Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A lama que encobre a reportagem

Quando a missão de bem informar se transforma em relatório de picuinhas que não levam a lugar algum, ao menos para o cidadão distante do cotidiano político, fracassa. Assim tem atuado a chamada grande imprensa em mais uma suspeita de ladroagem, desta vez na Empresa de Correios e Telégrafos (ECT). Ou, simplesmente, os Correios, tema de Comissão Parlamentar de Inquérito Mista (CPIM) que pode dar em nada graças à interferência de aliados da parte menos interessada em investigações — o governo.

A julgar pelos escândalos que enlameiam o noticiário, fracasso parece descrever a situação da mídia diante deles. Todos caem no lugar-comum de relatar tais situações como simples disputas políticas entre situação e oposição. Jornalistas dão a impressão de se deixarem convencer por essa justificativa, talvez levados a ela de propósito pelos dois lados da questão. E se esquecem da origem dos fatos e de suas possíveis conseqüências.

Não é qualquer cidadão que tem acesso a jornais e revistas. Em rádios e TVs, é difícil compreender o desenrolar dos acontecimentos. E quem deveria ir direto ao ponto, após apuração e pesquisa, preocupa-se mais em registrar declarações de autoridades, que pouco superam o nível do ‘olhem bem para a minha cara e vejam se estou preocupado’.

No colo do consumidor

E dia a dia a reportagem (?) se esquece do que gerou situações do tipo, até a próxima denúncia. Curioso: jornalistas, em grande parte profissionais diplomados em Comunicação Social, não se lembram da sociedade e deixam de levantar dados que a ela interessam de fato, como: 1) Quem se beneficia com o desvio de recursos? 2) Para onde vai o dinheiro público desviado, e como recuperá-lo? 3) Se as fraudes começaram no tempo em que a oposição era situação, por que não foram denunciadas antes? 4) Se as fraudes começaram neste governo, por que os atuais situacionistas querem impedir investigações? 5) Os inimigos de ontem são os aliados de hoje. Por que se aliar a antigos inimigos se eles contribuíram em velhos casos de corrupção e são altamente suspeitos de participar dos atuais? 6) Por que o presidente não está preocupado com tudo isso?

O problema é que há profissionais, sobretudo os mais jovens, despreparados para perguntar algo do tipo e emendar outra questão no caso de uma resposta evasiva ou incompleta. Despreparados porque não entendem o que se passa em torno do principal. Despreparados porque, com matérias fracas, jogarão a desordem no colo do consumidor de informação.

E o dinheiro público continuará a sair pelo ladrão — e com os ladrões.

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Jornalista, 26 anos, repórter do jornal Diário do Litoral, de Santos (SP), e apresentador do programa Entrelinhas, da TV DL