O Palmeiras não estava num bom momento, mas tem muito cartunista palmeirense e a gente vinha conversando que o time precisava melhorar. Daí surgiu a ideia: vamos fazer um blog com nossas charges só para desabafar. Criamos então o futeblog A Academia, com 11 desenhistas palmeirenses que estão aí na imprensa, na grande mídia inclusive. Esse time começou a publicar charges criticando, mas ao mesmo tempo enaltecendo os grandes feitos do Palmeiras. A torcida começou a acompanhar o blog, a diretoria viu, gostou demais e nos convidou para fazer uma exposição na sede do Palmeiras. Como estavam começando a construir o estádio, fizemos no restaurante, reunindo na abertura os desenhistas com camisas do Palmeiras. Foi uma exposição muito legal, que pretendemos transformar em livro para marcar o centenário do clube. Estou conversando com o Marketing do Palmeiras e com algumas editoras. Esse é outro tipo de alternativa de trabalho, porque dá para criar de todos os times. O que estou tentando ver agora, com Corinthians, São Paulo e outros times, é postar charges no minuto a minuto do jogo. Fiz uma experiência de cobertura com charge ao vivo, comecei com os jogos da seleção brasileira na ultima copa. Funciona perfeitamente. Qual é o diferencial?

Nas redes sociais?

JAL – Num blog, por enquanto ainda sem patrocínio. O diferencial é justamente que a gente faz a charge na velocidade da fotografia. No minuto a minuto não tem a descrição do que aconteceu? Nós incluímos o visual, aparece no mesmo momento. Dá pra fazer uma charge por minuto. Claro que será preciso ter mais chargistas, mas funciona como fosse um stand up. Podemos preparar muito material antes e na hora montar, juntar as coisas e fazer a cobertura ao vivo. Em função disso sugeri ao UOL a cobertura do Oscar ao vivo, o que é mais difícil. Porque no futebol você sabe que tem falta, expulsão, cartão amarelo, tem os ícones que você vai trabalhando e que pode preparar antes para entrar no meio do jogo. O Oscar é imprevisível. Você não sabe a roupa que os que estão concorrendo vão vestir etc., é muito mais difícil. Mas fizemos a cobertura do último Oscar e funcionou. Como foi no meio do carnaval, estavam com pouca equipe para trabalhar o minuto a minuto do Oscar, mas já fechamos para fazer a cobertura ao vivo do prêmio deste ano pelo UOL. Ou seja, o chargista pode fazer coberturas na internet, na televisão, tudo ao vivo, se ele quiser.

É outra alternativa de trabalho.

JAL – Para ter outras fontes de trabalho. Já que os editores não pensam nisso, nós temos que pensar. Estou fazendo essas experiências e elas estão funcionando. Acredito que daqui a algum tempo estaremos fazendo cobertura de um jogo Palmeiras vs. Corinthians. Num blog, entra uma equipe de cartunistas do Palmeiras e uma do Corinthians e fazem a cobertura dos dois times. Não é quem vai ganhar no cartum, é quem vai ganhar em campo. Mas os cartunistas estarão lá para fazer as charges. E com um diferencial, uma coisa importantíssima: com humor. Com esse episódio do Charlie Hebdo ficou bem evidente uma coisa: o humor atinge lá no fundo. Mas há algumas pessoas loucas e irracionais, que não têm humor. Quando você tem bom humor, como é o caso do papa, ganha muito. Quando não tem, fica uma pessoa enfezada – isto é, cheia de fezes. Uma pessoa que quer matar, que quer acabar com as coisas, que não tem diálogo, que se fechou dentro de si. E para mostrar que ainda existe nesse mundo, ela tem que matar alguém. O humor é justamente o contrário. Ele arrefece a violência. Enquanto esses fundamentalistas levam até às últimas consequências, os que trabalham com humor têm uma vida muito melhor. Por quê? Quando você está discutindo com uma pessoa e ela xinga a sua mãe, você não precisa dar um murro, como o papa falou, mas você radicaliza. Qualquer coisa que essa pessoa fale, não importa se tem ou não razão, para mim fechou, não tem mais razão. Você radicaliza de tal forma que fecha o diálogo. Mas quando você está brigando com alguém e essa pessoa fala “você é meu amigo da onça, me sacaneou nesse negócio”, você dá uma risadinha e fica com aquilo na cabeça. Vai deitar no travesseiro e pensa: não quero ser chamado de amigo da onça. Mas não radicaliza porque o humor refreia a radicalização. O antídoto para toda essa violência do mundo é haver pessoas mais bem-humoradas. Mas para isso é preciso fazer escola. E para fazer escola precisa ter leitor e pessoas interessadas, não pode ser uma coisa imposta. Às vezes o humor muito forte vem meio imposto. E as pessoas começam a radicalizar. Vemos que muitos stand upsestãofazendo piadas cada vez mais fortes, e o mundo tentando ser politicamente correto. Mas você viver totalmente politicamente correto acaba com o humor, não tem margem para discutir as coisas.

