Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A imprensa não representa a sociedade

Pretendo demonstrar neste texto que imprensa escrita brasileira definitivamente não representa o conjunto da sociedade em termos opinativos. Nesse aspecto, vejo nela o mesmo vício da imprensa da Venezuela, o de se dispor a representar um segmento minoritário e elitizado da sociedade. Vou falar das opiniões que se pode ler nos grandes jornais e revistas brasileiros sobre alguns temas, sobretudo políticos. Antes, porém, quero deixar claro que não escrevo o que se lerá adiante por apoiar alguma facção política, pois desde a reviravolta ideológica no PT deixei de apoiar o partido e não me inclinei por outro.

Recentemente, a imprensa divulgou pesquisas de opinião que dão conta de que a popularidade do governo federal e de seu titular segue firme e forte, porém o que se vê nas seções opinativas de jornais e revistas é muito diferente. A impressão que se tem é a de que há uma insatisfação generalizada da população em relação ao presidente da República e ao seu governo. Note-se, inclusive, esse caso da fala de Lula de que acobertou corrupção do governo FHC nas privatizações para não criar marola na economia. É óbvio que a maioria dos brasileiros não aprova isso, mas não dá sequer para especular sobre a possibilidade de as pessoas darem mais importância a esse acobertamento do que à hipótese de ter havido de fato corrupção. Porém, o que se vê na imprensa é o contrário.

Há várias formas de se notar que a imprensa brasileira, quando o assunto é difundir opiniões, privilegia a das elites. Um outro caso emblemático é o das cotas raciais e econômicas nas universidades. Qualquer pesquisa de opinião, num país em que ao menos metade da população é afro-descendente e pobre, mostrará ser enorme o apoio dos brasileiros a essa política pública. Então tomemos como exemplo dois dos maiores jornais do país – O Estado de S.Paulo e O Globo. Nesses veículos, é praticamente impossível ver alguém, seja leitor ou articulista, opinar favoravelmente à política de cotas. Há uma verdadeira censura a quem pensa diferente da opinião dos jornalões.

Proposta aos democratas

Outro bom exemplo da seletividade opinativa na imprensa escrita é sobre a questão dos sem-terra. Há um verdadeiro cerceamento de opiniões que não os considerem criminosos. Mesmo na Folha de S.Paulo, o mais democrático dos maiores jornais do país, opinião que não os criminaliza só pode ser vista quando há grande pressão para que dê espaço à divergência, e isso porque a Folha tem ombudsman e um projeto editorial que a obriga a sempre dar algum espaço a opiniões que diferem da sua. Mas o espaço para quem não criminaliza os sem-terra é muito bem calculado e limitadíssimo, enquanto o concedido aos que os criminalizam é ilimitado. Já num Estadão, por exemplo, simplesmente não se dá espaço a quem apóia os sem-terra.

A única conclusão que se pode extrair destas considerações é a de que o Brasil não tem imprensa escrita, e sim boletins político-ideológicos que se dedicam a defender os interesses das minorias privilegiadas da população. E isso explica o fato de este país ser o quarto mais desigual do mundo, sendo precedido apenas por três países africanos miseráveis.

E essa realidade exige que o democrata, aquele que quer ver este país civilizar-se e se democratizar, proponha que se debata como dotá-lo de veículos de imprensa que representem o conjunto da sociedade em lugar de meia dúzia de gatos pingados que nadam em dinheiro.

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Comerciante, São Paulo