Wednesday, 13 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

Andrei Meireles e Gustavo Krieger

‘Às 19 horas da quinta-feira 12, o subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, Waldomiro Diniz, ficou com os olhos cheios d’água. Acabava de ser informado por ÉPOCA do conteúdo explosivo de uma fita de vídeo, gravada em 2002 pelo empresário e bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. Na gravação, Waldomiro pede propina para si mesmo e dinheiro para a campanha eleitoral. Em troca, promete beneficiar Cachoeira em uma concorrência pública. Na ocasião, Waldomiro Diniz presidia a Loterj, Loteria do Estado do Rio de Janeiro, no governo da petista Benedita da Silva. Waldomiro tentou negar as imagens, mas acabou confessando: levou dinheiro do jogo do bicho para a campanha eleitoral do PT. Entregou pessoalmente R$ 100 mil ao comitê do candidato ao governo de Brasília, Geraldo Magela. ‘Ele entregou na minha mão e foi entregue à campanha do Magela’, admitiu Waldomiro, referindo-se a Cachoeira.

Na política do Rio, Waldomiro cercou as favoritas das pesquisas de opinião. Negociou contribuições mensais de R$ 150 mil para Benedita da Silva (PT) e Rosinha Matheus, hoje no PMDB. Para si, ele pediu ao bicheiro 1% do valor dos contratos acertados. A ÉPOCA, disse que fez o pedido para ajudar um assessor (leia a entrevista no link Dinheiro Para Campanha, no final da página).

Procuradores investigam as conexões políticas dos bingos

Até a noite da quinta-feira, Waldomiro Diniz ocupava um gabinete no 4o andar do Palácio do Planalto. Desde a reforma ministerial de janeiro reportava-se ao ministro da Articulação Política, Aldo Rebelo. Chegou ao governo a convite do ministro da Casa Civil, José Dirceu, de quem é antigo colaborador e vizinho de gabinete. Ambos despacham um piso acima do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Feito às escondidas, o encontro entre Waldomiro e Cachoeira ocorreu numa das empresas que o bicheiro tem no Rio. Não havia mais ninguém na sala, a câmera de vídeo foi escondida num canto da parede e mesmo assim Waldomiro comportou-se como se mais alguém pudesse ouvi-los. Nos trechos mais comprometedores, o assessor do Planalto fala em voz baixa e chega a sussurrar no ouvido de Cachoeira. Quando discutem cifras e contribuições de campanha, escrevem os nomes dos beneficiados numa folha de papel, para não pronunciá-los em voz alta. Antes de ir embora, Waldomiro rasga a folha e guarda os pedaços no bolso. Para clarear esses trechos, ÉPOCA submeteu a fita à análise do perito em fonética Ricardo Molina de Figueiredo, da Unicamp. Ele autenticou os trechos publicados nesta edição.

Na ocasião, a Loterj estava em processo de renovação de seu principal contrato – aquele que define a empresa responsável pela exploração de loterias com apostas em papel ou por internet e telefone. A disputa ainda estava em andamento, mas Waldomiro e Cachoeira só se referiam ao contrato como ‘o negócio da Hebara’, uma das concorrentes. Isso foi em agosto. Três meses depois, em novembro, a Hebara Distribuidora de Produtos Lotéricos, responsável por esta operação, renovou o contrato com a Loterj.

A intenção de Cachoeira não era vencer a licitação. ‘Vou ficar fora. Palavra minha com você’, disse o bicheiro a Waldomiro. ‘Vamos fazer com a Hebara.’ Seu medo era de que o edital, amplo demais, permitisse que a concorrência também explorasse as máquinas de apostas on-line, seu principal negócio no Rio de Janeiro. Para se proteger dos rivais, queria que Waldomiro, na condição de presidente da Loterj, fizesse mudanças no edital da licitação que lhe assegurassem as loterias virtuais. Waldomiro não só garantiu ao bicheiro a manutenção do monopólio, como ainda ofereceu a Cachoeira a chance de reescrever o edital de acordo com sua conveniência (leia a transcrição no link Leia os principais trechos do vídeo, no final da página). Cachoeira e seus sócios continuaram mandando nas máquinas oficiais de jogo. Em julho de 2003, numa grande festa, anunciaram sua instalação em uma rede de 400 franqueados.