Mas qual seria limite para isso?

JAL – O limite é o bom senso. Por exemplo: eu, como cartunista, não utilizaria o Maomé. Por uma simples razão: não é produtivo. Se você quer acabar com o fundamentalista, aquele que quer radicalizar, homem-bomba, usando Maomé você tem o Islã todo contra. Até as pessoas que são contra a violência. Você está ofendendo gente que é do nosso lado, que também quer derrubar esses caras, pois eles também não são bons para o Islã. Matar alguém por uma opinião é totalmente sem sentido. Aqui, nos anos 1970, o Henfil fazia sátiracom osFradinhos.Naquela época, o País era mais politicamente correto com coisas de sexo do que hoje. Mas o Henfil estourou no Pasquim. Eu era office-boy e uma ameba em termos políticos. O Pasquim me trouxe uma visão política pelo humor e pela escatologia dos Fradinhos. Enão aconteceu nada com o Henfil. Não houve católicos indo atrás dele, não teve a Igreja condenando. Ele era um cara inteligente e usava o bom senso. Sabia até onde podia ir e sabia que a Igreja tinha noção de que ele estava lutando contra a ditadura também, contra a censura e tudo mais. Por isso, acho que o chargista tem que ser jornalista, um cara com visão, bom estudo. Precisa ter uma visão mais global para saber onde vai atingir, aonde vai chegar. Se ele simplesmente fizer uma piadinha inconsequente de alguma coisa, perde essa noção do que tem que fazer. Essa tem sido a nossa a defesa. O que esses fundamentalistas estão conseguindo fazer é incutir medo nas pessoas. Os caras que estão matando alguém porque desenhou Maomé são os mesmos que decepam cabeças e divulgam na internet. Maomé não ia gostar disso, com certeza não é o que reza o Alcorão.

Você acha que esse episódio do Charlie Hebdo vai mudar alguma coisa?

JAL – Já mudou. Quando essa história de charge de Maomé surgiu pela primeira vez foi na Dinamarca, em 2005. Até hoje os autores daquelas charges estão jurados de morte. Ninguém morreu na Dinamarca por causa daquelas charges, mas houve mortes em manifestações no Irã. Naquela época, ninguém na imprensa pegou depoimento do Ziraldo ou do Jaguarpara explicar para a pessoa que estava vendo a televisão ou na internet por que aquilo aconteceu e por que a linguagem da charge fortalece uma ideia. Por que está acontecendo isso, explica? Ao contrário, as manchetes dos principais telejornais um dia falavam das caricaturas de Maomé, no dia seguinte eram os quadrinhos de Maomé, no outro as ilustrações de Maomé. Eles não sabiam a diferença entre charge, cartum, ilustrações. Não foram pesquisar. Agora evoluímos. Chamaram os cartunistas, foi uma invasão de cartunistas na televisão. Houve uma informação mais correta para o público. Se não, chega meia verdade, uma informação que não permite às pessoas saberem o que é aquilo. Aí uma criança começa a fazer caricatura e o pai dá tapa na mão: “Não pode! Mataram gente por causa disso. Você não vai desenhar!”. É preciso informar direito as pessoas, se não vai ser um negócio horrível.

Vamos sair um pouco da análise da conceitual para falar de seus planos na associação, além do museu, sobre o qual já falou um pouco, o prêmio que pretende fazer…

JAL – Do museu é importante dizer que quem está fazendo esse trabalho há muitos anos é o Gualberto Costa. A associação apoia, queremos que saia do papel.

Já existe um decreto, alguma coisa nesse sentido?

