Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Entre esqueletos e tubarões

Uma notícia publicada pelo G1 na terça-feira (3/3), intitulada “Tubarão ‘alienígena’ é capturado e exposto em museu australiano“, demonstra que o jornalismo científico dos grandes portais de notícias está despreparado até mesmo para passar uma informação simples.

A notícia começa afirmando que um “esqueleto” de tubarão-duende foi capturado por um pescador na costa sudoeste da Austrália, apresentando na sequência uma imagem do animal capturado. A referência a um “esqueleto” aparece duas vezes ao longo do texto, mas fica claro que o exemplar era um animal completo. Provavelmente um erro de tradução ou desatenção na composição da notícia.

O tubarão-duende (Mitsukurina owstoni) é algumas vezes referido como “fóssil-vivo”, devido ao fato de fazer parte de um grupo que existe há aproximadamente 125 milhões de anos, o que pode ter confundido o jornalista no momento de transcrever a informação. Por ser um animal que vive em grandes profundezas é difícil de ser capturado e este exemplar bem preservado foi encaminhado ao Australian Museum em Sydney.

Em outra parte da notícia lê-se este parágrafo, após ser efetuada uma correção: “Natural das profundezas, o tubarão-duende tem nariz achatado, corpo rosado e flácido e dentes em forma de pregos. O peixe mede de três a quatro metros de comprimento, na idade adulta”.

Sobre o tubarão-duende

Antes da correção citada, o texto apresentava a palavra “largura” no local de “comprimento”. Esse detalhe se torna interessante, pois ao pesquisarmos o parágrafo incorreto notamos que o mesmo é extremamente parecido com a página da Wikipédia sobre o tubarão-duende, contendo inclusive o mesmo erro apontado: “O tubarão-duende (Mitsukurina owstoni) é uma espécie que habita nas águas profundas, raramente é visto com vida. Tem nariz achatado, corpo rosado e flácido e dentes em forma de pregos. O peixe mede de três a quatro metros de largura, na idade adulta.”

Todo o parágrafo demonstra ter sido copiado e colado na página do portal, carregando inclusive o erro óbvio em relação às medidas do animal. Erros como esse podem ser considerados “menores”, porém vemos informações incorretas sendo constantemente publicadas por grandes portais de notícias e se espalhando pela internet através de páginas de menor visibilidade. Um descaso com a informação científica que evidencia o despreparo na hora de passar informações básicas relacionadas à ciência.

O tubarão-duende é uma espécie que chama atenção principalmente pelo seu corpo flácido e seu “nariz” comprido e achatado, onde estão localizadas as ampolas de Lorenzini, que são órgãos sensoriais formados por eletrorreceptores e encontrados no grupo dos Elasmobranchii (tubarões e raias). Essa espécie tem a capacidade de projetar sua mandíbula no momento de capturar suas presas. Podem chegar a aproximadamente 4 metrôs de comprimento e vivem próximos ao fundo oceânico em águas marinhas a cerca de 1.200 metros de profundidade. Informações sobre sua alimentação foram obtidas por pesquisadores japoneses que analisaram o conteúdo estomacal de 121 tubarões-duende, encontrando vestígios de peixes, lulas e crustáceos. O tubarão-duende já foi observado nos oceanos Índico, Pacífico e Atlântico.

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Henrique P. Rufo é biólogo; Fabiano B. Menegidio é biólogo, bioinformata e mestrando em Biotecnologia