A Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica é o evento internacional mais importante do semestre. Milhares de participantes, oriundos de todos os continentes, encontraram-se em Curitiba nas três últimas semanas, promoveram desde pajelanças e outras manifestações étnicas e culturais até as decisões que serão referendadas pelos países-membros da Convenção.
Centenas de jornalistas de variadas nacionalidades lotaram as salas de imprensa – e, após os trabalhos, animaram alguns dos bons botecos da cidade – numa deliciosa exibição de estilos e humores diversos e que invariavelmente convergiam para o que é próprio de jornalistas: discussões bem-humoradas, curiosidade extremada e muitas, muitas idéias interessantes sobre o estado do mundo.
Jornalistas não são protagonistas, e nada disso saiu na imprensa. Mas a delícia de sentar-se à mesa para uma cerveja com um colombiano em trajes europeus e uma finlandesa em roupas tribais, tendo ao lado um canadense que se dedica a gozar seu amigo americano, traz uma constatação otimista: a imprensa pode estar em crise na maior parte do mundo, mas os jornalistas não.
Mundo de verdade
Os coleguinhas de todas as cores continuam afiados na arte de bem observar a realidade. Mesmo que os debates oficiais tenham revelado grandes dificuldades para arrancar decisões importantes de governos e representantes das empresas em relação ao precário estado do mundo, os teclados das salas de imprensa passaram estes dias a ressaltar pequenos avanços, vitórias pontuais, cobranças contundentes.
Impossível cobrir tudo, mas os europeus e canadenses viram um evento que os brasileiros ignoraram. A imprensa brasileira não percebeu essa riqueza. Nossos repórteres devem ter se sobrecarregado demais para algumas conversas no café, para uma cerveja no Bar Babilônia, para uma discussão madrugada adentro sobre o futuro do capitalismo. O boteco, essa instituição onde as diferenças se afinam e o espírito se revela, parece ter sido banido dos hábitos profissionais do jornalista brasileiro.
Parece que ficamos todos muito sérios, muito circunspectos. Não nos permitimos a bobagem, o riso solto, a experimentação de idéias sem compromisso com o público. A biodiversidade se manifestou com toda sua força, expressou-se nos esforços de gente de origens variadas para entender uma piada, para interpretar um ponto de vista curioso.
Afogados num oceano de press-releases, não percebemos que o mundo de verdade acontecia nessa troca, na riqueza da diferença. O público vai ficar com os informes oficiais.
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Jornalista