Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A história sendo feita

Em 2004, o Partido Democrata dos EUA abriu a cobertura de sua convenção nacional para dezenas de blogueiros independentes, entre militantes, analistas e repórteres.

O gesto do partido, que colocou no mesmo pé imprensa oficial e independente, deu o que falar à época. A convenção democrata é um dos eventos centrais à política estadunidense, é de lá que sai boa parte dos arranjos e diretrizes que guiarão as ações do partido pelos próximos quatro anos. E, num cenário político bipolar como o deles, dividido no eterno derby Democratas x Republicanos, isso significa muito. Muito mesmo.

Não à toa, esse gesto dos democratas, esse reconhecimento, cinco anos atrás, da relevância, da produção e do alcance dos blogs independentes, é considerado por alguns estudiosos da cibercultura como uma espécie de marco zero. Como o ponto inicial da legitimação, no grande cenário, da blogosfera como formadora de opinião.

Em 2009, a diretoria de futebol do Palmeiras convidou representantes de veículos independentes palestrinos para uma apresentação sobre o estado de coisas do clube.

Reunidos numa sala de reuniões, os coordenadores e dirigentes palmeirenses proveram editores da mídia palestrina com informações brutas sobre as condições estruturais do clube em vários níveis, além de apresentações sobre os métodos e sistemas de gestão implantados ao longo dos últimos dois anos, e de um panorama da situação financeira em relação ao cenário nacional e global.

Informação e fiscalização

A apresentação foi feita por Marco Antonio Biasotto (coordenador das categorias de base), Toninho Cecílio (gerente de futebol), Savério Orlandi (diretor do departamento de futebol) e Gilberto Cipullo (vice-presidente). Fabio Finelli representou a Libero, responsável pela assessoria de imprensa do clube. Além destes, participaram do debate Genaro Marino (da diretoria de futebol profissional), Lourival Silvestre e Ademir Prevelato (da diretoria de futebol amador).

Não foi pouca coisa. Especialmente se pensarmos que os dados foram exatamente os mesmos mostrados há pouco ao Conselho do clube. E mais ainda se levarmos em conta que a mídia palestrina foi contemplada antes da imprensa tradicional, que deverá em breve assistir à mesma apresentação.

Lógico, há quem pense (e diga) que o clube pretende aparelhar os veículos palestrinos, que é tudo um grande jabá e que andamos todos a nos dar as mãos num grande complô chapa branca-e-verde. Eu prefiro acreditar que há nisso um tanto de estratégia e um bocado de reconhecimento do novo cenário da comunicação.

Porque é simplesmente legítimo que tenhamos todos acesso às fontes primárias e à informação bruta e que os leitores/ouvintes/espectadores recebam esses dados em leituras e angulagens diversas. Até porque se a informação do clube circula por diversos meios, sua veracidade é mais facilmente fiscalizada e a desinformação acaba com a perna curtinha.

Ganhar ou perder é do jogo

Aí, se o sujeito prefere um blog palestrino ou o colunista do jornalão é escolha dele. Mas pelo menos existiu a opção. Pluralidade de opinião é isso aí.

Posso estar errado, mas não consigo me lembrar de qualquer iniciativa parecida no país vinda de instituições ligadas ao futebol ou não. Do mesmo modo, a própria rede formada pela mídia palestrina também é um animal pouco comum na web brasileira.

O convite do clube, assim como seu reconhecimento de que os veículos independentes palmeirenses configuram uma força legítima e formadora de opinião, dão mostra de um pioneirismo que, entranhado ao DNA palestrino, ainda há de ser estudado. Porque extrapola o futebol e a torcida e a paixão e o fanatismo, e entra no campo das novas mídias e sua análise.

Em 2008, os democratas elegeram Barack Obama surfando em boa parte na agenda construída pelas redes online, no emaranhado de blogs, twitters, facebooks e tal.

Em 2009, o Palmeiras briga pela ponta do campeonato. Pode ganhar, pode perder, é do jogo. O que importa é que, independente disso, estamos bem encaminhados.

Corporativismo linha dura

Dito isso tudo, nossos sinceros parabéns (e agradecimentos) à Diretoria de Futebol e aos responsáveis pela comunicação do Palmeiras pela sensibilidade e bom senso no que diz respeito à transparência, informação e relacionamento com a imprensa – independente ou não.

Sobre as informações em si, há muita, muita coisa interessante. Como o volume de dados foi muito grande, estou vendo aqui como consigo sistematizar de um modo bacana. De um jeito ou de outro, daremos um jeito de publicar.

Ainda a respeito dos efeitos da reunião, nada a ver a reação do Juliano Costa no JT. Não o conheço pessoalmente, mas ele parece ser um cara bacana. Infelizmente, o modo como tratou a apresentação da diretoria à mídia palestrina revela uma das coisas mais chatas do ofício, o corporativismo linha dura que, não raro, assombra as redações.

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Funcionário da Unesco