Aos poucos, o clima da conversa vai mudando. O tom de voz se abaixa, os dois interlocutores se aproximam e os assuntos ficam mais íntimos e conspiratórios. Um novo personagem entra na pauta. José Renato Granado Ferreira, o Zé Renato, presidente da Associação de Bingos do Rio de Janeiro. Depoimentos em poder do Ministério Público Federal, aos quais ÉPOCA teve acesso, apresentam Zé Renato como ‘operador’ dos irmãos Alejandro e Johnny Ortiz, representantes da Máfia italiana no Brasil. Na conversa, Cachoeira diz que aceita pagar para retirar Zé Renato do mercado de videobingo. ‘Ele pega 1 milhão?’, pergunta a Waldomiro. Depois, sobe a oferta: ‘R$ 1,5 milhão, para sair fora. Do jeito que está hoje.’ ‘Só se botar meu nome’, pondera o presidente da Loterj.

Os dois discutem números e porcentagens por vários minutos, sempre com o cuidado de escrever nomes e valores numa folha de papel. Cachoeira eleva a oferta ao concorrente para R$ 1,5 milhão, mais 3% do faturamento. ‘Ele não fecha’, diz Waldomiro, oferecendo-se como mediador. ‘Vou te fazer uma proposta para conciliar. Um, um e um, mais os 3%’, no que seria uma referência a R$ 3 milhões. Inconformado, Cachoeira leva o leilão a R$ 2,5 milhões, mais a porcentagem.

Cachoeira comanda a pauta da reunião e dá a senha para mudança de assuntos. ‘Política’, diz secamente, dando início à negociação. ‘O pessoal do Garotinho me procurou’, diz Waldomiro. O presidente da Loterj estava numa posição delicada diante da disputa entre Lula e Garotinho pela Presidência da República e entre Benedita da Silva e Rosinha Matheus pelo governo do Rio. Waldomiro chegara à presidência da Loterj no governo de Anthony Garotinho, em um acordo com o PT. Foi o único petista poupado depois do rompimento do ex-governador do Rio com o Partido dos Trabalhadores. Quando Garotinho renunciou para disputar a Presidência, Waldomiro Diniz foi mantido à frente da Loterj por Benedita da Silva.

Assessor investigado freqüenta núcleo do poder em Brasília

Na conversa com o bicheiro, Waldomiro é diplomático. Diz que tanto Rosinha quanto a então governadora, Benedita, têm chances de vencer. Pede R$ 500 mil mensais para sustentar duas candidaturas nos meses de agosto e setembro. ‘Posso ajudar, mas pouco’, responde Cachoeira. Após outro rápido leilão, fecham acordo em R$ 150 mil por candidato. Os nomes dos beneficiados não são pronunciados. Cuidadoso, Waldomiro prefere escrever. Com a pauta quase esgotada, ele abaixa ainda mais o tom da voz. Foi necessária a perícia da equipe de Ricardo Molina para ouvir com clareza o diálogo. ‘Você vai disponibilizar alguma coisa à parte? Quero 1% para mim’, pede o presidente da Loterj. ‘Do total?’, questiona o bicheiro, antes de fechar negócio.

A fita de vídeo foi entregue ao senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT) há cerca de duas semanas. ‘Recebi o material, não tinha como avaliar sua autenticidade, mas, diante da gravidade do assunto, encaminhei ao Ministério Público para investigação’, conta. Na verdade, o senador recebeu duas fitas. A segunda flagra um encontro de Waldomiro com Cachoeira no aeroporto de Brasília, no dia 5 de maio de 2002. Gravada pelas câmeras de segurança do próprio terminal, não tem áudio. É justamente isso que aumenta o clima de mistério. A câmera giratória permanece fixa na mesa do restaurante onde os dois conversam. Quando decidem ir embora, outras câmeras passam a seguir Waldomiro. Ele deixa a mesa carregando uma sacola branca e dirige-se ao setor de embarque de passageiros. O foco das imagens se alterna entre Waldomiro e a sacola. Quando ele passa pelo aparelho de raios X, o operador da câmera tenta sem sucesso mostrar o conteúdo da sacola.