JAL – Está para sair o decreto, já foi aprovado na Câmara paulistana por duas legislaturas diferentes, com vereadores diferentes inclusive, aprovado por unanimidade. Mas houve um problema na prefeitura, corte de gastos, essa coisa toda. Estamos tentando encontrar uma forma de viabilizar. O Gualberto conseguiu juntar dez mil originais, gratuitamente cedidos pelos desenhistas, ou seja, tem um acervo gratuito pronto. Famílias de desenhistas querem doar material para ficar nesse museu, para poder ser cuidado. Coisas que não se pode jogar fora, ao contrário. Nós não temos nenhum museu no País.

Museu de…?

JAL – Museu de artes gráficas, mas a base são charges, cartuns, quadrinhos, ilustrações… Pode até chegar no grafite, em outras coisas, mas o básico é aquilo. Porque, não tendo um museu no País, estamos perdendo tudo. A Argentina tem três, Uruguai, qualquer lugar, Estados Unidos tem dez… Um país desse tamanho não tem um museu nessa área, então é importante. Nós criamos o Troféu HQMix, que é de quadrinhos, já está na 27ª edição. E ele é reconhecido internacionalmente como o maior troféu da América Latina. Conseguimos construir um negócio que é também uma vitrine para o trabalho dos desenhistas brasileiros, com apoio do Serginho Groisman e do Sesc, sem eles não conseguiria fazer. Como o HQMix é voltado aos quadrinhos, poderia haver um prêmio específico para ilustrador, chargista, cartunista e caricaturista. Porque o material que sai do Brasil é muito rico e precisa ter um prêmio para mostrar a importância disso, inclusive um anuário com as melhores charges publicadas para se ter um histórico. Nós fomos conversar justamente com o Jornalistas&Cia porque é importante que os jornalistas entrem na organização e nas votações, pois trabalhamos com uma coisa que é muito ligada ao jornalismo, pra fazer esse approach com o dia a dia, aquelas charges, ilustrações, cartuns e caricaturas que aparecem no jornal. Quero que os jornalistas vejam isso como uma coisa muito ligada ao produto que está sendo feito pelo jornal. Temos que nos unir para fazer uma premiação que tenha esse intuito jornalístico. Com o apoio dos cartunistas, ela pode fortalecer essa área para todos nós e mostrar à mídia e aos leitores que temos gente muito boa e categorizada. Estamos no início das conversas, mas acredito que ainda este ano possamos conseguir anunciar esse prêmio e fazer com que seja um dos mais importantes para a área de comunicação.

São quantos profissionais mais ou menos atuando nessa área, associados ou não?

JAL – Na verdade, a associação tem inscritos por causa da votação do HQMix. O número não é muito grande porque são só desenhistas e jornalistas da área que votam. Mas a associação é aberta para quem está surgindo hoje como desenhista. Ela funciona mais na internet do que fisicamente. Calculo que sejam dois mil desenhistas atuantes, podendo chegar a três mil com os que não são totalmente profissionais, mas que já publiquem alguma coisa. Você tem o profissional que publica sempre e já tem todos os canais, mas há muitos que conseguem uma publicação aqui, depois trabalham em outra coisa, daí publicam em outro lugar. Mas desenhistas mesmo devemos ter um milhão ou mais, que já são bons inclusive para publicar. Leitores de quadrinhos – a gente pode contar também os de tiras de jornal – devem chegar a 15, 17 milhões.

Em relação ao mercado global, como está o brasileiro, em termos de retorno financeiro aos profissionais da área, oportunidades, espaço?

JAL – Nós estamos bem desenvolvidos nessa área. O problema é que há uma legislação em debate que vai atingir também o desenhista, um projeto de lei que pretende proibir o uso de qualquer personagem em produtos infantis. A lei começa por proibir publicidade infantil na tevê e em redes sociais, mas atinge também essa parte, não vai poder ter nem cores nas embalagens de produtos infantis. Se você quiser vender lápis de cor, a caixa terá que ser em preto e branco, sei lá! É uma lei muito radical. Ninguém quer ter criança consumista, mas a legislação em vigor já controla isso. Agora eles querem que a publicidade seja para os pais da criança. Mas há um erro grave nisso, quem pensa numa lei precisa pensar em tudo, e isso não vai dar certo. A criança vai deixar de ver televisão, vai deixar de ver rede social? O pai vai mandar a criança sair da sala na hora em que passar uma propaganda adulta sobre brinquedo? Ou a criança vai começar a consumir a propaganda adulta, que não tem o mesmo controle que a publicidade infantil? Hoje, na publicidade infantil, não pode ter nada. Você não pode dizer: olha, você não tem brinquedo, você tem que comprar. Isso já está na publicidade infantil. Na adulta há muito mais liberdade. Se você puser lá uma mulher de biquíni falando “compre para o seu filho”, como uma criança vai ver isso? Estou exagerando porque eles também exageram na justificativa. É só se basear no que existe nos países desenvolvidos, que já estão com isso bem resolvido, e discutir mais. Acho que os dois lados podem chegar a um acordo.

