Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Até quando vamos aguentar tanta molequeira?

O jornalista Fernando de Barros e Silva (Folha de S.Paulo, 19/7) transcreve parte de um artigo escrito por Juan Arias, correspondente no Brasil do jornal espanhol El País, em que o articulista demonstra estar indignado com a passividade do povo brasileiro diante da corrupção desenfreada e tanta desfaçatez no meio político nacional. Eis as questões formuladas por ele e citadas por Fernando de Barros: “Por que os brasileiros não reagem à corrupção? Por que a indignação resulta apenas numa carta enviada à redação ou numa coluna de jornal? Por que ela não se transforma em revolta, não mobiliza as pessoas, não toma as ruas? Por que tudo, no Brasil, termina em Carnaval ou em resmungo? A indignação de Juan Arias é tanta que nenhum de nós escapou de suas críticas. Ele tem razão – somos coniventes com tanto descaramento.”

Sim, porque assistimos a tudo sem esboçar reação, mansamente, enquanto a imagem do país lá fora escorre pelo ralo, com reflexos nos conjuntos morais, afetivos, sociais e comportamentais de todos nós. Em outros tempos, e por muito menos, fomos às ruas e forçamos a renúncia de um presidente; sem medo, enfrentamos os militares e exigimos as eleições diretas, e por aí vai. Hoje… Onde estão os caras-pintadas? E a UNE, ainda existe? Por que os artistas e os intelectuais que subiram aos palanques exigindo o fim da ditadura militar estão tão calados? As centrais sindicais, por onde andam? Cadê o MST? O Partido dos Trabalhadores, que foi criado para forjar a esperança da população por uma vida digna, com liberdade, sem corrupção, abandonou seus propósitos, por quê?

Quem virou as costas

É Fernando de Barros e Silva quem responde. Para ele, “(…) o PT, na prática, estatizou os movimentos sociais. Da UNE ao MST, passando pelas centrais sindicais, todos recebem dinheiro do governo. Foram aliciados. São entusiastas e sócios do poder, coniventes com os desmandos porque têm interesses a preservar, como o PR de Valdemar e Pagot”. Na mesma linha de pensamento, o escritor João Ubaldo Ribeiro (O Estado de S. Paulo, 26/6) escreveu que “(…) em todos os órgãos públicos, ao que parece aos olhos já entorpecidos dos que leem ou assistem às notícias, se desencavam, todo dia, escândalos de corrupção, prevaricação, desvio de verbas, estelionato, tráfico de influência, negligência criminosa e o que mais se possa imaginar de trambique ou falcatrua…”

A jornalista Eliane Cantanhêde (Folha, 19/7) vai além e revela que “o ex-presidente Luiz Inácio da Silva brilhou no congresso (pago com dinheiro público) da nova UNE, em Goiânia, e no dia seguinte, num encontro da União Geral dos Trabalhadores, já em São Paulo. Enquanto ele brilhava e ia de um a outro no jatinho do deputado Sandro Mabel, mandachuva do PR, Dilma se esfalfava justamente para varrer o partido dos Transportes, herança de Lula”. Quanto à corrupção desenfreada Brasil afora, Lula, diante das pompas áulicas, só tem um discurso: minimizar e incutir na cabeça dos cortesões que os escândalos – que já repercutem em outros países – são acusações infundadas da “imprensa golpista”, da “direita raivosa” e da oposição ressentida, que não se conformam que ele, um operário, tenha chegado aonde chegou. E nós, os brasileiros, hipnotizados, nos deixamos levar e não reagimos.

Precisamos repensar a nossa participação na política, embora seja difícil acreditar em decência quando se observa a consagração da imoralidade como norma de procedimento. Mesmo assim, não devemos esmorecer. Para começar, vamos evitar candidatos a qualquer cargo eletivo que tenham se envolvido em atos de corrupção, sobretudo aqueles que em outros tempos convalidaram estranhas e imorais alianças para livrar seus pares (deputados e senadores) da cassação. Devemos lembrar, na hora de votar, quem virou as costas para nós e abraçou a mais deslavada molequeira que se tem notícia no meio político nacional nos últimos tempos. Ou então, parafraseando o saudoso senador José Jefferson Carpinteiro Péres (1932-2008), chafurdar na lama com eles…

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[Luiz Carlos Santos Lopes é jornalista, Salvador, BA]