Em 25 de setembro é comemorado o Dia da Radiodifusão. Revisitar o passado é uma prática comum – e saudável – em datas como esta. De certa forma, também vou fazê-lo neste artigo, mas com o objetivo de mostrar como as emissoras de rádio e televisão foram mudando a forma como viabilizam financeiramente suas atividades até chegar aos dias atuais, quando as novas tecnologias impõem uma reflexão profunda sobre a dinâmica do mercado de mídia em todo o mundo.
Do ponto de vista comercial, podemos dividir a história da radiodifusão em três eras, de acordo com o que as emissoras efetivamente entregam aos seus anunciantes. Assim como em outras “eras” do marketing, as que proponho aqui não possuem início ou final definidos, mas sinalizam práticas que prevaleceram – ou ainda prevalecem – no mercado e permitiram que as emissoras se mantivessem economicamente viáveis durante todos estes anos. Também não se trata de modelos certos ou errados, mas apenas diferentes entre si. Em comum entre eles, somente o fato de terem nascido como uma resposta das empresas às mudanças sofridas pelo seu ambiente de negócios e das quais não poderiam mais fugir.
Na primeira era, as emissoras faziam mais dinheiro vendendo programas inteiros. A priori, parecia um modelo bastante interessante, pois a estação deixava de se preocupar com a produção – que ficava sob responsabilidade das agências de propaganda – e ainda recebia dos anunciantes. Foi o caso, por exemplo, de O Repórter Esso, do Noite de Gala – patrocinado pelas lojas O Rei da Voz – e das novelas Gessy Lever. Em contrapartida, esses anunciantes detinham a exclusividade dos intervalos comerciais durante as suas atrações, o que acabou tornando-se um problema à medida que as audiências foram crescendo. Num determinado momento, as estações começaram a ver que o dinheiro que deixavam de ganhar durante esses intervalos estava se tornando muito maior do que aquele que deixavam de gastar ao entregar suas produções.
Os anúncios rotativos
A primeira solução encontrada foi passar a vender espaços entre os programas, o que fez nascerem blocos comerciais com quase uma hora de duração! Para dar um basta nisso, o polêmico presidente Jânio Quadros baixou um decreto que limitava os intervalos em até três minutos – podendo chegar a oito somente no caso de mensagens ao vivo, a fim de preservar o mercado de trabalho das garotas-propaganda.
Um dos únicos profissionais a comemorar essa medida foi Walter Clark, quando ainda trabalhava na área comercial da TV Rio. Conforme consta em sua autobiografia O campeão de audiência (Best Seller, 1991), escrita com o jornalista Gabriel Priolli, Clark implantou os trinta segundos como padrão para os comerciais e criou programetes durante o horário nobre – chamados de strips – para dar uma maior unidade à grade e ainda valorizar o espaço entre as principais atrações, enquanto elas ainda não passavam a ser responsabilidade da própria emissora.
Foi sobre estas bases que a chamada programação vertical e horizontal viria a se desenvolver no Brasil e a segunda era do rádio e da TV seria consolidada: agora, vendem-se segundos.
Essa é a pedra angular do modelo de negócio de qualquer emissora comercial de rádio e TV do mundo até os dias atuais e só é possível graças ao controle rígido tanto do tempo de arte – ou seja, das atrações propriamente ditas –, quanto da publicidade – o que é assegurado pelo trabalho do departamento de operações comerciais (mais conhecido como Opec). Neste esquema, valem mais os programas de maior audiência de cada estação – que, normalmente, estão localizados nas faixas de maior atração de público de cada mídia (a manhã para o rádio e a noite para a TV).
Os outros horários são sustentados pelos anúncios rotativos ou por programas dirigidos a targets mais específicos – como crianças e donas-de-casa, por exemplo – e tornam-se um investimento mais eficiente para a comunicação de muitos produtos e serviços. Mesmo que uma emissora consiga vender todos os segundos que tem disponíveis em sua grade comercial – o que é muito difícil –, haverá sempre um teto onde a geração de receita de uma emissora pode bater.
Estar presente é um fator crucial para o sucesso
Essa é uma das tantas especificidades presentes no mercado de mídia eletrônica e, para superá-la, começa a surgir a terceira era do rádio e da TV, baseada na venda de marcas e experiências. Conforme escrevi no artigo “O futuro do rádio”, mais do que tempo, as emissoras promovem e vendem relacionamentos – seja entre pessoas, seja entre pessoas e empresas. Estas relações, como quaisquer outras, são mediadas por valores que, no caso das emissoras, são transmitidos através de suas marcas.
Com o avanço das novas tecnologias – internet, mobile, TV paga etc. – e a consolidação de formas já conhecidas de difusão de conteúdo – eventos, licenciamentos ou até mesmo a educação formal –, os grupos de comunicação têm de estar cada vez mais atentos para perceberem quais dessas novas “janelas” podem ser abertas por cada uma das suas marcas para que elas avistem seus públicos de novas formas e de formas mais eficientes, criando fontes de receita vindas diretamente do seu público final (ouvinte ou telespectador), ou opções integradas e diferenciadas para que seu público intermediário (anunciante) possa investir.
Mais do que o futuro, o presente do rádio e da televisão – e, por que não dizer, da mídia em geral – está na integração das marcas e conteúdos construídos nas mídias mais tradicionais com as possibilidades trazidas pelas novas formas de se informar e se entreter que nascem a todo o momento. Nunca se tratará de escolher uma ou outra plataforma: estar presente em todos os lugares, de todas as formas, é um fator crucial para o sucesso de qualquer veículo de comunicação, ainda que muitas dessas novas atividades não estejam gerando a receita que se gostaria. Ninguém duvida que esta receita um dia chegará e, quando isto acontecer, todos temos de estar prontos para aproveitá-la da melhor forma possível.
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[Fernando Morgado é professor convidado da ESPM-RJ, pesquisador e escritor]