Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A escola no YouTube

A presença irreversível do telefone celular na vida cotidiana causa transtornos nas escolas do mundo inteiro. O ministério da Educação italiano chegou a proibir recentemente que os alunos levassem suas infernais maquininhas para a aula, não só por causa das interrupções, mas também porque os usuários se divertem filmando tudo com as câmeras acopladas aos aparelhos.

No Brasil, estamos diante do mesmo fenômeno. Um exemplo entre muitos: a cena abaixo, de uma briga entre dois estudantes no pátio do colégio. A gravação durou 30 segundos, com direito a torcida: ‘Bate, japonês!’. Está no ar há nove meses, e já foi exibida mais de 95 mil vezes. Recebeu dezenas de comentários, como essa preciosidade: ‘huahasuhsal…. o cara bate com os braço aberto… mto newbie ashuahsa.’

Proibir é infrutífero. Quanto mais proibição mais desobediência. Os alunos tornaram-se cineastas com um celular na mão e algumas idéias na cabeça, prontos a registrar momentos engraçados, inofensivos ou constrangedores do ambiente escolar.

O flagrante acima é o de um aluno (vê-se pelo uniforme que freqüenta uma escola particular confessional) pulando nove degraus de uma só vez. São quase 3 minutos de correrias, empurrões, brincadeiras adolescentes no intervalo das aulas.

A diversão consiste em gravar situações curiosas ou bobas, e no mesmo dia inserir no YouTube, comunicando aos amigos que já está no ar a mais nova produção. Alguns simulam ser entrevistadores, outros imitam cantores, e há quem se especialize em colecionar momentos da atuação docente.

O professor está tentando explicar o que é o anarquismo, e se aborrece porque falta ordem dentro da sala: ‘É a última vez que eu falo! Pô! Caramba!’ Mal sabe ele que um anarquista pós-moderno, dentro de algumas horas, levará as imagens da bronca para o maravilhoso mundo do acesso livre.

A solução é integrar o telefone celular e seus recursos à dinâmica do aprendizado. É inútil coibir, e contraproducente reclamar. Se, como educadores, não tirarmos a câmera do celular da clandestinidade, os alunos continuarão experimentando sozinhos as suas mil e uma possibilidades, paralelamente às atividades da escola.

Assim como as histórias em quadrinhos e a TV foram, ainda que lentamente, incorporadas à didática, também a internet, e o que ela possui de interativo, provocador, deverá fazer parte do trabalho escolar. O celular, como objeto e instrumento de estudo, entrando pela porta da frente da escola.

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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br