Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A hora de orientar os pais

Está na hora de as revistas femininas voltarem a um assunto que já foi seu forte no passado: a educação dos filhos. Em lugar de tanto botox, tratamento de carbono e a roupa básica para a próxima estação, é hora de discutir, com seriedade e até com a chatice inerente ao tema, o que fazer com os filhos. Educar filhos, dar limites e impor restrições são, hoje, problemas para a classe média – o mesmo público a quem as revistas femininas vendem tratamentos de beleza, conceitos de moda e de decoração.

O caso mais recente daria um belo estudo em qualquer publicação feminina: mulher de 34 anos, mãe de um adolescente de 17, é morta em briga com o filho, no bairro do Morumbi, em São Paulo. Ainda não se conhecem os detalhes da história: alguns dizem que o menino chegou em casa às 4 da manhã, outros que foi a mãe quem chegou de madrugada. Mas o resumo é que brigaram e o menino, treinado em artes marciais, acabou sufocando a mãe. Na hora do perigo, o jovem foi à casa do ex-padrastro, pai de suas meia-irmãs, e este contratou um advogado para defender o garoto sob a alegação de legítima defesa, já que uma faca foi encontrada no quarto, ao lado da mãe.

Mais uma história trágica de jovens que, revoltados com a atitude dos pais (ele estaria de castigo por estar indo mal na escola) acabam partindo para a agressão física.

Que a notícia tem que ser publicada, não há dúvida.

No caso desse menino do Morumbi, o noticiário, pelo menos por enquanto, tem sido discreto. O simples registro de um fato deixa claro que não houve premeditação e que não havia interesses escusos. Segundo os jornais, que acabaram adotando a tese da defesa, foi ‘um acidente’, já que o jovem não é drogado nem apresenta qualquer apelo sensacionalista como no caso de Suzane Richthofen, a assassina confessa que tem lugar garantido nos jornais e TV.

Jovens com filhos

A imprensa tem que noticiar. Esse é o seu papel. Mas até onde o sensacionalismo da imprensa acaba estimulando certos comportamentos?

O assunto é discutido pelo jornal Estado de S.Paulo (23/4/2006) na matéria ‘Negligência, forma mais comum da violência contra filhos’. Ao falar das mães que abandonam filhos recém-nascidos, a psicóloga Dalka Ferrari, do Laboratório de Estudos da Criança, dá uma pista sobre o papel da imprensa:

‘As mulheres pensam que têm que resolver o problema do jeito que podem e o mais rápido possível. Quando vêem os exemplos no jornal e na televisão, elas se encorajam. A divulgação colabora para essa identificação com o problema e o tipo de resposta que buscam’.

Que papel estará exercendo o caso Suzane na cabeça dos adolescentes bombardeados pelo noticiário que mostra a moça de classe média que apelou para uma solução criminosa como forma de se sentir livre? Que efeito terá sobre outros jovens a situação desse jovem que matou a mãe numa briga?

Os jornais vão explorar o caso no seu lado policial e poderão, conforme o humor dos pauteiros, transformá-lo num outro episódio Suzane –ou deixar cair no esquecimento, aceitando a tese da legítima defesa.

Caberia às revistas femininas ir além do fato, discutindo e prestando um bom serviço às suas leitoras. As dicas para fazer uma boa matéria estão todas lá, no registro feito pelos jornais. A vítima tinha 33 anos e um filho de 17. O clima entre mãe e filho era difícil devido ao desempenho dele na escola. A mãe impõe um castigo e o filho, revoltado, parte para a briga. Com conseqüências trágicas.

Se as revistas femininas resolverem mandar repórteres conversar com suas leitoras, descobrirão que são muitíssimos os casos de mulheres jovens com filhos obrigadas a educar as crianças sem o apoio do pai biológico. Descobrirão também que, pressionadas pela mídia, mães e pais de hoje vivem um grande conflito entre dar liberdade e disciplinar os filhos. E quando vêem esse tipo de notícia na imprensa, os pais vão se perguntar se de fato são os bons educadores que se propuseram a ser quando resolveram ter filhos.

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Jornalista