Novamente, usar o bom senso…

JAL – Vejam outra coisa em que não pensaram. Querem proibir o uso de merchandising com personagens infantis. Até hoje todo mundo cresceu com merchandising,desde o National Kid, e ninguém morreu por causa disso. Vamos supor que isso acabe. O Maurício de Sousa, por exemplo, precisa de 80% merchandising para manter 200 desenhistas, para manter toda a estrutura de produção – e ele nunca usou dinheiro público para produzir as coisas dele. Se tiver que só vender gibi, acabou o Mauricio de Sousa como empresa grande. E o que vai acontecer depois? Esse espaço será ocupado pelo contrabando, por um monte de produtos a preço barato, e personagens estrangeiros. Só que o Maurício paga impostos, dá emprego e os personagens dele são usados em campanhas nacionais e internacionais de conscientização contra o abuso infantil, sobre ecologia, a consciência do dinheiro. Os próprios personagens dele são provas disso e chegam a muita gente. Essa proibição acabará fortalecendo personagens estrangeiros, que continuarão existindo, e os nacionais vão ter problemas. Isso não é racional. Estamos num país capitalista. E enquanto o país for capitalista temos que pensar em termos de como roda o dinheiro e como faz as coisas acontecerem, precisamos de emprego, investir em educação. Tudo acontecerá se soubermos racionalizar essas coisas.

Mas para isso é preciso disposição para conversar.

JAL – É muito importante que tudo seja discutido. Esse negócio do Charlie Hebdo, a discussão está sendo muito boa para todos. Os desenhistas estão começando a pensar e discutir também até onde podem ir, qual o bom senso. Nesse mundo, o que eu posso fazer para melhorar em vez de sangrar? Toda discussão, quando você não radicaliza, quando usa o bom humor, o bom senso, consegue chegar a alguma coisa que valoriza o ser humano. Porque valoriza nosso cérebro, é para isso que temos cérebro. Nós estamos comandando essa birosca aqui. Se acabar este mundo, vai acabar para os seres humanos e os viventes. A Terra não vai implodir por nossa causa; não vai é ter uma alma viva para continuar o processo. Nós, da comunicação, temos uma responsabilidade muito grande de passar o máximo possível desse espírito crítico para a criança, essas coisas são importantes. Os quadrinhos estão criando leitores com cinco anos de idade; se o brasileiro começa a se interessar por quadrinhos nessa idade, já deixa de ser analfabeto. Foi o que aconteceu comigo, Ziraldo, Mauricio, com muita gente. Todo mundo começou a se interessar e depois foi para os livros. Mas os editores preferem fechar uma revista em vez de pensar. Lá no Japão, por exemplo, eles têm muitos leitores, livro é uma coisa cultural, crianças de cinco anos já se interessam por leitura, por mangá, os quadrinhos…

O pior é que lá é em japonês, não? (risos)

