Não sei aí onde você está, mas aqui onde eu estou, a moda que pegou – e até já enjoou – é a de colar adesivinhos na parte traseira do carro com desenhos que representam as nossas famílias. Famílias felizes. Tem de um tudo, como diz um amigo meu. Homem de mãos dadas com uma mulher. Rapaz de mão com uma guria. Rapaz com rapaz. Rapaz só. Guria com guria. Pai e mãe com uma ou mais crianças no meio. Casais com tartarugas, peixinhos no aquário, cachorros e gatos. De tudo.
E sei bem que aí onde você está e aqui onde eu estou os programas tipo reality show são um grande sucesso. A versão da Record e a da Globo, especialmente. Muita gente dedica grande parte de sua noite de descanso e convívio familiar para verificar a vida do outro. Para ver o que ele diz, como se veste, se tem boas maneiras para comer, se esconde suas partes íntimas ao tomar banho. Mas aquilo tudo não é a vida do outro, não. É um espelho.
‘As pessoas estão cada vez mais interessadas nelas mesmas’, li outro dia em um suplemento de um jornal dedicado aos adolescentes e jovens. Eles, os jovens, aprenderam conosco: ‘Vaidade das vaidades! Tudo é vaidade’ (Eclesiastes 1, 2).
Num mundo de alta concorrência, os seres humanos comparam-se, competem entre si. Foi assim desde sempre entre as espécies que já habitaram este planeta. Competição. Quando levada para o bem, transforma-se em colaboração, network, novas tecnologias, evolução da ciência, construção; quando para o mal, vira inveja, destruição. Mas tudo, no fim das contas, é vaidade.
Plataformas digitais
O que reforça a minha tese: um dos ingredientes das mídias sociais é o desejo pela xeretice da privacidade alheia. Foi assim que o Orkut virou um sucesso, há uns bons anos. Com o pretexto de que queríamos encontrar os amigos antigos, a coleguinha do primeiro grau, bisbilhotávamos a vida alheia. Fizemos mais contatos ainda quando o site restringiu algumas informações ao amigo do usuário. Tínhamos um reality show à nossa frente e salivávamos. (Mas não tem nada de mal, não, a vaidade. Não se culpe. Somos assim. A psicologia deve explicar direitinho porquê. Comparamo-nos o tempo todo. É bem normal.)
Surgiram Facebook e Twitter. Há menos interesse pela privacidade alheia, dirão. Não, direi. A competição segue. Competimos com a melhor informação, com o melhor link, com o melhor vídeo, com a melhor foto, com maior número de seguidores, com a maior quantidade de mentions, de érretês. Não é à toa que a regra número um das atuais mídias sociais é: seja relevante! Volta e meia damos uma olhadinha de canto na biografia do usuário. Queremos saber como se comporta, que cursos fez, onde trabalha, se tem namorado, quem que segue.
Portanto, se você ainda tinha alguma dúvida, eu lhe trago a salvação: as mídias sociais triunfarão. E jornalistas, relações públicas, publicitários ou outros profissionais da comunicação terão mercado para explorar seus potenciais e capacidades técnicas. Estamos diante de um mundo de vaidades onde a competição pelo melhor conteúdo gera a colaboração entre redes sociais cada vez mais ativas. As plataformas digitais não param de evoluir. Telas mais finas, mais leves. Nossos dedos, cada vez mais úteis.
Inocência de criança
E o que fazem aqui os profissionais de comunicação? Eles entram nesse jogo para mediá-lo. Para pôr em prática toda capacidade de lidar com o caos, com a dúvida, com o debate, com o controverso. Para transformar a informação que é compartilhada em conhecimento. Para transformar o relacionamento criado em resultado organizacional. Mais argumento para minha tese de que tudo é vaidade: não é a nova regra do marketing que consumidores acreditam menos nas empresas do que no seu semelhante? Quero saber o que a minha rede está comprando, experimentando, desembrulhando. Preciso saber. E quero saber se a minha rede gostou, se elogiou, se criticou, se transformou num viral. Um espelho. Olho para a minha rede e me vejo nela.
E por que somos todos especialistas em Facebook, em Twitter? Porque a cada esquina há um novo curso de dois dias sobre mídias sociais? Porque entendemos bem de vaidades. Desde sempre. Porque entendemos bem de redes sociais. Fizemos parte de uma desde que nascemos. Controlamos a nossa vaidade desde que perdemos a inocência própria de criança.
Falando sério. Eu acho mesmo que as mídias sociais darão muito certo aqui.
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Jornalista