As fitas foram entregues aos procuradores da República no dia 4 de fevereiro. No dia 7, o Ministério Público tomou depoimentos de duas pessoas ligadas ao esquema dos bingos e do jogo do bicho. Os nomes das testemunhas estão sendo mantidos em sigilo para protegê-las, mas ÉPOCA teve acesso ao que eles declararam às autoridades. Ambos denunciam a ligação de Waldomiro com a contravenção. Um dos depoentes acusa o subchefe da Articulação Política de ser intimamente ligado aos irmãos Ortiz. Ele conta que ‘o ex-presidente da Loterj, Waldomiro Diniz, passou a negociar com Carlinhos Cachoeira para que este entrasse no jogo do Rio de Janeiro e com isso afastasse Ortiz ou criasse as condições para subir os porcentuais pagos a título de propina para os ‘donos’ dos jogos no Estado’. A mesma testemunha diz que ‘Waldomiro, após se afastar da Loterj, passou a defender os interesses de Ortiz no governo e no Congresso’. Segundo a denúncia feita pelo depoente ao Ministério Público, ‘esta defesa não se dá às claras, e sim é intermediada pelo dono do Bingo Augusta e presidente da Associação Brasileira de Bingos (Abrabin), Olavo Salles’.

O principal interesse da Abrabin é o projeto de regulamentação dos bingos. No fim do ano passado, o presidente Lula criou um grupo de trabalho para estudar o projeto, envolvendo Caixa Econômica Federal, Receita Federal, Ministério Público e vários ministérios. O grupo fez uma proposta e o projeto está parado na Casa Civil, à espera da decisão do ministro José Dirceu. Waldomiro compareceu à reunião que decidiu criar o grupo de trabalho, depois saiu de cena. ‘Foi uma decisão do José Dirceu, por conta da passagem dele pela Loterj’, diz o deputado Gilmar Machado (PT-SP), principal defensor da legalização dos bingos no Congresso.

‘Eu gostaria muito que Waldomiro Diniz opinasse no projeto’, diz o presidente da Abrabin, Olavo Salles. ‘A presença dele na Casa Civil é uma reserva de bagagem de conhecimento.’ O projeto ainda não saiu da Casa Civil, mas Salles está otimista. ‘A proposta deve contemplar nossos interesses.’ Quando era presidente da Loterj, Waldomiro foi a grande estrela de um encontro da Abrabin sobre o projeto de legalização do jogo. Arrancou aplausos ao defender que o controle fosse feito pelos Estados, e não pela Caixa Econômica Federal.

No governo de transição, Waldomiro era apontado como forte candidato à presidência da Caixa ou ao menos à vice-presidência encarregada das loterias federais. Optou pelo gabinete no 4o andar do Planalto. Mesmo assim, foi acusado de interferir na negociação do principal contrato da Caixa, com a multinacional Gtech. A Gtech é responsável pelo processamento de dados das loterias federais. O contrato lhe rendia US$ 130 milhões por ano e muitas brigas com a direção da Caixa. O clima de desconfiança atingiu o ponto mais grave justamente entre a eleição e a posse de Lula no Planalto. Mário Haag, vice-presidente de Logística indicado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, chegou a gravar reuniões com representantes da multinacional sem que eles fossem avisados. As gravações, em vídeo, também estão sob a custódia do Ministério Público Federal. Os funcionários da área de segurança da Caixa que permitiram as gravações foram punidos em uma sindicância interna.

