A leitura do texto do professor Adriano de Paula Rabelo (‘Falar brasileiro, escrever português‘,) proporciona uma igualmente excelente ocasião para que seja abordado um tema pouco discutido, embora um razoável número de estudiosos se tenha a ele dedicado em profundidade: a língua brasílica.
Essa história começou no começo. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, não trouxeram mulheres. Do enlace com indígenas Tupi nasceriam, portanto, os primeiros brasileiros pós-‘descobrimento’.
Em 1553, com a missão de catequizar os ‘gentios’, chegou José de Anchieta. Culto e perspicaz, percebeu que, para levar em frente sua tarefa, enfrentaria algumas pedreiras. Uma delas estava na língua. Os indígenas tinham grande dificuldade para pronunciar algumas consoantes do idioma português, como o ‘f’, o ‘l’ e o ‘r’. Anchieta desenvolveu, então, uma língua artificial: o nheengatu, que, em língua tupi, significa ‘língua geral’, ou ‘língua fácil’. O nheengatu consiste de uma mescla da gramática latina com a fonética tupi.
Nheengatu vive
Essa ‘língua geral’ foi rapidamente assimilada pelos ‘brasileiros’, tornando-se a ‘língua brasílica’. Já no século 17, com as entradas e bandeiras, o nheengatu foi disseminado por grande parte do Brasil: a ‘Paulistânia’ chegou a abranger um território que ia, ao norte, da região que é hoje Goiás, até o atual Rio Grande do Sul.
Em 1734, uma provisão do governo de Portugal proibiu o uso do nheengatu no Brasil sob pena de chibata e prisão (Amadeu Amaral, Dialeto caipira). A língua brasílica foi, portanto, o idioma mais falado no Brasil por quase dois séculos. Entretanto – e apesar da provisão da coroa – o nheengatu não morreu: em 2001, o município de São Gabriel da Cachoeira (AM), reconheceu o nheengatu como uma das línguas oficiais.
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Jornalista