O objetivo da hipnose na mídia é pouco claro para os consumidores, mas sua intenção é determinada, resoluta e muito eficaz: trata-se de bloquear a capacidade de decisão das pessoas! Do ponto de vista político-comercial, é um propósito muito conveniente. Se você consegue anular o discernimento de alguém, basta ordenar para ele: ‘vote’, ‘compre’, ‘pague’ e ele fará o que você manda. Esse é o fundamento de qualquer tipo de hipnotismo, que pode ser pessoal, coletivo, consentido pelo paciente ou provocado sem o seu conhecimento. Sempre funciona! Pode ser induzido por um comando psicológico oral ou telepático, ou pelo uso de drogas, passes e outros modos; a publicidade é um deles, dos mais sofisticados.
As pessoas têm uma necessidade irreprimível de ação e quando ficam indecisas, hesitantes, paralisam-se e não sabem o que fazer. Por isso cumprem a primeira ordem recebida como se fosse de sua própria vontade. O hipnotizador manda: ‘Você não tem vontade própria’; ele acredita e obedece. O hipnotizador manda: ‘Faça’, e ele faz. Cumpre a ordem como se fosse seu próprio desejo. Cumpre como uma missão. Cumpre e fica feliz! A hipnose sempre vence.
Como a publicidade faz isso? Como se aproveita?
Em primeiro lugar, emprega-se a música pop. Qualquer estilo tem sua temporada, satisfaz e cansa o gosto popular. Então se oferece uma novidade. A música atual, moderna, essencialmente rítmica, tem base numa percussão repetitiva e monótona, que induz à obediência. Repare que, ao dançar, as pessoas balançam a cabeça como que dizendo ‘sim’, ‘sim’, ‘sim’, ‘sim’… O condicionamento coletivo é completo, todos gostam, todos são iguais, todos aprovam. Não há chance de discernir ou analisar a música em si quando a motivação geral prevalece no efeito-demonstração. Sair do gosto geral é isolar-se, perder o contato, perder-se dos demais! Então, ‘sim’, ‘sim’…
A ordem: ‘Não saia daí’…
Artistas, compositores e apresentadores são convocados, atraídos e gratificados pelo sucesso. As gravadoras investem, produzem, vendem, lucram. A mídia divulga. Os fãs viram mercado consumidor. O quadro hipnótico está completo. Como numa conspiração inconsciente, a norma é aderir, fazer parte, ser igual, não destoar do modelo porque fica feio, envergonha! E ninguém deseja ser rejeitado, considerado ‘esquisito’, fora do contexto. O legal é estar ‘ligado’. Então, ‘sim’, ‘sim’, ‘sim’…
Com a hipnose geral instalada, é a vez de dar as ordens! A fala do hipnotizador vem sob a forma de anúncios comerciais, de preferência. Ou qualquer forma de mensagem autoritária que deva ser calcada na mente passiva do indivíduo pronto para acreditar e obedecer. Serve para a política, os negócios, as vendas, a conduta e tudo quanto se quer que seja feito sem a participação crítica do autor, mas só com sua ação obediente.
O grande poder dos anúncios está nos imperativos. Nenhum bom publicitário vai dizer: ‘Este aparelho faz café’. Não! É claro que ele vai dizer: ‘Faça café com este aparelho’. A linguagem imperativa é tão potente que não pode ser desperdiçada, nem mesmo na propaganda meramente informativa. O político não diz: ‘Este é o meu programa de governo…’ Ele diz: ‘Vote no meu programa…’ O imperativo categórico encontra o maior apoio na forma de apresentação do anúncio. Nos intervalos dos programas, o impacto explode na cara do telespectador de repente, antes que ele tenha tempo de mudar o canal ou desviar a atenção. O volume aumenta. O ritmo se acelera. A gritaria ensurdecedora não permite raciocinar, apreciar, avaliar. Só aceitar, só concordar. O apresentador do programa sabe que aquele momento é crucial e, antes de adiantar o ‘próximo segmento’, ele ordena: ‘Não saia daí’…
O esnobismo dos termos estrangeiros
A imposição embutida no anúncio tem um requintado repertório de reforços: o movimento da câmera, o abuso das cores, os saltos da imagem em profundidade e altura e o som, o manejo experto do som, que é o principal componente do tranco. Sem som, a televisão não é nada!
O efeito visual também contribui decisivamente para subjugar o consumidor. Produtos são filmados com arte pelos melhores fotógrafos, nas condições de uso mais agradáveis, e apresentados pelos ídolos mais queridos do público. Tudo para tornar o anúncio indiscutível, impedindo a crítica!
Com tudo isso, o sujeito se rende e aceita, vota, compra, paga… Ele não pode ser diferente, deve estar inserido no contexto e o seu comportamento tem que lhe parecer admirado pelos demais. A vaidade de cada um compõe o quadro geral de que o anunciante se aproveita.
Acostumado ao logro imposto pela televisão, o leitor de jornal, de revista e de outros veículos impressos obedece também aos comandos e engodos estampados nas belas páginas cheias de cores, com uma diagramação inteligente e moderna que absorve a atenção do leitor e a conduz ao objetivo do anúncio: vender, doutrinar, dominar, bloquear a decisão.
O esnobismo adorna tudo com termos técnicos ou estrangeiros. Os prédios têm nomes ingleses: Beach Park, Bluesky, My Forest, Golden Square. São cheios de atrativos como playground, street ball, fitness center, child care, garageband, beautycenter, acqua, nature, shit box. O comprador não sabe o que são, mas os considera um refinamento. O esnobismo barato faz com que ele se sinta inferiorizado se comprar alguma coisa que não tenha os tais enfeites que a do seu vizinho tem.
Você deve comandar sua vida!
Pergunto: você gosta disso? Aceita humildemente essa pressão sobre sua autonomia, essa injunção dominadora que pretende tomar as rédeas de sua vida, mandar nos seus desejos, controlar suas atividades? Claro que não! A menos que prefira a comodidade de estar sempre de acordo e por baixo, vencido pelos intentos de quem só quer sobrepor-se à sua vontade e fazer de você um objeto acomodado de manobras interesseiras. Um bobo!
Portanto, se você não é desse tipo de idiota, faça o seguinte: (a) considere as influências externas como simples tentativas, não obrigatórias, que você pode dispensar; (b) não se deixe surpreender pelos arautos do poder publicitário, mantendo-se atento à sua aproximação insidiosa; (c) diante das sugestões da propaganda, veja se lhe interessam, se lhe são úteis, ou se você é que lhes está sendo útil; (d) pergunte-se quanto custa e se é bom para você; (e) examine se há alternativa vantajosa para obter o mesmo resultado; (f) caia fora, não se entregue, não deixe que decidam por você.
Há outra maneira mais fácil de escapar da escravidão dos anúncios: mude o canal da televisão, ou vire a página do jornal. E fique tranqüilo. Faça de vez em quando um jejum de publicidade.
Pois é você quem deve comandar sua própria vida!
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Contador e administrador aposentado, Valinhos, SP