Sim, havia motivo para que fosse preso: deixou de pagar pensão alimentícia à ex-mulher, com quem constituiu família. E 89,6 mil reais são uma bolada. Mas penso que a situação constrangedora pela qual o ex-jogador de futebol Romário passou na última semana é um problema exclusivamente dele. De que isso interessa aos outros?
Na dúvida, um batalhão de repórteres, fotógrafos e cinegrafistas se acotovelou na delegacia onde Romário pernoitou. Enquanto estava detido, jornalistas fizeram o de sempre: procuraram saber onde foi encarcerado, em quais condições, se comeu, se dormiu e que visitas recebeu em sua passagem por trás das grades.
Casos assim me fazem lembrar a diferença que se diz existir entre assunto de interesse público (o que as pessoas precisam saber e, supostamente, dá pouca audiência) e assunto de interesse do público (aquilo que, na teoria, as pessoas querem saber e, por isso, vende mais).
Sorriso enigmático
À medida que cresce a concorrência digital com o jornalismo ao qual nos acostumamos, mais me incomoda ver a mídia se esforçar tanto para futricar sobre a vida alheia (mesmo se tomando como verdadeiro o que se contou a respeito do Baixinho) e menospreze seu papel de fiscalizar temas que poderiam levar a perguntas mais profundas, em casa e na rua, do que ‘E o Romário, hein?’
Talvez o enigmático sorriso que Romário dirigiu aos jornalistas ao deixar a carceragem tenha este significado: o de que a imprensa tem muito mais com o que se preocupar – e nem sempre se ocupa disso como deveria.
******
Repórter do jornal A Tribuna, Santos, SP, e editor do blog Reexame (www.reexame.blogspot.com)