Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

A mídia e o câncer de Elizabeth Edwards

A campanha de John Edwards à presidência dos EUA nunca teve tanto destaque na mídia como agora. Quase duas semanas após o pré-candidato democrata e sua mulher, Elizabeth Edwards, anunciarem que a campanha seguiria mesmo depois dela ser diagnosticada com um câncer incurável, o tema não sai de pauta entre os americanos.


O ex-senador da Carolina do Norte, que disputa com Hillary Clinton e Barack Obama a vaga pela candidatura democrata, não teve muita visibilidade na imprensa nos últimos meses. De fato, quando anunciou que entraria na disputa, em dezembro, Edwards atraiu cobertura discreta da mídia. A explicação para a mudança de abordagem é simples: a história do câncer de Elizabeth é tocante. Praticamente qualquer pessoa, hoje em dia, já teve algum doloroso contato com a doença – seja vítima dela ou acompanhando a luta de um familiar, amigo, colega de trabalho ou vizinho.


Relações pessoais


Em artigo no Washington Post [2/4/07], Howard Kurtz afirma que, além do caso de Edwards, esta campanha presidencial está sendo marcada pelo foco nas relações familiares dos candidatos. O casamento de Hillary com o ex-presidente Bill Clinton talvez seja um dos mais monitorados da política americana – além das lembranças do escândalo Monica Lewinsky, questiona-se qual será o papel de Clinton em um eventual governo de sua mulher. ‘Nada do que a senadora de Nova York diga será mais fascinante para os jornalistas do que sua situação marital’, diz Kurtz.


O pré-candidato republicano Rudolph Giuliani é outro que tem a vida pessoal analisada constantemente pela mídia. Recentemente, o New York Times publicou uma citação em que Andrew, filho de 21 anos do ex-prefeito de Nova York, classifica sua relação com o pai de distante. O jovem também diz ter problemas com a nova mulher de Giuliani, Judith.


Julgamento e empatia


Mas o debate na imprensa, diz Kurtz, parece nunca ter sido tão forte quanto o que diz respeito à família Edwards. Enquanto alguns jornalistas foram compreensivos, respeitando a liberdade do casal de tomar a decisão que preferir sobre a campanha, outros caíram em cima do pré-candidato. ‘A ambição cegou o discernimento dele e o de Elizabeth também’, afirmou a colunista do New York Daily News Jane Ridley. ‘A decisão não é nada realista’, escreveu Jill Porter, colunista do Philadelphia Daily News. Até o polêmico apresentador de rádio Howard Stern caiu na tentação de tomar partido. ‘Eles têm dois filhos. Vão para casa. Fiquem com os filhos. Ela tem que conservar sua energia. É uma coisa ridícula’, comentou.


A exposição pública do câncer de Elizabeth Edwards também acabou por inspirar outros a compartilhar suas próprias experiências com a doença. A apresentadora da NBC Ann Thompson revelou, na semana passada, que foi diagnosticada com câncer de mama há um ano e manteve a doença em segredo por medo de que as pessoas sentissem pena dela. A jornalista contou que hoje, depois de passar por quimioterapia, está curada. A história de capa da revista Newsweek desta semana traz o depoimento do colunista Jonathan Alter sobre sua batalha contra o câncer e a capa da U.S. News & World Report traz um artigo intitulado ‘O câncer e eu’, da editora de saúde Bernadine Healy.


Independente das críticas ou do apoio à decisão do casal Edwards, é ruim para o pré-candidato que seu momento de maior destaque tenha base em um fato tão triste, diz Kurtz. A própria Elizabeth já declarou que, nos últimos dias, está cansada de si própria – ‘não consigo ligar a TV e não me ver, ou abrir o jornal e não me ver’, comentou. No fim, afirma o colunista do Post, o intenso debate sobre a decisão do casal ‘acaba sendo menos sobre ele e mais sobre nós’.