Afastado do cargo por doença, Haag não gosta de falar publicamente sobre o caso. Na semana passada, em uma conversa reservada, disse que a direção da Caixa ‘recebeu avisos’ do escritório de transição de Lula em favor da renovação do contrato. Segundo ele, os recados vinham da futura Casa Civil. Mais exatamente, de Waldomiro Diniz. (COM DIEGO ESCOSTEGUY E NELITO FERNANDES)’

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‘No Congresso, Waldomiro é tratado como ministro’, copyright Época, 16/02/04

‘Waldomiro Diniz chegou a Brasília pelas sombras. Em 1992, quando foi instalada a CPI do PC, a CUT enviou uma tropa de choque a Brasília. Entre seus integrantes estava o ex-funcionário da Caixa Econômica Federal, demitido no corte de pessoal feito pelo então presidente, Fernando Collor. Waldomiro logo se destacou pelo talento em seguir o rastro do dinheiro pelo labirinto de contas fantasmas e paraísos fiscais operado pelo tesoureiro de Collor, Paulo César Farias. Suas relações com os sindicatos de bancários garantiam-lhe informações privilegiadas.

Collor caiu, Dirceu tornou-se o segundo político mais importante do PT – em parte por sua dedicação à CPI – e fez de Waldomiro um hábil negociador político. Em 1994, tornou-se o chefe da Assessoria Parlamentar do governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque. Com a derrota de Buarque em 1998, no ano seguinte Waldomiro foi nomeado chefe da representação do governo do Rio de Janeiro em Brasília. O governador era Anthony Garotinho, então no PDT. Ele se mudou para o Rio quando assumiu a presidência da Loterj e voltou para Brasília logo após a posse de Lula.

No Congresso, só colhe elogios. Ganhou força no primeiro ano do governo petista como hábil encaminhador dos pedidos de parlamentares ao governo. Para isso, usava o canal direto com o Palácio do Planalto. Na reforma ministerial, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB) assumiu a articulação política. Junto com o cargo, veio Waldomiro.

Discreto, Waldomiro não vive como um homem rico. Dirige uma Parati e mora em um apartamento de quatro quartos em área nobre de Brasília, mas deve R$ 66 mil ao Banco do Brasil. A dívida, contraída em 1995, é de cheque especial.

Os principais trechos do vídeo

Trecho 1 – Waldomiro Diniz e Carlinhos Cachoeira discutem mudanças no edital de uma licitação para exploração de loterias no Rio de Janeiro. Falam da concorrência como o ‘negócio da Hebara’, a empresa que meses depois ganharia o contrato. Cachoeira quer garantias de que o edital não será amplo demais, permitindo que a Hebara explore o filão de jogos on-line, que é monopólio de suas empresas. Waldomiro diz que seu problema é que o edital já fora aprovado pelo Tribunal de Contas do Estado. No final, propõe que o próprio bicheiro redija o edital.

Waldomiro – Jogos, o problema é o seguinte. O Tribunal aprovou o edital. Está aprovado o edital. Eu posso botar ele na rua agora. Eu estou sofrendo um bafo aqui no cangote para botar. Agora é época de eleição, todo mundo é amigo de todo mundo…

Cachoeira – Mas você vai mexer no objeto?

Waldomiro – Para eu mexer no objeto, eu tenho que mandar para o Tribunal de novo.

Cachoeira – Mas manda. Manda se for preciso. Aquele objeto está errado.

Waldomiro – O que você quer que tire dali? O que está te atrapalhando? (…)

Cachoeira – Por que não troca o objeto? Só jogos pela internet e jogos pelo telefone.

Waldomiro – Por telefone, com essa característica. Não pode, ele não pode… Redige você! Redige você, com o Armando (Armando Dilli, assessor que deixou a Loterj para trabalhar com Cachoeira).

Cachoeira – Eu e o Armando, você aceita?

Waldomiro – Veja bem como é que eu aceito. Eu só preciso saber com o Tribunal qual é a forma para eu não jogar isso e jogar para daqui a 60 dias. Porque o pessoal está ‘Waldomiro, por que você não faz, por que você não faz?’ Fica parecendo que eu estou com o negócio na gaveta e não quero fazer.

Trecho 2 – Waldomiro pede ao bicheiro contribuição para a campanha de dois candidatos diferentes. Na conversa, apresenta suas favoritas ao governo do Rio. Rosinha Garotinho e Benedita da Silva.

