A empresa que tem a intenção de se perpetuar no mundo de hoje, com vistas para o futuro, deve inescapavelmente legitimar suas atitudes, ações, posturas e, especialmente, ter consciência e dar conhecimento dos impactos de suas atividades no passado, no presente e no futuro em diferentes níveis, do comercial ao social. Aquela historinha mal-contada ou a varrida do lixo para debaixo do tapete já não são aceitas e colocam qualquer organização em risco. Em risco de, peremptoriamente, sumir do mapa.
Esta legitimação não é tarefa fácil. Vivemos em um mundo cada dia mais complexo, sem figura de retórica. Se por um lado temos a inexistência de fronteiras, o mundo interligado online, consumidores mais informados e exigentes, também temos uma massa crescente de carentes, miseráveis, famélicos, expulsos do campo, de países pobres, do mercado de trabalho, a perambular pelas ruas das cidades do mundo todo que não os aceita. Bate-nos na cara, todos os dias, contradições gigantescas e dilemas éticos. É crescente a concentração de corporações nas mesmas mãos imensamente ricas, com longos braços em centenas de países e, por oposição, milhões de pessoas que sobrevivem abaixo da linha da pobreza, com um ou dois dólares por dia.
Apesar disso, faz parte desta complexidade uma consciência mais apurada das pessoas sobre uma nova lógica de produção e consumo, diretamente ligada à sobrevivência – sua própria, de seus descendentes, do planeta. O consumidor passa a impor às empresas, organizações e a si mesmo – como condição para estabelecer uma relação regular, saudável, duradoura e benéfica – questões de natureza econômica, social, ambiental, histórica e cultural, observadas ou percebidas nas atitudes das organizações, que, então, são cobradas pela coerência e responsabilizadas por seus atos. Chamam isto de sustentabilidade, um valor percebido pela sociedade, se dá por meio do equilíbrio entre quatro requisitos básicos presentes em qualquer empreendimento humano: ser ecologicamente correto; economicamente viável; socialmente justo; e culturalmente aceito.
Coerência e responsabilidade
Mas para que haja sustentabilidade e para que a organização obtenha êxito na sua legitimação perante a sociedade, é preciso recorrer à mãe de todas as responsabilidades, aquela que pariu a responsabilidade social empresarial e a própria sustentabilidade, ambas citadas por 10 entre 10 empresários. A convergência das responsabilidades empresariais se dá sob o guarda-chuva da Responsabilidade Histórica Empresarial, que reúne as responsabilidades comercial, legal, ambiental, cultural, social etc.
Portanto, para a empresa responder à sociedade com legitimidade de maneira que ela, a sociedade, possa preencher suas necessidades e ao mesmo tempo preservar, planejar e agir de forma a manter indefinidamente a condições indispensáveis para a vida atual e, principalmente, futura, é preciso que a empresa seja vista a partir de uma linha do tempo, na qual se possa fazer uma análise atitudinal, se perceba a energia dinâmica que transita entre passado e futuro, que permite entender o presente e inferir quais impactos serão gerados no futuro. Antes de categorizar, de estampar uma etiqueta na empresa, sempre em uma rotulação fácil, é preciso conhecer a história. Não basta visitar apenas seu departamento de inovação. É necessário passar algum tempo também no departamento de tradições.
Responsabilidade Histórica Empresarial é um conceito sistêmico, relacionado às atividades humanas especialmente a partir das organizações empresariais. Ela nos provoca a olhar para trás e para frente, tal qual fazia o deus romano Jano ou o Exu, da tradição ioruba, de maneira a compreender o presente, a pensar na sua vizinhança local até o planeta inteiro. A pensar que aquele inocente saco plástico que traz a compra do supermercado, vai rolar por aí muito mais tempo do que você vai viver e sabem-se lá os estragos que pode fazer…
Para conhecer uma empresa, avaliá-la com coerência e responsabilidade, crer no seu discurso e estabelecer uma relação de confiança, é preciso olhar sua trajetória no tempo, na perspectiva histórica, que contém todas as suas responsabilidades cumpridas ou não.
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Jornalista, professor da ECA-USP e diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje)