‘Um jovem casal de namorados morreu na manhã de ontem após cair do 10º andar do prédio no qual um deles morava, na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo. Para a polícia, a hipótese mais provável é que os dois cometeram suicídio. O caso foi registrado no 14º DP, em Pinheiros, como averiguação de suicídio.’
A notícia foi publicada na Folha de S.Paulo (quinta, 13/1). Apareceu no UOL no dia anterior, mas ficou na página principal do portal apenas por algumas horas. Também na quarta-feira, o caso foi noticiado na rádio Jovem Pan, de São Paulo, e parou por aí.
Quando foi confirmado o suicídio do casal, provavelmente valeu a antiga norma jornalística de não divulgar suicídios, porque poderia incentivar outras pessoas a fazerem a mesma coisa – como ocorre no Japão, por exemplo, onde jovens se matam depois de combinar hora e data pela internet.
Mas, como perguntou um francês recém-chegado ao Brasil, qual o problema de os jornais darem a notícia se os jovens não lêem jornal?
Quando esse tipo de procedimento foi adotado pela imprensa, nem se sonhava com internet e com a sua posterior transformação no grande meio de comunicação dos jovens. Muito menos com o fato de que eles teriam, na comunicação em rede, um recanto secreto ao qual a maioria dos pais não tem acesso.
E a imprensa ‘especializada’ – revistas ou suplementos que têm em sua pauta matérias sobre filhos – não revela, nem de longe, o abismo que está se criando entre os pais da era ‘pré-web’ e os jovens que cresceram dominando o computador.
Não podemos exigir que a imprensa resolva o milenar problema do choque de gerações. Mas conviria um pouco mais de seriedade, disso não há dúvida. Em vez de gastar páginas e páginas com matérias de moda, beleza e comportamento, seria preciso um pouco menos de medo e tentar chegar mais perto das verdadeiras angústias de pais e filhos.
Fotos, legendas e testes: pauta para jovens
A grande pergunta é: o que a imprensa, as revistas femininas e as revistas para jovens fazem para orientar e ajudar?
É só dar uma olhada na revista Capricho (edição de janeiro), uma das mais tradicionais publicações para jovens, e perceber o alto nível de futilidade. São 21 páginas de moda e beleza, 14 páginas de fotos-legendas com jovens celebridades – astros de TV, música, cinema e futebol – e 6 páginas com testes de múltipla escolha: ¨Você é uma boa companheira de viagem?’, ‘Você reconhece um menino fofo?’ e ‘Você está aberta a mudanças?’
O texto mais longo da revista está numa matéria de 3 páginas, uma das quais usada com a foto de abertura. O título ‘Amor de verão’ leva a um texto que diz, na abertura:
‘Sabe o romance de férias, que tinha prazo de validade? Depois do MSN, do ICQ e dos e-mails, a história pode continuar’.
O serviço fica por conta das seções como ‘Assunto de Amiga: , que ensina ‘como lidar com uma incerta do namorado na sala de bate-papo’. Ou a seção ‘Estive Pensando’, onde o tema ‘o fracasso ao alcance de todos’ começa explicando que ‘os sonhos dos nossos pais não são necessariamente os nossos’. (Nesta, pelo menos, há uma discussão, ainda que superficial, do choque de gerações.)
A mesma receita é usada por Todateen, da editora Astral, que usa pôsteres de jovens ‘gatos’ para garantir as vendas. No mais, moda, beleza, testes e ‘dicas para não entrar em pânico quando o gato chegar’.
Um gato(a), uma roupa transada, um celular
Esses três itens parecem ser, a acreditar nessas revistas, o resumo da vida dos jovens brasileiros. Os meninos, transformados em objeto de desejo. E as garotas fazendo o impossível para conquistar um deles. Jovens sem perspectiva a não ser a de arranjar um namorado, destruir as rivais, e descobrir, por meio de teste de múltipla escolha, a melhor forma de se tornar popular na turma.
Como ficam os jovens que não conseguem realizar o sonho do amor romântico, os jovens que precisam trabalhar para ganhar a vida, não são bonitos o suficiente para conseguir um trabalho como modelo e ganhar os cinco minutos de fama com que todos sonham hoje em dia?
Sem orientação, não enxergam perspectivas de futuro ou chance de sucesso fácil. Com problemas reais a enfrentar, não admira que eles façam como os jovens japoneses que vão para a internet e combinam o suicídio; ou os namorados do bairro paulistano da Vila Madalena, que trancaram a porta do quarto e pularam do décimo andar.
A imprensa não é responsável pela formação dos jovens. Mas pode ajudar muito. Pois as revistas tornam muito difícil ser jovem hoje em dia. Para ser feliz é preciso ser bonito, sarado e muito, mas muito fútil.
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Jornalista