‘A lenta divisão do bolo no país’, notícia veiculada pelo jornal Estado de Minas na sexta-feira (13/8), consegue ser fria como o estudo ‘Desigualdade de Renda no Território Brasileiro’, que concebeu elementos para aquele relato jornalístico.
Sustentada por números compilados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a notícia resume-se a índices e estatísticas, como podemos observar neste parágrafo:
‘De 1996 a 2007 foi registrada leve queda na desigualdade em todas as regiões brasileiras. O melhor desempenho foi identificado na Região Nordeste (baixa de 4,8%) com o coeficiente de Gini passando de 0,84 para 0,80. Em seguida, aparecem o Norte do país, com queda de 3,6% (de 0,83 para 0,80) e o Sul, com 2,5% (de 0,81 para 0,79). A desigualdade caiu 1,2% no Centro-Oeste, com o índice de Gini passando de 0,86 para 0,85. Por fim, o Sudeste registrou redução de 1,1%, de 0,90 para 0,89.’
Razão empobrecida pela técnica
Embora a redação preze pela clareza das informações, a notícia não humaniza com personagens aqueles gélidos números, típica característica do jornalismo impresso contemporâneo. ‘A globalização tornou tudo muito rápido e superficial. Não se tem tempo nem interesse geral para grandes leituras e essa é uma das justificativas (ou desculpas) para a construção de matérias cada vez menores, superficiais e, consequentemente, frias’ (MAZINI).
Não há dúvidas que números são primordiais para alicerçar matérias jornalísticas, pois garantem precisão às notícias e às reportagens, porém, ao aliá-los a personagens, o repórter proporciona ao leitor proximidade com a realidade até então desconhecida, como ensina Jorge Ijuim:
‘Construir narrativas deve envolver uma contextualização precisa e profunda, fruto de uma observação/percepção cuidadosa dos fenômenos sociais. Para as narrativas contextualizadas há que se contemplar os nexos, as significações desejáveis à audiência, de modo que esta perceba os sentidos das mensagens a sua vida. Como pode o repórter construir narrativas se contar somente com fatores objetivos, uma razão empobrecida pela supremacia da técnica e da eficiência?’ (IJUIM, 2007).
Aprendendo a compreender
No artigo ‘O uso da descrição e do diálogo aberto na narrativa jornalística: Em busca de um jornalismo (re)humanizado’, André Giulliano Mazini define a importância de o repórter aplicar o significado da palavra compreensão à sua rotina profissional.
‘A palavra compreender vem do latim comprhendere e uma de suas definições, segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa é estar incluído, estar contido. Logo para que um texto permita ao leitor compreender o tema tratado, é necessário que esse leitor esteja incluído, ainda que momentaneamente, naquele que lhe é informado. O texto que visa uma máxima compreensão nessa perspectiva deve fornecer subsídios suficientes, para que, no momento da leitura, o receptor veja o que viu os personagens da matéria, saber sobre suas aparências, ouvir o que eles ouviram, sentir o que eles sentiram etc.’ (MAZINI).
Além de humanizar o texto jornalístico, os personagens garantem sustentação ao fato decodificado pelo repórter através de números, uma vez que ‘o comunicador na posição de jornalista (deve) fornecer elementos suficientes para que o leitor construa sua compreensão’ (MAZINI).
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Jornalista, Pedro Leopoldo, MG