Nos quase trinta anos de efetivo serviço na Polícia Militar de Pernambuco (PMPE), ouvi as mais diferentes queixas acerca da corporação e dos seus integrantes. Poucas, entretanto, resistiram à mais simples observação dos fatos. Quando tomavam conhecimento da nossa infinda jornada de trabalho, da precariedade das instalações de nossos quartéis, do estresse diário ao qual está submetido o militar estadual, das nossas relações internas e da forma como a classe dominante se apropria da instituição, passavam a ponderar na contundência de antigas verdades.
O desserviço prestado pela PMPE quando legitimou governos antidemocráticos, permitindo-se a estar atrelada à tortura, ao desaparecimento, ao rapto, à execução de opositores do regime, à violência e ao arbítrio, ainda serve de argumento para discriminar a corporação e os seus integrantes. A discriminação, o ato de tratar um grupo de uma forma diferente dos demais, normalmente é manifestada por pessoa preconceituosa, que se exprime através de padrões de preferência.
O benefício da palavra “normalmente” dá-se a poucos. Dentre estes, aos representantes políticos que submetem os princípios e os valores construídos em família às suas pretensões carreiristas. Diz-se “normalmente” porque, às vezes, a arrogância substitui o preconceito. Nas duas ocasiões, manifesta-se o descaso com a boa administração pública, pois tenta-se reduzi-la às conveniências da ocasião.
Qual o motivo para este tratamento?
Vejamos o tratamento dispensado à Polícia Militar de Pernambuco.
A drástica redução dos crimes violentos letais intencionais, que repercutiram internacionalmente o Pacto pela Vida, em nada mudou as relações institucionais ou a beneficiou. Muito pelo contrário: à menor reivindicação, é-lhe lembrada a disciplina, cobrada a hierarquia e repudiada a insubordinação. Como se isso fosse insuficiente, provocaram-na e a intimidaram quando mimaram as eternas diferenças existentes com a Polícia Civil, concedendo a delegados e agentes aumento salarial bastante diferente daquele oferecido aos seus integrantes.
As tentativas das associações militares visando à mobilização para a reparação dessa discriminação e a adoção do subsídio – ente que garante aos aposentados a manutenção quase integral dos valores recebidos quando na ativa – têm sido neutralizadas por propostas e facilidades para a ascensão hierárquica. Dos cursos, caminho necessário para a promoção, face às disputas internas travadas, principalmente, fora dos quartéis, resultará a anarquia administrativa para o preenchimento das vagas aos níveis superiores. O que deveria ser política de recursos humanos para uma melhor prestação de serviços passou a representar tão somente interesses pessoais, moeda de troca,silêncio, e, principalmente, descaso com os que anseiam pela efetiva segurança pública em nosso Estado.
Qual o motivo para dispensar este tratamento? Falta de identidade cultural e social com os mais humildes? Incompatibilidade com a cor e a raça da maioria dos integrantes da corporação? Revanchismo? Falta de assessoramento ? Qual a explicação para o orgulho de ser o terceiro estado que menos destina verba do seu orçamento para a PM? Qual a explicação para o orgulho de pagar o terceiro pior salário a policial militar do país? Soberba?
Respostas aos reclamos sociais
Num passado recente, “página infeliz da nossa história”, brasileiros e brasileiras, para sobreviver à fúria anticomunista da ditadura implantada em 1964, tiveram que exilar-se, esconder-se de suas origens e dos seus nomes. Alguns conseguiram… Da História, poucos se lembram e quase nenhum se comprometeu a escrevê-la de maneira diferente de seus algozes.
A imprensa, legítima representante e defensora da liberdade de pensamento, de opinião e de expressão, tem-se mostrado pouco à vontade em criticar os 82,83% dos votos válidos obtidos na última eleição. À exceção da matéria publicada acerca das instalações físicas dos quartéis do Corpo de Bombeiros, qual outra notícia denuncia a forma de governar Pernambuco e o tratamento destinado àqueles que exigem maior transparência e respostas aos reclamos sociais?
À ausência de uma oposição política, o Quarto Poder deveria publicar a voz das ruas, das praças, dos ônibus, das escolas, das comunidades, dos trabalhadores, ao invés do silêncio das verbas de publicidade. Mas… Pior do que aquele que recebe a propina é o cidadão que a insinua, sugere, e às vezes, ostensivamente a propõe.
E isto é porque o cala boca já morreu. Imaginem!
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Capitão da PMPE