JAL – É muito mais difícil. São três mil ideogramas pra decifrar. Na Europa e nos Estados Unidos não é a mesma coisa, não tem gibi pra criança de cinco anos, só livros. No Brasil tem essa coisa que é igual ao Japão. Olhem só o que estamos perdendo! Nosso mercado de quadrinhos poderia ser três ou quatro vezes maior do que é hoje se tivéssemos editores com a cabeça mais voltada para isso. Ah, mas tem muito estudo, análise disso ou daquilo. Na verdade, é a mesma coisa numa eleição: quando você vai analisar uma pesquisa, no fundo, analisa o passado. E a eleição pode mudar de um dia para outro, já aconteceu. Você analisa as coisas que já conhece, as coisas que já acontecem e não coisas que vão acontecer. Mas você também será o agente para criar as coisas que vão acontecer. Aquilo que é passado serve para saber o que veio até aquele momento. É um dos dados para você fazer alguma coisa, o resto é intuição. E na nossa área intuição é essencial. Se você não tiver alguém que banque porque acredita mesmo, não há como novas ideias acontecerem. É um processo: para o homem aprender a voar, muitos morreram, mas continua aquela percepção de que você tem que criar alguma coisa para essa alternativa. A evolução começou com os desenhos das cavernas. Ali começou a primeira biblioteca, a acumulação de conhecimento. Uma descoberta maior do que dominar o fogo, porque passando para a frente eles ensinaram um monte de gente a dominar o fogo. O desenho é a base da inventividade. Toda invenção e toda criação começam no desenho, feito no computador, no papel, na pedra. O que temos nas mãos é ouro, precisamos saber usar. E para trabalhar agora sobre esse negócio contra os fundamentalistas, a irracionalidade, temos que começar com as crianças. É aí que podemos acabar com isso. A sociedade já está contaminada com corrupção, com uma série de coisas. Se você conseguir fazer na educação, do jeito que a criança entenda, eles vão ser os primeiros a tentar mudar esse mundo. Temos um problema na nossa área que é a notícia ruim vender mais jornal. Está chegando muita notícia ruim e esse mundo não é tão ruim quanto aparenta. Estamos descobrindo coisas sensacionais. Daqui a pouco resolvemos alguns problemas que hoje julgamos insolúveis. Já tem até equipamento de um brasileiro para tirar água do ar! Um aparelho de R$ 7 mil consegue tirar 30 litros por dia.

Que outros projetos a associação tem para este ano?

JAL – Há uma briga pelos direitos autorais lá em Brasília. Os desenhistas não estavam na discussão da nova lei de direito autoral, que tramita em Brasília já faz uns cinco ou seis anos. Por causa da internet, precisamos ter uma lei bem abrangente. Participamos da discussão e conseguimos juntar várias associações para incluirmos os artistas gráficos nessa lei de direitos autorais. Esperamos que logo esteja pronta para começarmos a nos organizar melhor nesse sentido. Também está se discutindo novamente se vale a pena ter o desenhista gráfico como profissão regulamentada. Porque há vários problemas para se regulamentar qualquer profissão. Este ano a discussão até se fortaleceu, vai sair uma resolução dos desenhistas quanto a isso para levarmos a Brasília. Salões e eventos de humor gráfico e quadrinhos estão crescendo muito, acho que estamos conseguindo ganhar mais espaço. Acredito piamente que este século XXI é o da revolução do desenho.

Já pensa na sua sucessão na ACB?

JAL – Ali o que temos é um trabalho voluntário, que exige ter que dedicar o seu tempo, pagar coisas porque não tem estrutura, e saber lidar politicamente, discutir com editores… Encontrar uma pessoa assim é difícil, por isso sou presidente da associação há 25 anos. Isso pode também virar uma piada, uma charge… Está difícil passar o bastão. Mas acho que agora, crescendo mais, tendo mais desenhistas, com maior conscientização, finalmente vou poder passar.

Vai poder descansar um pouco?

JAL – Sempre continuarei a batalhar pela área. Isso vem desde quando comecei, sempre fui assim.

