Fiz uma pesquisa no Google para escrever sobre a forma como está sendo tratado na internet o caso do agora ex-governador José Roberto Arruda, do Distrito Federal. Descobri que é literalmente impossível pesquisar todas as fontes. Já existem 1.330.000 textos para a expressão ‘caso Arruda’.
Para ‘corrupção’ (com a grafia correta) existem 5.350.000 links. Mas existem outras possibilidades: ‘corrrupção’ (com três erres) tem 2.810 citações; ‘corrupsão’ tem 1.360 títulos; ‘corrupição’, 12.000 referências; ‘corrupssão’ tem honrosas 10.500 menções; ‘corupção’ tem 6.460 títulos, ‘corupsão’ tem 199 menções; o perdedor foi ‘corupssão’, com apenas oito links.
Sob o rigor da gramática, podemos concluir que a corrupção da língua na internet é grande e variada. Mas em razão das características do fenômeno virtual felizmente podemos recorrer a outras modalidades de análise. Pierre Levi fez uma analogia entre a comunicação oral e a oralidade reorientada pela era digital (http://www.revistacriacao.net/a_cibercultura_pierre_levy.htm). A internet retirou de cena os mediadores no processo de comunicação escrita (jornais, revistas, televisão, ou seja, as mídias que permitem a comunicação um-todos) e possibilitou a comunicação direta e transversal (todos-todos). Em razão disto, o filósofo francês sugere que a comunicação virtual se parece mais com a língua falada do que com a língua escrita. Justifica-se, portanto, aplicar-se à internet conceitos que são próprios da linguística.
Na cadeia ele está mais seguro
A linguística não se preocupa com acerto e erro, mas apenas com a eficiência da comunicação. Assim, do ponto de vista linguístico não podemos criticar os internautas que discutem a desonestidade (pública ou privada) usando variações da palavra ‘corrupção’. Desde que os textos possam ser entendidos por alguém, eles cumprem sua principal função na oralidade virtual.
Há uma curiosa simetria entre a gramática e a linguística aplicadas à internet e à política brasileira. As características do caso Arruda provam que no Brasil a corrupção política é tão diversificada quanto a grafia da própria palavra corrupção. Nos submundos administrativos municipais, estaduais e federal, o comportamento inadequado parece ser a regra, importando menos a ética e a legalidade do que a eficiência na obtenção de recursos eleitorais.
No sentido ‘lingüístico’, o crime do Arruda não foi cobrar propina por contratos públicos superfaturados. A maioria dos governadores, presidentes e prefeitos fizeram, fazem ou farão isso. O crime do Arruda parece ser ter ele sido filmado fazendo aquilo que todos ‘deveriam’ fazer de maneira bem mais ‘discreta’ ou ‘politicamente correta’.
O desfecho gramatical do caso Arruda me parece evidente. A regra escrita tem que prevalecer (para que a norma linguístico-política volte a imperar). Arruda tem que ser expelido do governo, para que tudo volte à normalidade (e à imoralidade administrativa). Não só isto: a única saída verbal para Arruda é um silêncio obsequioso. Dentro ou fora da cadeia, Arruda tem que desaparecer da vida pública e da imprensa. Alguém aí duvida de que o governador do DF é um arquivo vivo? Se abrir a boca, quantos Arruda coloca no banco dos réus? Do jeito que a carruagem dele se encaminha rapidamente para uma encruzilhada perigosa, Arruda deveria preferir ficar na cela da PF. Na cadeia ele está mais seguro do que fora dela.
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Advogado, Osasco, SP