Cachoeira – Política.

Waldomiro – Política, você vai… O pessoal está me enchendo. O pessoal do Garotinho me chamou…

Cachoeira – Eu posso ajudar, mas ajudar pouco.

Waldomiro – Ajuda para o mês que vem.

Cachoeira – Quanto e para quem?

Waldomiro – Você tem de me dizer quanto. Vamos dizer, pra gastar 500 mil, tá bom pra você?

Cachoeira – Trezentos.

Waldomiro – É pouco, não é não? Duzentos para cada.

Cachoeira – Duzentos pra cada? Cento e cinqüenta. Dá?

Waldomiro – Dá.

Cachoeira – Quem vai ganhar a eleição?

Waldomiro – Eu acho que é cedo para dizer. Vai dar Rosinha e mais um.

Cachoeira – Benedita não ganha?

Waldomiro – Vai depender, Carlos. Vou te falar com toda a sinceridade. Ela está no governo, é minha chefe hoje… Vai depender. A segurança. Se não matar mais ninguém famoso aí.

Trecho 3 – No final da conversa, Waldomiro Diniz pede ao bicheiro ‘à parte’ uma comissão sobre os negócios combinados. A proposta é aceita prontamente.

Cachoeira – Tá fechado assim?

Waldomiro – Fechado. Deixa eu te falar outra coisa. Você vai disponibilizar alguma coisa à parte? Quero 1% pra mim.

Cachoeira – Quer um?

Waldomiro – É.

Cachoeira – O que é que eu poderia fazer?

Waldomiro – Quero 1%.

Cachoeira – Um?

Waldomiro – Um, 1%. Topa?

Cachoeira – Do total?

Waldomiro – 1%.

Cachoeira – Tá bom.

Waldomiro – Tá fechado?

Cachoeira – Fechado.

‘O dinheiro foi para a campanha do Magela’

ÉPOCA – Quando era presidente da Loterj, em 2002, alguma vez o senhor se reuniu fora da sede da empresa com Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira?

Waldomiro Diniz – Como presidente da empresa, por dever de ofício, conversei mais de uma vez com ele.

ÉPOCA – O senhor sabia que esta reunião foi gravada em vídeo?

Waldomiro – Estou sabendo agora.

ÉPOCA – Nessa conversa, o senhor aparece pedindo propina.

Waldomiro – Propina… Eu preciso ouvir a gravação.

ÉPOCA – O senhor não lembra da conversa?

Waldomiro – Girou em torno de vários assuntos. Carlos Ramos queria ampliar seu contrato com a Loterj. Para ajudar, contratou um assessor meu, chamado Armando Dilli. Ele queria aumentar sua participação no mercado. Eu nunca assinei esse contrato.

ÉPOCA – Em um momento da conversa, o senhor propõe que Carlos Ramos escreva um edital de licitação da Loterj. Como é possível isso?

Waldomiro – Preciso ver o contexto da conversa. O senhor Carlos Ramos não merece credibilidade. Isso é uma chantagem. Não fiz negócio com ele. Ao sair do cargo, oficiei à Procuradoria do Estado que investigasse todos os meus atos. Não fiz, não assinei, não dei vantagens ao senhor Carlos Ramos. Não tive sociedade com ele.

ÉPOCA – Nessa conversa, o senhor pede contribuição de campanha eleitoral ao bicheiro. Para quem iria o dinheiro?

Waldomiro – Ele tomou a iniciativa e disse que queria ajudar. Eu disse para ele que podia. Ele perguntou como ajudar e quanto poderia dar. Eu disse que não era comigo, porque não sou e nunca fui caixa de campanha.

ÉPOCA – A fita mostra o contrário. O senhor propõe valores. Pede R$ 500 mil e ele oferece R$ 300 mil.

Waldomiro – E ele deu o dinheiro? Quem pode comprovar se deu dinheiro ou não é ele. Isso não passou por mim.

ÉPOCA – Quem eram os candidatos?

Waldomiro – O que eu lembro é que ele queria ajudar as candidatas Rosinha Garotinho e Benedita da Silva.

