Notícia publicada na Folha de S. Paulo no domingo (25/2) traz à tona uma prática muito conhecida nos bastidores, tanto da imprensa quanto da política: a compra de matéria nos veículos de comunicação.
Deputados e afins, como apurou a Folha, utilizam de dinheiro público para a ‘divulgação do mandato’ e, com isso, compram matérias em diferentes veículos de comunicação. Esta prática vai contra a ética pela qual se devem orientar os meios de comunicação – a imparcialidade, além de ser regra, é um dever para com a sociedade que necessita de uma informação que não seja distorcida.
Princípios, ora os princípios
O resultado dessa aquisição é, antes de tudo, crime, pois é utilizada a máquina pública como forma de promoção social. Outra de suas conseqüências é trazer à população uma imagem errônea em relação ao deputado fazendo com que este seja sempre retratado de forma a que o leitor o encare através de aspectos positivos, quando o próprio ato da compra de matérias já revela o caráter hipócrita do cidadão.
Assim, temos uma população manipulada por uma informação panfletária e errônea. Porém não é só com deputados que esta situação acontece: é fácil perceber a linha editorial de revistas e afins quando abocanham grande parte da verba publicitária de estatais do governo e ainda são qualificadas como ‘imprensa independente’ e são dirigidas por sindicatos e organizações populares como aponta Ferreira Gullar em coluna da ‘Ilustrada’ (Folha de S. Paulo 25/2/07).
A situação atinge o ápice quando o ‘jabá’ atinge os veículos de comunicação das pequenas cidades. Nesse caso, devido, entre outros motivos, ao pouco volume de publicidade e ao custo total de veiculação do impresso, os jornais acabam se tornando veículos de assessoria de imprensa sempre a favor deste ou daquele partido político. Essa camuflagem impede que o debate de propostas seja feito e, assim, a população acaba sendo ‘induzida’, na urna, a apoiar este ou aquele candidato – ou seja, é ‘conduzida’, quando deveria ter ‘autonomia’ para votar em quem desejasse.
Essa prática revela como a imprensa brasileira é pobre em princípios e próspera em profissionais que arrendam seus serviços em troca de um pouco mais de comida. Sucateando a informação, que é a base para a construção de uma sociedade.
‘Coronéis’ na política
Há de considerar também que a legislação brasileira é igualmente pobre ao permitir que políticos possuam ou participem de cargos de direção em veículos de comunicação. Os políticos são pessoas públicas eleitas para representar os interesses do povo. Quanto à imprensa, ela é de longe o maior formador de opinião nas sociedades modernas. Portanto, quando a legislação permite a prática aqui descrita, permite a manipulação da opinião pública. Situação amplamente difundida entre os regimes totalitários que excluem o diálogo promovendo uma intolerância, na maioria das vezes, sanguinária e que em nada interessa aos interesses do povo.
É fato que o coronelismo por muito tempo sufocou o Brasil numa massa de escravos pobres que atendiam aos interesses do ‘sinhô’. Combatidos, entre outros, por Lampião, Santino, Padre Cícero e outras personalidades do sertão brasileiro, esses coronéis, grandes latifundiários, mantinham seus poderes por meio da inserção na política com seus ‘deputados’ – quando não era o próprio ‘dotô’, eram seus correligionários, destinados a atender apenas a necessidade dos grandes ‘capitalistas’.
Terra em transe
Esses coronéis, percebendo a força da imprensa, primeiramente manifestada na pessoa de Assis Chateaubriand, descobriram que com palavras se consolida um domínio com muito mais eficiência do que com armas. Hoje, espelhados na pessoa do senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), corrompem a sociedade com seus veículos de comunicação hipócritas e suas práticas inconstitucionais desprovidas de qualquer interesse em construir uma sociedade que não seja voltada para seus próprios umbigos.
Utópico é pensar que este comércio irá acabar, ou mesmo que os políticos farão projetos com o objetivo de coibir e punir os envolvidos nesses esquemas mesquinhos de compra e distorção da informação. Mas espera-se que pelo menos a grande imprensa limite sua opinião aos editoriais, embora isto nem um pouco venha acontecendo e até neste Observatório pode-se perceber, muitas vezes, a ética que tem conduzido a imprensa brasileira.
Bem-vindas mesmo são as palavras de Glauber Rocha denunciando uma Terra em Transe.
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Coordenador de Comunicação, Jundiaí, SP