Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A esquerda e o jogo da oligarquia

Diz o adágio popular que a esquerda brasileira só se une na prisão. E, de uma forma bem irônica e debochada, a direitona brasileira acusa o maior partido da esquerda brasileira, o PT (Partido dos Trabalhadores) de praticar a ‘companheirofagia’, uma agremiação onde as maiores ignomínias se dão entre os companheiros de partido. Em parte podemos atribuir isso a um jogo da oligarquia brasileira para desqualificar o maior partido de massa da América Latina, mas por outro lado, nós, militantes do PT, temos que lamentar a nossa falta de coesão, falta de aglutinação de idéias e o quanto o partido tem sido severo com os seus companheiros de legenda e pusilânime com os seus adversários políticos.

Como o nosso partido se intimida frente às criticas de Arnaldo Jabor, de Alexandre Garcia, de Boris Casoy e da mídia golpista de modo geral! Estes afirmavam que o PT acomodava os companheiros. Como se no governo deles toda a oligarquia não fosse acomodada e muito bem gratificada. Nos governos da direitona, no Brasil, os trabalhadores nunca tiveram nenhum direito, nenhum acesso a direitos básicos sagrados. Os partidos de esquerda eram tratados como inimigos mortais, sempre debaixo do chicote, ora da polícia, ora da mídia. Parafraseando Machado de Assis, o problema do Brasil não é a Monarquia nem a República, mas nosso problema é uma oligarquia absoluta.

Clima amistoso com algozes

Fomos sempre tratados como alguém fora de cogitação a participar do governo deles. Em muitos momentos da nossa história, partidos de esquerda foram colocados na clandestinidade e, mesmo nos momentos ditos democráticos, inclusive no governo de FHC, partidos de cunho esquerdista, com nuance de partido de massa, eram totalmente alijados do governo. Éramos hostilizados. FHC tratava-nos com uma ironia que lhe era peculiar; ACM tratava-nos com muita arrogância; e a mídia do tipo Veja nos vilipendiava.

Nunca, nem pensar, em um governo direitista no Brasil, a esquerda teve vez. Movimentos sociais, aqui, eram tratados como caso de polícia. O massacre de Eldorado dos Carajás é um exemplo eloqüente disto. Ali, a polícia, com a ajuda direta da pistolaria, sob ordens expressas do governador do estado do Pará, Almir Gabriel, assassinou 21 trabalhadores rurais a pedido da empresa doada pelo Estado ao capital privado – a companhia Vale do Rio Doce. O que me impressiona, é ver que o PT, uma vez chegando ao governo, se relaciona com a direitona de uma forma pusilânime e, quiçá, como lacaio desta.

Não faltam elementos que justifiquem a minha angústia. Me quedo angustiado, sim, porque a oligarquia brasileira é oportunista e golpista e tem o hábito de dormir aliada e acordar conspiradora. E o que tenho visto nos governos da esquerda é uma perseguição aos companheiros e um clima profundamente amistoso com os nossos algozes. Vários carrascos da esquerda do passado recente são vistos, hoje, como heróis da pátria. No caso particular da Bahia, quando a direção das unidades escolares era indicada, percebia-se a indicação de vários diretores de escolas que eram militantes do DEM serem indicados para dirigir unidades escolares num estado cujo governo é do PT.

Prefeitos visivelmente corruptos

Recebi um e-mail do gabinete da deputada estadual pelo PT da Bahia. Comunicava de uma forma vanglorista com quem havia celebrado o Natal. Dentre as pessoas da lista de convidados, no mínimo 80% era composto por figuras da oligarquia da região nordeste da Bahia, não havendo na lista quase ninguém dos movimentos sociais de esquerda. Será que estamos a vislumbrar a morte prematura da esquerda brasileira, ou estaríamos vislumbrando o que Lenin afirmava – que, às vezes, é preciso dar um passo atrás para depois dars dois passos à frente? Estaria o PT capitulando com os reacionários para com isso lhe ser concedida a tranqüilidade mínima para poder governar e se firmar como uma força política? Puras conjeturas!

No governo da Bahia, as secretarias estratégicas, aquelas que mais rendem votos, estão nas mãos de adversários. Por exemplo, a Secretaria de Infra-estrutura e Estradas. Sim, adversários, porque o PMDB, hoje, é quem é mais contundente nas críticas aos governos Wagner e Lula. Nas últimas eleições municipais, o deputado federal Bassuma e a deputada estadual Fátima Nunes deram preferência em subir em palanques de prefeitos que são visivelmente corruptos, caso particular da cidade de Fátima, no nordeste da Bahia. Ali, o prefeito que encerrava o mandato, Manoel Messias Vieira (Sorria), cometeu uma série desmandos na cidade durante dois mandatos seguidos e os teve em seu palanque de campanha, onde ele apoiava o seu vice.

As divergências internas

A incógnita que fica é a seguinte: nossos parlamentares sempre contaram com o trabalho árduo da militância e dos movimentos sociais, que são irmãos siameses, para se elegerem. Com esse distanciamento da base e aproximação da oligarquia conservadora, com quem o PT poderá contar nas próximas campanhas? É do conhecimento de todos que acompanharam a trajetória do nosso partido que ele se fundou, em 1980, por um grupo de intelectuais, sindicalistas e religiosos. Destes atores, o partido alijou os religiosos e os princípios cristãos e tornou-se extremamente severo e intolerante com os companheiros que não compactuavam com acordos feitos pela cúpula do partido.

O deputado João Paulo Cunha (PT-SP), quando presidia a Câmara Federal, fez um discurso efusivo defendendo um colega de parlamento, o deputado Inocêncio de Oliveira (DEM-PE), porque o estavam acusando de escravizar trabalhadores em uma de suas fazendas. O que não era mentira, mas o deputado petista esbravejou, dizendo que não se deveria acusar um homem de uma índole imaculada como o deputado Inocêncio de Oliveira. É um tanto quanto anacrônico, um parlamentar do PT defender alguém que escraviza trabalhadores e não fazer a defesa dos trabalhadores mantidos em regime análogo à escravidão.

Por estas e outras é que concluo que o meu partido é pusilânime com os adversários e severo demais com os companheiros. Outra coisa que chama a atenção é que a mídia, em outros momentos, dava uma grande ênfase às divergências internas do PT, e agora não se deu conta, ou pelo menos não quis dar destaque, do comportamento atual do partido.

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Professor, graduado em Filosofia pela Universidade Católica de Goiás e Pós-Graduado em Filosofia pela mesma IES, Adustina, BA