É o que você gosta…

JAL – Muitos desenhistas pensam em si, no seu espaço. Eu sempre tive essa cabeça de que precisamos nos unir para todos nós conseguirmos mais. Isso está provado por esses anos aí. Tudo o que batalhamos juntos se fortalece mais. Acho muito importante que as editoras comecem a pensar um pouquinho mais nessa área, pois ela está crescendo. Essa nova lei dos quadrinhos, que vai ajudar a ter mais dinheiro de imposto das próprias editoras para elas poderem publicar, vale ouro. Nós temos público. Uma Bienal do Livro que leva oitocentas mil pessoas… O Ziraldo, com o Menino Maluquinho, quantos milhões de livros vendeu? Vira filme, peça de teatro, desenho animado, boneco. Temos que supervalorizar desenhistas como ele, que conseguiram fazer coisas aqui neste país, que é muito difícil. Uma das razões de eu estar trabalhando para o Maurício – não faço assessoria de imprensa para mais ninguém, só para ele – é porque as linhas filosóficas e de mercado que defendo passam pelo Maurício. Quando comecei a associação, não pensava dessa forma. Lá nos anos 1980, eu achava que o Maurício era um cara mais da área comercial, aquela coisa de você não ver os dois lados. Daí percebi que ele não investiu em iate, tudo volta para o próprio trabalho. Só ele sustenta 200 desenhistas, que podem fazer seus trabalhos também fora da Maurício de Sousa Produções, vários até saíram de lá. Ivan Reis, esse desenhista de São Bernardo que ganhou prêmio de melhor desenhista americano, trabalhou no estúdio do Maurício. Mudei a minha percepção das coisas. Hoje não é apenas um trabalho, é uma luta. Independentemente de eu estar lá ou não amanhã, essa luta vai continuar, assim como era antes. O Maurício sempre participou, desde a primeira associação, a AQC. Quando começamos, ele tinha feito uma no Rio Grande do Sul e até perdeu o emprego por causa disso. Disseram que ele era brizolista, de esquerda, e o demitiram. Maurício foi perseguido por criar uma associação de desenhistas. Lutou por uma lei de proteção do quadrinho brasileiro, que o Jânio sancionou, mas que nunca foi regulamentada. Então, ele também tem esse viés. Acho que associação é uma coisa que junta todo mundo, até quem está começando, aquele que a família acha que é um bom desenhista, que já se acha um desenhista. Ele precisar ter informações do mercado e saber como entrar nele, inclusive para não estragá-lo, não publicar de graça com a desculpa de que está ficando conhecido. Ele não sabe que quando aquele dono de jornal ou editor, quando tem algum dinheiro, vai chamar um desenhista de nome para pagar e quem faz de graça vai ter um carimbo na testa, ele está estragando a possibilidade de outro fazer. Se o contratante não tem dinheiro, pode propor dar um anúncio em troca do trabalho. Vale dinheiro e ajuda o desenhista. É simples, é saber negociar as coisas e você não ferra todo o pessoal que vive disso. Porque hoje em dia, na internet, você rouba um monte de ilustrações. Estou cansado de ver ilustradores que ficam velhinhos e não conseguem viver do que fizeram a vida inteira. Na internet, os caras ainda mudam o desenho, não dão crédito, é um desrespeito total. Morrem desdentados, sem dinheiro, na miséria. Tenho visto desenhistas que ganharam bem durante a vida e estão acabando dessa forma. Precisamos mudar isso, porque temos ouro na mão. O próprio desenhista precisa ter essa consciência.

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Maurício lança personagem de filho mais novo

Maurício de Sousa tem dez filhos e todos, menos Marcelinho, já haviam se tornado personagens dos gibis da Turma da Mônica. Mônica, Mariângela (Maria Cebolinha), Magali, Mauricio Spada (Professor Spada e Dr. Spam), as gêmeas Vanda e Valéria, Mauro (Nimbus), Marina e Mauricio Takeda (Do Contra) já entraram nas historinhas e são conhecidos dos leitores.

Marcelinho é desde o último dia 31/1 um novo vizinho da turminha, que adora números, economiza e preza pela sustentabilidade. Às vezes exagera na economia, o que deixará Mônica e seus amigos em conflito.

Marcelo de Sousa é o filho mais novo (16 anos) de Mauricio, mas desde os dez anos está para se transformar em personagem também. “Ele já nasceu com o ‘chip’ de econômico e preocupado com a sustentabilidade do planeta”, conta o desenhista. “Demorou porque, de início, pensei em criar o personagem Marcelinho, o ‘Certinho’. E ele disse que não queria porque iria ‘pagar um mico’ com os amigos da escola. Assim, ficou apenas Marcelinho. Acertado isso, ficamos estudando como seria o personagem visualmente, seus pais, suas possibilidades e isso demora mesmo para finalizar”.

O autor já tem mais de 400 personagens criados para suas historinhas nesses 54 anos de carreira. E, pelo jeito, não vai parar por aí. Tem mais 11 netos na fila que, um dia, também poderão ver seus traços nos quadrinhos da turminha.

O dia 31 de janeiro foi escolhido para o lançamento por causa da comemoração do Dia do Quadrinho Brasileiro, no dia 30.

Marcelinho disse que já estava pressionando o pai para que seu personagem fosse finalmente lançado e que ficou contente com o desenho e personalidade desenvolvidos. Além de suas preocupações com o meio ambiente e o controle dos gastos familiares, ele gosta muito de futebol e de desenhar.

A primeira tira de apresentação do personagem à turminha, pela Mônica, já fala de um problema que o Brasil está vivendo: a falta de água.

A publicação será inicialmente exclusiva do site da Turma da Mônica, com uma nova tira semanal sendo postada a cada quinta-feira. Depois, poderá entrar nas tiras publicadas em jornais pelo Brasil e nas historinhas das revistas mensais da Turma da Mônica.

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Eduardo Ribeiro e Wilson Baroncelli são jornalistas, do J&Cia