ÉPOCA – Quais são os políticos para quem Carlos Ramos deu ajuda de campanha?

Waldomiro – Ele deu uma ajuda para o senhor Geraldo Magela (candidato do PT ao governo de Brasília).

ÉPOCA – Como o dinheiro foi entregue?

Waldomiro – Ele entregou na minha mão e foi entregue à campanha do Magela.

ÉPOCA – E para Benedita da Silva, como foi entregue?

Waldomiro – Isso não passou por mim.

ÉPOCA – No final da fita, o senhor pede para ele disponibilizar uma quantia à parte. Diz ‘eu quero 1% para mim’.

Waldomiro – Essa fita foi montada para me prejudicar.

ÉPOCA – A câmera está fixa. A perícia mostrou que não houve montagem.

Waldomiro – Não falo das imagens. Falo da situação. Por que nos deixaram a sós na sala?

ÉPOCA – Por que o senhor pediu 1%? Está na fita.

Waldomiro – Eu nunca fiz acordo com ele. Nunca assinei contrato.

ÉPOCA – Então, por que pediu?

Waldomiro – Não pedi para mim, pedi para o Armando Dilli, que era assessor do Carlos Ramos. O assessor me induziu a assinar um contrato para que ele tivesse vantagem. Eu percebi depois. Era uma armação contra a minha pessoa, como está sendo provado agora. Eu não permiti que o senhor Carlos Ramos dominasse o mercado.

ÉPOCA – Se o dinheiro foi pago, não é possível provar. Mas seu pedido está gravado.

Waldomiro – Eu estava preocupado em que o Carlos Ramos não cumprisse os prazos do contrato que tinha com a Loterj. Estava disposto a denunciar o contrato. Aí, ele contratou meu assessor e prometeu 1% do valor do contrato, se me convencesse a aceitar as condições dele.

ÉPOCA – Então, quando o senhor disse ‘quero 1% para mim’, na verdade estava defendendo os interesses de um assessor do bicheiro? Por que motivo faria isso?

Waldomiro – Para defender os interesses do meu assessor.

ÉPOCA – Mas ele estava trabalhando para o bicheiro.

Waldomiro – Do meu ex-assessor, então.

ÉPOCA – Essa versão faz parecer que Armando Dilli seria seu laranja.

Waldomiro – Só pode ser laranja se entregou o dinheiro. Eu não assinei o contrato.

ÉPOCA – Vocês acertam tudo. Apertam as mãos e dizem que está fechado.

Waldomiro – Eu não assinei.

ÉPOCA – Mas acertou receber 1%?

Waldomiro – Mas eu não fiz!

ÉPOCA – O senhor acha correto ter se comprometido com um acordo desses?

Waldomiro – Não estou fazendo juízo de valor agora. Eu precisaria ver a fita.’



Valerya Borges

‘Editora Globo reforça tiragem de Época’, copyright MM Online (www.mmonline.com.br), 13/02/04

‘A Editora Globo já prepara uma reedição da edição desta semana da Revista Época. A publicação, que costuma ser publicada aos sábados, chegou às bancas na manhã desta sexta-feira, dia 13, com matéria de capa que denuncia o ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, Waldomiro Diniz.

Época teve acesso a uma fita de vídeo, gravada em 2002, em que Diniz pede propina para si mesmo e dinheiro para a campanha eleitoral ao bicheiro carioca Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. A editora foi informada que parte dos 100 mil exemplares da revista que são enviados semanalmente para as bancas já teria se esgotado. Por esse motivo, estão sendo rodados 15 mil exemplares extras, que poderão ser enviados para os Estados onde essa demanda poderá ser maior, como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Distrito Federal, Bahia e Rio Grande do Sul.

‘A Revista chegou hoje às bancas e já teve uma repercussão bastante grande. Mas acreditamos que amanhã esse impacto deverá ser ainda maior. Por esse motivo, decidimos rodar exemplares adicionais’, esclarece Angelo de Sá Júnior, conhecido como JR, diretor comercial e de marketing da Editora Globo.’