Foi assinada pelos físicos William Boyle e Jorge Smith a Lei Áurea de libertação da fotografia. Graças a esse ato humanitário, eles receberam o Prêmio Nobel de Física de 2009. A partir de então, a fotografia está livre das amarras limitantes das películas, dos laboratórios exploradores, da tecnologia complexa, dos segredos mitológicos da linguagem, dos equipamentos excessivamente caros. Foi revelado seu código secreto. Qualquer humano pode ser fotógrafo, independente da sua classe social, seu nível de escolaridade, seu poder aquisitivo, sua idade. Se havia dúvidas que a fotografia era uma linguagem universal, agora temos certeza que é uma linguagem planetária. O número de fotógrafos cresce geometricamente, começando pelas criancinhas. Basta ter um telefone celular.
Os antigos photographos estão um tanto perplexos. Foi uma mudança muito rápida e profunda tornando-se o mais importante momento de ruptura na história da fotografia. O primeiro havia sido em 1888, quando um tal de George Eastman (leia-se Kodak) inventou o filme em rolo, o colocou numa câmera simples e compacta e lançou o slogan: ‘Você fotografa e nós fazemos o resto.’ A fotografia escapava das mãos da restrita elite que tinha muito dinheiro para comprar equipamentos caros, complexos e pesados. A classe média podia possuir aquela pequena câmera de madeira, obter 10 fotografias e depois simplesmente deixar numa loja Kodak para revelar o filme e fazer cópias.
Entretanto, a grande revolução demorou mais de um século para acontecer. Surge a fotografia digital e a linguagem fotográfica alcança a grande maioria dos terráqueos. Estamos, finalmente, nos expressando em ‘fotografês’ e, cada vez mais, esse idioma será ‘falado’ nos quatro cantos do planeta.
Um olhar com abstração e experiência
Claro que, como acontece em todas as revoluções, muitos paradigmas estão sendo quebrados. Os fotógrafos profissionais estão sendo obrigados a reciclar sua postura profissional, seus métodos de trabalho, suas tabelas de preço e, o mais difícil, aceitar que o universo de ‘colegas’ fotógrafos está crescendo vertiginosamente. Alguns, chocados, estão atirando a toalha e abrindo o seu sonhado bar. Não nos esqueçamos que quando a fotografia passou a ser impressa nos jornais americanos mais de dez mil ilustradores foram contra e, durante dez anos, dificultaram a sua introdução no meio jornalístico dizendo que era uma arte com menos quilates que os seus desenhos. O tempo provou que não era.
A grande maioria dos fotógrafos já empacotou o laboratório preto e branco e está revelando suas fotos no Adobe Photoshop ou programas similares. Tudo ficou mais fácil, mais acessível. A criatividade ganhou asas e, por que não dizer, turbinas supersônicas. Hoje o fotógrafo, ou qualquer profissional, pode, por exemplo, criar um livro em casa, enviá-lo para uma gráfica expressa e recebê-lo impresso em papel couchê, com capa dura, em três dias. Ou obter uma foto e enviá-la, em tempo real, da China para a Conchichina.
O momento é de celebração, não de lamentação. Viva a liberdade de expressão fotográfica. O fotógrafo com sensibilidade tem acesso a mais ferramentas para desenvolver seu trabalho. O antigo cliente, depois do primeiro instante de deslumbre, vai descobrir que não basta apenas uma câmera digital para fazer um trabalho profissional. Atrás dela ainda é necessário uma mente criativa e informada e um olhar com abstração e experiência. Aprender a escrever é relativamente fácil, mas nem todos são poetas ou escritores.
Obrigado, William Boyle e Jorge Smith, pela invenção do sensor digital CCD, o gene da fotografia digital. Obrigado pela popularização da linguagem fotográfica. Merecidamente, ganharam o Prêmio Nobel de Física de 2009.
A humanidade agradece.
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Fotógrafo e jornalista, Porto Alegre, RS