Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A publicidade disfarçada de jornalismo

É impressionante a constância com que o jornal A Gazeta publica cadernos especiais sobre ensino superior. Sim, é um tema pertinente, uma dúvida cruel que atormenta milhões de jovens brasileiros. O problema é a forma com que o tema é tratado. O caderno publicado na sexta-feira 21/10 parece um informe publicitário das faculdades privadas, que estão abrindo o processo seletivo para 2006. Há ‘matérias’ sobre 17 centros de ensino superior particulares. Sobre a Universidade Federal do Espírito Santo, apenas algumas dicas a respeito do vestibular.

É interessante observar também os anúncios desse caderno especial. Entre essas 17 faculdades, 16 são anunciantes. Nota-se que o objetivo do encarte extraordinário é exclusivamente faturar verba publicitária, e que as reportagens soam muito mais como divulgação das faculdades do que informações de interesse para o leitor.

A Univix, instituição relativamente grande no estado, anuncia mas não ganha nenhuma reportagem no caderno. Estranho? Não. Explica-se: na própria propaganda, a Univix avisa ao leitor que no dia seguinte (sábado) sairá em A Gazeta um caderno especial sobre seus cursos, projetos de extensão e processo seletivo.

Mas não é só isso. Folheando o jornal, percebe-se que todas as matérias locais são assinadas por jornalistas. Nesse caderno, não. Será porque os textos são meras reproduções de press-releases enviados pelas assessorias de imprensa das entidades de ensino? Ou seja, as faculdade anunciam duplamente. Na propaganda e nas ‘matérias’ – que estranhamente só falam bem das instituições. As únicas fontes são coordenadores e assessores das próprias faculdades.

Grandes poluidoras

Enviei e-mail criticando a postura do jornal. Recebi uma cínica resposta: ‘Tem informação errada? Aponte-as, que encaminhamos a correção’. A grande mídia mostra mais uma vez que, além de vendida, não está nem um pouco disposta a discutir seus problemas e ouvir as críticas do leitor.

Enquanto veículos de comunicação fazem publicidade reforçada com a credibilidade do jornalismo, temas como a reforma universitária, o descaso com o ensino público, os problemas gerados pela mercantilização da educação e a existência de faculdades ‘pilantrópicas’ não são retratados pela mídia.

E não são só as faculdades que se beneficiam dessa venda de espaço jornalístico para fazerem propaganda. São comuns também cadernos especiais sobre temas como meio ambiente, patrocinados por grandes empresas como CST, Vale do Rio Doce, Samarco, Aracruz Celulose (não por acaso, grandes poluidoras). Lamentável.

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Estudante de Jornalismo da Universidade Federal do Espírito Santo