Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A imprensa escrita e os assuntos femininos

As mulheres conquistaram seu lugar no mercado de trabalho. As mulheres têm as mesmas oportunidades que os homens. As mulheres já ocupam cargos de direção nas grandes empresas. Enfim, as mulheres não têm mais do que reclamar. Até a mídia aprendeu a tratar os assuntos femininos com o devido respeito, discutindo problemas femininos com o empenho e o espaço merecido.

Nada disso.

A cobertura da 10ª Conferência Sobre Mulheres, que terminou dia 9 de agosto, em Quito (Equador), mostrou não só que elas ganham menos e apenas conseguem trabalhos inferiores, como a imprensa escrita parece desconhecer assuntos que dizem respeito à desigualdade entre homens e mulheres.

É só comparar a cobertura da Conferência de Quito na internet e na imprensa escrita para comprovar.

As conclusões da conferência estavam nos sites jornalísticos, sugerindo que, nos dias seguintes, poderíamos encontrar matérias na imprensa escrita. Não aconteceu.

A conferência, que teve até a participação da presidente do Chile, Michelle Bachelet, só chegou ao conhecimento das brasileiras que têm acesso à internet. As que se informam apenas através de jornais, revistas ou televisão, vão continuar acreditando que vai tudo bem.

Exigências corporativas

Graças à cobertura na internet, ficamos sabendo:

‘Na América Latina, as mulheres ganham em média 30% menos que os homens e encontram maior abertura em trabalhos de menor remuneração e em condições mais deploráveis.’ (UOL, 9/8/2007)

No Globo On-line, descobrimos:

‘A maternidade provoca a redução de oportunidades profissionais femininas e, apesar de a mulher ter uma participação mais ativa na economia, suas oportunidades tendem a se complicar quando elas ficam grávidas ou têm que cuidar de outros integrantes da família, em geral pessoas mais velhas.’ (8/08/2007)

E foi na internet também que encontramos o link para um exemplo do que é uma boa matéria sobre assunto feminino. O exemplo, que, infelizmente, veio de fora, mais exatamente do jornal New York Times, com a matéria ‘Ela trabalha duro pelo dinheiro e também precisa de uma esposa’:

‘De acordo com dados de uma pesquisa de 2006 do Escritório de Estatísticas do Trabalho, um em cada cinco homens se envolve em algum tipo de trabalho doméstico por dia, enquanto mais da metade das mulheres o fazem. O verdadeiro desafio é que as empresas esperam que você tenha o desempenho de uma pessoa que tem tudo pronto em casa’, disse Kim Gandy, presidente da Organização Nacional para Mulheres. ‘Alguns homens estão em melhor posição para lidar com essas exigências corporativas porque eles têm alguém em casa. A maior parte das mulheres, não.’

As mulheres que trabalham observaram, corretamente, que seus colegas homens que têm o apoio de uma mulher – quer trabalhe fora, ou não – vão mais longe na carreira do que mulheres que são presas pelo casamento e filhos. As mulheres ocupam 50,6% das posições profissionais e de gerenciamento, de acordo com a pesquisa da organização Catalyst, mas perfazem apenas 15,6% da lista de diretores executivos da Fortune 500. Homens e mulheres casados, em média, ganham mais dos que os não casados. Parte disso poderia ser atribuída ao avanço na carreira e no salário que vem com a maturidade (e, em geral, pessoas casadas são mais velhas).

Mas o vão é significativamente maior para homens do que para mulheres. Mulheres casadas ganham em média 17% mais do que as mulheres descasadas, de acordo com dados de 2005 do BLS sobre a renda média de trabalhadores em tempo integral, enquanto homens casados percebem 42% mais do que os homens não casados. Não está claro qual efeito o casamento tem nas carreiras e rendas das mulheres, mas ter filhos é, em geral, um obstáculo. ‘Há uma penalidade bem documentada para a maternidade: as mulheres com filhos recebem menos do que as mulheres sem filhos’, disse Mary Blair-Loy, socióloga e autora de Competing Devotions, um estudo de executivas que mantiveram o trabalho contra as que interromperam suas carreiras.’

Pacto de igualdade

A matéria do New York Times mostra que, mesmo numa economia de primeiro mundo, as mulheres continuam enfrentando dificuldades na carreira e também precisam, como propôs a Conferência de Quito, de um ‘pacto social e de gênero’, para que o trabalho na casa e a atenção aos filhos sejam partilhados com os homens.

Ao que tudo indica, as mulheres da América Latina – brasileiras – precisam, além do pacto de gênero em casa, um pacto de igualdade com a imprensa, para que temas de seu interesse recebam a mesma atenção que os assuntos tradicionalmente considerados masculinos.

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Jornalista